Acórdão nº 1468/13.0TTVNG.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 11 de Abril de 2018

Magistrado ResponsávelTERESA S
Data da Resolução11 de Abril de 2018
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Processo nº 1468/13.0TTVNG.P1 Origem: Tribunal da Comarca do Porto – Juízo do trabalho de Vila Nova de Gaia, Juiz 1 Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação do Porto: 1.Relatório: B...

, residente na Rua ..., Hab. ..., ..., Vila Nova de Gaia, instaurou a presente acção declarativa com forma de processo especial de ação para efetivação de direitos resultantes de acidente de trabalho contra a Companhia de Seguros C..., S.A.

, com sede na Rua ..., nº.., Lisboa e D..., Ldª, com sede na Rua ..., ..., Porto, (tendo a acção sido indeferida liminarmente quanto a esta última), pedindo que o acidente sofrido por H..., seja declarado como de trabalho e a condenação da Ré Seguradora a pagar-lhe: “a)- A quantia de 2.984,10€ (9.947,00 * 30% = 2.984,10€, a titulo de pensão anual vitalícia, com inicio a 14 de Dezembro de 2013 até atingir a reforma e a quantia de 3.979,00€ (por arredondamento), a partir da data em que atingir a reforma (9.947,00* 40%= 3.979,00€, por arredondamentos).

b)- A quantia de 2.766,85€ a titulo de subsídio de morte.” Para tanto alegou, em síntese, que o sinistrado era saudável e que apenas faleceu por uma arritmia cardíaca derivada do stress em que andava nos últimos tempos por causa dos objectivos acrescidos da empresa.

A Ré, regulamente citada, apresentou contestação, impugnando ser essa a causa da morte e invocando como causa dela uma doença natural de cardiopatia isquémica.

A Autora respondeu.

Foi proferido despacho saneador, no qual foram fixados os factos assentes e os factos controvertidos.

Foi realizada a audiência de discussão e julgamento com observância de todas as formalidades legais, após o que foi proferida sentença, de cujo dispositivo consta: “Pelo exposto, decide-se julgar a presente acção totalmente improcedente por não provada, absolvendo-se a ré Companhia de Seguros C..., S.A., dos pedidos formulados pela autora B....

Custas pela Autora, sem prejuízo do apoio judiciário que lhe foi concedido.” Não se conformando com o assim decidido, a Autora apelou, apresentando, no final, as suas conclusões no sentido da procedência do recurso, sendo revogada, nos termos alegados, a sentença e substituída por outra que condene a Ré nos pedidos que formulou.

Foram as seguintes as suas conclusões: “1. O Tribunal a quo incorreu em erro de julgamento da matéria de facto, ao dar como não provados os factos não provados em 2) a 9) dos factos controvertidos.

  1. Sobre esta matéria foram ouvidas as testemunhas E... e F..., que foram claros e expressivos quanto ao facto de que o sinistrado andava stressado e preocupado com o trabalho, em cumprir os objectivos que lhe eram propostos.

  2. Assim, tendo em conta o depoimento das testemunhas acima referidas, sempre o Tribunal teria de dar como provado, ao menos, o ponto 9 da matéria de facto controvertida, o que conduziria, de resto, a uma decisão materialmente diferente.

  3. Incorreu ainda o Tribunal a quo, em erro de julgamento da matéria de facto quando deu como provado o facto provado em J), ou seja, que o sinistrado faleceu por enfarte do miocárdio ou cardiopatia isquémica, relacionado/a com a existência, na aorta, de placas de ateroma calcificadas, derivadas de ateriosclerose coronária de que aquele padecia.

  4. Quanto ao facto dado como provado em J), o mesmo deveria ter sido dado como não provado.

  5. Isto porque, resultou provado que o sinistrado não padecia de qualquer doença.

  6. E se sofria esta apenas foi descoberta no relatório de autópsia.

  7. Isto mesmo resulta dos registos do centro de saúde onde o sinistrado era assistido, junto a folhas 142 a 150, os quais davam conta de problemas de hipertensão desde Fevereiro de 2012.

  8. Ora, Hipertensão é uma doença crónica popularmente conhecida como “pressão alta”.

  9. Contudo, este problema de saúde, de que o sinistrado padecia, estava tratado e controlado, uma vez que o sinistrado era acompanhado regularmente no centro de saúde, como resulta claro dos relatórios médicos juntos aos autos.

  10. Pelo que, não estando sujeito a factores potenciadores de desenvolvimento desta doença, nomeadamente o stress, o mesmo não padeceria de lesões graves que levassem à sua morte.

  11. Para além do relatório de autópsia, relativamente à conclusão de que o sinistrado padecia de um processo de arteriosclerose coronária mais avançado do que seria provável para a sua idade e com lesões/oclusões superiores a 75% em alguns vasos ou artérias, o Tribunal a quo, fundamentou a sua convicção no depoimento da Testemunha G.... Acontece que, 13. A referida testemunha, como especialista de cardiologia, referiu que a calcificação de que padecia o sinistrado era normal, que todos temos calcificação nas artérias a partir dos 40 anos.

  12. Pelo que, da prova produzida e nomeadamente do depoimento desta testemunha nunca poderia resultar provado que o sinistrado faleceu em consequência de doença de que padecia.

  13. Impugna-se a matéria de facto dada como não provada de 2) a 9), a qual deveria ter sido dada como provada.

  14. Impugna-se ainda a matéria de facto dada como provada sob o ponto J), a qual, atenta a prova produzida e constante dos autos, deveria ter sido dada como não provada, o que conduziria a uma decisão materialmente diferente.

  15. É acidente de trabalho, aquele que se verifique no local e no tempo de trabalho e produza directa ou indirectamente lesão corporal, perturbação funcional ou doença de que resulte redução na capacidade de trabalho ou de ganho ou a morte [n.º 1 do artigo 6.º da Lei nº 100/97 (LAT)].

  16. O sinistrado faleceu quando se deslocava para o local de trabalho.

  17. Por conseguinte, deve ser considerado como acidente de trabalho, o acidente que vitimou o sinistrado, para mais, verificado no local e tempo de trabalho.

  18. Hoje, nem o acontecimento exterior directo e visível, nem a violência são critérios indispensáveis à caracterização do acidente.

  19. O nexo de causalidade que deve existir entre o acidente e o trabalho é, pois, um dos elementos caracterizadores do acidente de trabalho, que não resulta expressamente da lei, mas que se contém no seu espírito.

  20. Fazendo aplicação dos princípios acima expostos aos factos provados e relativos ao evento que deu origem à presente acção, estamos no caso dos autos perante um verdadeiro acidente de trabalho, porém, desconsiderando o alcance e sentido destes aspectos, curiosamente, foi com base neste elemento – acidente – que o tribunal a quo fundamentou o decidido, alegando que a morte da vítima se deveu a doença pré-existente e natural de que o sinistrado padecia, ou seja, trata-se de doença que nenhum relatório evidencia ter relação com o trabalho.

  21. Entendimento que a aqui apelante face ao acontecido e à prova constante dos autos, não aceita, ademais, a responsabilidade objectiva emergente de acidentes de trabalho baseia-se no risco que é inerente ao exercício de qualquer e toda a actividade profissional, fazendo recair sobre os empregadores, que com ela beneficiam, a obrigação de reparar os danos correspondentes.

  22. A arteriosclerose coronária e cardiopatia isquémica, apenas foram detectadas post mortem, não obstante os exames médicos e clínicos a que o sinistrado foi regularmente submetido.

  23. O estado de stress a que o mesmo estava sujeito aquando do ocorrido, causou, ou se assim se não entender, potenciou o enfarte agudo do miocárdio.

  24. A lesão (cardiomiopatia isquémica) que causou a morte do sinistrado despoletou-se por causa do estado de stress que o afectava na altura, facto confirmado pelas testemunhas E... e F....

  25. É inaceitável e infundada a tese do tribunal a quo, de que o sinistrado faleceu por causa de uma doença natural, de que padecia ao nivel do coração, designadamente arteriosclerose coronária.

  26. Porquanto, dos documentos juntos aos autos não resultou que o sinistrado padece-se de qualquer patologia e a cardiopatia apenas foi descoberta após a realização da autópsia.

  27. Também foi indiferente para o tribunal a quo o facto deste ter sido encontrado cerca das 7 h.30m no veículo que conduzia (matéria provada em F), quando se deslocava para o local de trabalho, ou seja no tempo e local de trabalho.

  28. O acidente de trabalho, ao contrário, do que insinua o tribunal a quo, funcionou como agente, ou causa próxima, desencadeador da doença ou lesão.

  29. De todo o modo, sempre há que tirar as devidas ilações do disposto no art.º 9 da LAT, também violado pelo tribunal a quo, que determina que quando a lesão consecutiva ao acidente for agravada por lesão ou doença anterior, a reparação avaliar-se-á como se tudo dele resultasse.

  30. Por outro lado, não pode esquecer-se que a lesão que provocou a morte do sinistrado ocorreu no tempo e no local de trabalho.

  31. Pelo que, se presume consequência do acidente, (n.º 1 do art.º 7 do DL n.º 143/99, também aqui violado).

  32. Devendo, portanto, ser considerado acidente de trabalho com as legais consequências.

  33. Tendo decidido de modo diverso, o tribunal a quo violou, entre outras, as seguintes normas: n.º4 do artigo 72.º do CPT; art.º 1.º, art.º 2.º, art.º 6.º, n.º 1, art.º 7.º, art.º 8.º, art.º 9.º, art.º 10.º, 15.º e 26.º da Lei n.º 100/97, de 13 de setembro, aprova o novo regime jurídico dos acidentes de trabalho e das doenças profissionais; art.º 2.º; alínea a) e c) do n.º 1 do artigo 57.º, 59.º, 60.º e 65.º, da Lei n.º98/2009, e art.º 59.º da Constituição da República Portuguesa.”, (realce nosso).

    O recurso foi admitido, como de apelação, com subida imediata, nos próprios autos e efeito devolutivo.

    Remetidos os autos a este Tribunal da Relação, apresentados que foram ao Exm.º Procurador-Geral Adjunto, foi exarado parecer (fls. 178 a 180) em que sustenta: “Da leitura ponderada da argumentação da recorrente resulta que esta, essencialmente, não se conforma com o entendimento, a ponderação e a avaliação que o tribunal recorrido fez do depoimento das...

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