Acórdão nº 1382/13.0TTPNF.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 24 de Janeiro de 2018

Magistrado ResponsávelFERNANDA SOARES
Data da Resolução24 de Janeiro de 2018
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Processo nº1382/13.0TTPNF.P1 Relatora: M. Fernanda Soares – 1508 Adjuntos: Dr. Domingos José de Morais Dra. Paula Leal de Carvalho Acordam no Tribunal da Relação do Porto IB… instaurou na Comarca do Porto Este – Penafiel – Instância Central – Secção Trabalho – J2, contra C… S.A.

, processo emergente de acidente de trabalho, pedindo dever declarar-se que o acidente descrito nos autos é um acidente de trabalho, imputável à Ré, e consequentemente, deve esta ser condenada a pagar-lhe: a) A quantia não inferior a €12.500,00, a título de danos não patrimoniais sofridos pela vítima, acrescida de juros à taxa legal, contados desde a citação e até efectivo e integral pagamento; b) A quantia não inferior a €75.000,00 pela perda do direito à vida, acrescida de juros à taxa legal, contados desde a citação e até integral pagamento; c) A quantia não inferior a €12.500,00, a título de indemnização por danos não patrimoniais próprios do pai da vítima, ora Autor, acrescida de juros à taxa legal, contados desde a citação e até efectivo e integral pagamento.

Fundamenta os seus pedidos nos seguintes factos: D…. é filho do Autor tendo o mesmo sofrido um acidente mortal quando trabalhava, no dia 17.08.2013, para a Ré. Tal acidente ocorreu durante a obra de requalificação do Parque de Lazer E1…, propriedade da Câmara Municipal E…. Nessa obra estavam a decorrer trabalhos de limpeza e remoção do equipamento. Quando o filho do Autor deslocava a máquina tipo cilindro para o local onde julgava que iria ser feita a carga da mesma no camião de transporte, caiu, juntamente com a máquina, por uma ravina adjacente à estrada que percorria. Em consequência do acidente o filho do Autor sofreu lesões que lhe determinaram a morte, sendo que o sinistro se ficou a dever ao facto da máquina em causa não conter qualquer estrutura de protecção contra o capotamento e contra a queda de objectos do equipamento utilizado e não ter a Ré dado formação à vítima acerca da actividade desempenhada pela mesma aquando da ocorrência do sinistro.

A Ré veio contestar alegando que contra ela correu processo de contra-ordenação e foi-lhe aplicada coima, da qual recorreu, tendo sido absolvida da prática da mesma, conforme sentença proferida no processo de contra-ordenação com o nº2657/15.9T8PNF. Acresce ter sido o sinistrado, por sua iniciativa, que resolveu pegar na referida máquina – o cilindro – não estando autorizado a assim proceder, pois nenhuma ordem lhe foi dada nesse sentido. Por outro lado, a máquina obedecia a todas as normas de segurança. Conclui pela total improcedência da acção.

O Autor veio responder defendendo a inexistência de caso julgado relativamente ao decidido no processo de contra-ordenação.

Foi ordenado a citação da Companhia de Seguros G… para a presente acção, a qual veio arguir a sua ilegitimidade e referir que os pedidos formulados pelo Autor, com fundamento em danos não patrimoniais, não são da sua responsabilidade concluindo pela sua absolvição da instância ou dos pedidos.

Foi proferido despacho saneador, onde se julgou improcedente a excepção de ilegitimidade passiva arguida pela Seguradora. Consignou-se a matéria de facto dada como assente e foi elaborada a base instrutória.

Procedeu-se a julgamento com gravação da prova pessoal e foi proferida sentença que julgou a acção improcedente e absolveu as Rés empregadora e seguradora dos pedidos.

O Autor veio recorrer pedindo a revogação da sentença, concluindo do seguinte modo [após despacho da relatora a convidar o mesmo a sintetizar as conclusões, o que fez]: 1.

A matéria dada como provada em 8, 9, 10, 15, 17, 18, 19, 20 e 21 dos factos provados é suficiente para dar como provada a violação pela Ré das regras de segurança que legalmente lhe cabem, bem como da relação de causalidade adequada entre a inobservância das normas de segurança e o acidente.

  1. Também a comprovada falta de formação é causa adequada do acidente e do dano sofrido pelo trabalhador, com as legais consequências.

  2. A máquina «tipo cilindro» constitui um equipamento perigoso, apresentando, designadamente, perigos de atropelamento, esmagamento por objecto e por capotamento, cortes, vibrações, exposição ao ruído, lesões músculo esqueléticas, queda de objectos, sendo que o risco ou perigo da utilização deste tipo de equipamentos é previsível, evidente e manifesto.

  3. O critério do funcionamento bom, regular e seguro da máquina não se basta com o facto de o «cilindro» funcionar. É necessário que o mesmo cumpra todas as condições de funcionamento, tenha as protecções devidas e cumpra as prescrições de segurança impostas por lei, obrigação que incumbia à Ré e que a mesma não cumpriu.

  4. Se, como se demonstrou, a máquina não estava equipada com as estruturas de protecção exigíveis, o que resulta, desde logo, do Relatório de Verificação, junto pela Ré, ela até pode funcionar mas viola a Lei em vigor, pelo que, ao utilizar aquele equipamento em obra contra o seu próprio procedimento de segurança e contra a Lei, que não podia desconhecer, é manifesto que a Ré viola as regras de segurança exigíveis.

  5. Assim, mal andou a sentença ao dar como não provado que a máquina «não tinha quaisquer estruturas de protecção contra o capotamento e contra queda de objectos» atento que tal resultou provado em 18 dos factos provados, resultando ainda do procedimento de segurança da Ré e do relatório da ACT junto aos autos.

  6. Do relatório da ACT resulta também que a última verificação da máquina ocorreu em 03.07.2013, data em que registava 2217 horas de trabalho, valor que apresentava também na data da visita inspectiva da ACT em 20.08.2013, ou seja, 3 dias após o acidente.

  7. Ora, tendo a máquina sido usada posteriormente, resulta impossível aquele valor permanecer o mesmo, pelo que o relógio ou estava avariado ou foi adulterado ou a máquina não foi objecto de verificação periódica o que viola a Lei.

  8. No que concerne à estrutura de protecção resulta claro do depoimento da testemunha F…, trabalhador da Ré, que confirmou a inexistência de equipamento de protecção.

  9. Por seu lado, a testemunha K… confirmou que viu o sinistrado a limpar o local e a «passar com o cilindro» para carregar no camião, que o encarregado andava com outra máquina e que o camião apareceu no sítio para onde o sinistrado ia levar a máquina.

  10. A sentença olvidou que é de conhecimento e experiência comum que uma máquina «do tipo cilindro» é um equipamento perigoso, e que a máquina, não obstante não cumprir as regras de segurança, foi comprovadamente usada na obra, sendo que se a máquina não cumpre os requisitos de segurança não pode, nem deve, ser utilizada.

  11. E resultando provado – facto 17 – que a máquina devia «estar equipada com protecção ROPS e FOPS, resulta evidente que a inexistência destes equipamentos configura violação pela Ré das regras de segurança no trabalho.

  12. Acresce a isto que – facto 19 – a Ré confessou que não deu formação ao sinistrado, o que contradiz a al. c) dos factos não provados, pelo que se impõe a sua correcção.

  13. A formação profissional é uma obrigação do empregador e um direito do trabalhador, obrigação acrescida da Ré tanto mais que actua no sector da construção tão afectado pela sinistralidade e mortalidade laboral.

  14. A Ré confessou que o sinistrado era diligente e obediente incapaz de praticar «quaisquer tarefas sem autorização» e, ainda, disponível, cumprindo ordens sem questionar as mesmas, ajudando em tudo o que lhe fosse pedido – factos 20 e 21.

  15. Ora, atenta a personalidade e diligência do trabalhador, reconhecida pela Ré, confirmada pela testemunhas H… e I…, e à luz da experiência comum, da lógica corrente e por via da própria intuição...

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