Acórdão nº 1517/14.5T8STS-B.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 06 de Março de 2018

Magistrado ResponsávelVIEIRA E CUNHA
Data da Resolução06 de Março de 2018
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

● Rec. 1517/14.5T8STS-B.P1. Relator – Vieira e Cunha. Adjuntos – Des. Maria Eiró e Des. João Proença Costa. Decisão recorrida de 22/12/2017.

Acórdão do Tribunal da Relação do Porto Razão do RecursoRecurso de apelação interposto na acção com processo especial de reclamação de créditos, por apenso a processo de insolvência, nº1517/14.5T8STS-B, da Comarca do Porto, Juízo de Comércio de Santo Tirso.

Insolventes – B… e mulher D….

Credores Reclamantes – Banco E…, S.A., e F…, S.A.

Credores Impugnantes – G… e marido H….

Apelante – G… Apelada – Massa Insolvente, representada pela Administradora da Insolvência.

Nos presentes autos, junta a lista de créditos reconhecida pela Administradora da Insolvência, foi essa referida lista impugnada pelos credores G… e marido H…, por da mesma não constar o respectivo e reclamado crédito de €200.000,00, sustentando que tal crédito deve ser havido como garantido, face à existência de uma hipoteca, oportunamente registada a favor dos aludidos impugnantes, sobre prédios apreendidos na insolvência.

Alegaram que o crédito reclamado decorre da existência de diversos mútuos realizados pelos Impugnantes aos Insolventes, entre os anos de 1994 e 2006, das mais diversas quantias, e num total que veio a redundar no valor de €200.000,00.

No documento junto aos autos intitulado “Hipoteca Unilateral”, embora ali se faça alusão a um “empréstimo”, tal não reflecte com rigor o que sucedeu já que o valor ali enunciado diz respeito antes a vários empréstimos ao longo dos anos, e não apenas a um só, empréstimos registados num livro de “deve-haver” da autoria da Impugnante mulher e devidamente rubricado pelo insolvente marido, não enfermando de qualquer nulidade formal, considerando as normas legais então vigentes.

Em Resposta, a Massa Insolvente sustentou a improcedência da reclamação deduzida, alegando que o manuscrito junto com a menção “empréstimo concedido ao B… e D…” não pode ser considerado um documento válido, desacompanhado de qualquer comprovativo documental de que tais quantias tenham sido efectivamente mutuadas, ao que acresce o facto de aquele documento não conter sequer qualquer reconhecimento de assinaturas.

Os alegados mútuos sempre serão nulos por falta da forma enunciada no art.º 1143.º do Código Civil, nas redacções quantitativas e sucessivas introduzidas em 1966 e em 2008, e nessa sequência, também a hipoteca constituída se mostra inquinada de nulidade.

Por último, sempre o crédito reclamado terá de ser reconhecido como crédito subordinado, atento o facto de os Reclamantes serem pais do Insolvente marido, face ao preceituado no art.º 47.º, n.º 4, alínea b), do CIRE.

Sentença RecorridaA Mmª Juiz a quo decidiu, a final, como segue: a) Homologar a lista de credores reconhecidos elaborada pela Sr.ª Administradora da Insolvência, constante de fls. 8, dela passando a fazer parte o crédito dos credores G… e H…, no montante de €200.000,00, e sob a qualificação de “subordinado”; b) Graduar tais créditos, para serem pagos pelo produto da liquidação dos bens apreendidos para a massa insolvente, nos seguintes termos: No que tange à verba 1 do auto de apreensão: 1.º Os créditos titulados pelo Banco E…, S.A., nos montantes reconhecidos e apurados como gozando de garantia; 2.º Todos os demais créditos, reclamados e reconhecidos, em pé de igualdade, dando-se entre eles rateio se necessário for, sendo que apenas após a já referida salvaguarda das despesas e dívidas da massa, se houver remanescente serão pagos todos os créditos reclamados, rateadamente, em primeiro lugar os comuns e só após, havendo remanescente, os subordinados.

No que tange às verbas 2 e 3 do auto de apreensão: 1.º Todos os créditos, reclamados e reconhecidos, em pé de igualdade, dando-se entre eles rateio se necessário for, sendo que apenas após a já referida salvaguarda das despesas e dívidas da massa, se houver remanescente serão pagos todos os créditos reclamados, rateadamente, em primeiro lugar os comuns, e só após, os subordinados.

Conclusões do Recurso de Apelação da Impugnante G…:1ª Vem o presente recurso interposto da sentença de verificação e graduação de créditos proferida nos autos de insolvência na parte em que, não obstante tenha julgado verificado e reconhecido o crédito reclamado pelos credores/impugnantes G… e H…; julgado válida a garantia de pagamento do mesmo, constituída mediante hipoteca voluntária de 27 de Outubro de 2009 e registada nessa mesma data sobre três imóveis pertença dos insolventes, qualificou, porém, tal crédito, não como privilegiado ou garantido, mas como subordinado.

2ª Decisão esta que a ora Recorrente, G… não aceita por entender que, salvo o devido respeito, a mesma resulta de incorrecta interpretação e aplicação do direito aos factos apurados, os quais ora se transcrevem: (…) 3ª Na verdade, as classes de créditos sobre a insolvência encontram-se plasmadas no art.47º, nº4 do CIRE, o qual dispõe que: (…) 4ª Dispondo o artigo 48º, al. a) do CIRE, quanto ao caso que aqui nos ocupa que: “ Consideram-se subordinados, sendo graduados depois dos restantes créditos sobre a insolvência: a) Os créditos detidos por pessoas especialmente relacionadas com o devedor, desde que a relação especial existisse já aquando da respectiva aquisição,…”, prevendo o artigo seguinte do CIRE (art.49º) quais as pessoas havidas como especialmente relacionadas com o devedor, onde se encontram, na sua al. b) os ascendentes.

5ª Pelo que a Mª Juiz a quo, face à demonstração da relação especial existente entre os credores impugnantes e os insolventes, qualificou o crédito da ora Recorrente como subordinado, graduando-o em conformidade; 6ª Fazendo, uma interpretação literal do conjunto normativo composto pelo art.48º, al. a) 1ª parte e art.49º, nº1, al. b), ambos do CIRE, em violação do disposto no art.9º do Código Civil que, para além da letra da lei, manda atender ao pensamento legislativo; à unidade do sistema jurídico; às circunstâncias em que a lei foi elaborada e às condições específicas do tempo em que é aplicada.

7ª Na verdade, ao fazer tal interpretação, a Mª Juiz a quo não atendeu à demais factualidade alegada, nem deu a devida relevância ao período temporal que mediou entre a constituição do crédito (8 anos) e o início do processo de insolvência; também não o fazendo relativamente ao período que mediou entre a constituição da garantia (5 anos) e o início do mesmo processo; e 8ª Principalmente, não deu relevância à factualidade demonstrada sob a al. i) dos factos provados, onde se consignou que a escritura de hipoteca “resultou de acto de vontade por parte dos insolventes, face à circunstância de o marido insolvente ter pretendido salvaguardar a satisfação das quantias mutuadas, atenta a existência de outros filhos daqueles H… e G…”, ou seja, teve como intuito, para além de garantir o pagamento dos mútuos concedidos aos insolventes, salvaguardar uma futura partilha igualitária entre os filhos dos credores H… e G….

9ª Ora, Venerandos Desembargadores, entende a Recorrente que tal decisão não se poderá manter, face à factualidade demonstrada nos autos, e atendendo à teleologia que subjaz à classificação legal de determinados créditos como subordinados, designadamente e para o que aqui importa, os consagrados na al. a) do art.48º do CIRE – “pessoas especialmente relacionadas com o devedor, desde que a relação especial existisse já aquando da respectiva aquisição…”, por se entender que estas beneficiarão de uma situação de superioridade informativa sobre a situação do devedor, relativamente aos demais credores; sempre em consideração às finalidades do processo de insolvência.

10ª Efectivamente, in casu, face aos factos demonstrados, tal relação especial não poderá relevar, dado o lapso de tempo decorrido desde a constituição do crédito e ulterior garantia do mesmo, até à verificação da situação de insolvência, lapso de tempo esse que não poderá ser julgado irrelevante já que é a própria lei que, em várias disposições legais, entende que só deverão ser afectadas pela situação insolvencial as situações verificadas dentro de determinado período temporal, como é o caso dos dois anos anteriores ao início do processo de insolvência previsto nos artigos 48º, al. a) e 49º, 120º, todos do CIRE; 11ª Não deixando também de ser paradigmático de tal relevância do lapso de tempo os prazos ainda mais curtos plasmados nas várias situações consignadas no nº1 do art.121º do CIRE.

12ª Na verdade, e conforme entendimento muito...

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