Acórdão nº 031/15 de Tribunal dos Conflitos, 02 de Fevereiro de 2016

Magistrado ResponsávelHELDER ROQUE
Data da Resolução02 de Fevereiro de 2016
EmissorTribunal dos Conflitos

ACORDAM OS JUÍZES QUE CONSTITUEM O TRIBUNAL DE CONFLITOS (Relator: Helder Roque …): “A…………., SA”, com sede no Empreendimento ………., …………., n° ….., Edifício …., Piso …., Amadora, propôs a presente ação declarativa, sob a forma de processo comum, contra “B…………., SA”, com sede na Rua …………., …., Ponta Delgada, pedindo que, na sua procedência, seja reconhecida a ilicitude da resolução do contrato pela ré e, em consequência, esta seja condenada no pagamento à autora da quantia de €27237,47, correspondente ao lucro cessante do contrato de aquisição de consultadoria, no âmbito do regime “CELE - Comércio Europeu de Licenças de Emissão – A…………….”, ilicitamente, resolvido, acrescida de juros de mora, vencidos e vincendos, à taxa legal aplicável aos créditos de que são titulares empresas comerciais, desde a data da citação e até integral pagamento, e a pagar-lhe a quantia de €332,34, a título de indemnização, em sede de responsabilidade contratual, e bem assim como a pagar-lhe a quantia de €3367,66, relativa aos honorários devidos pela prestação de serviços, no período compreendido entre 1 de julho de 2013 e 20 de agosto de 2013.

Na contestação, a ré invoca a exceção da incompetência material do tribunal comum cível, porquanto, não obstante a previsão contratual de um pacto de aforamento, segundo o qual seria competente para a resolução de todos os litígios decorrentes do contrato o foro da comarca de Ponta Delgada, está-se perante uma questão de competência material, que não pode ser afastada, por vontade das partes, por se tratar de um contrato administrativo, celebrado no quadro do poder de autoridade da ré, que remete a competência material para a jurisdição administrativa.

O Tribunal Judicial da Comarca dos Açores declarou incompetente, em razão da matéria, a Instância Local Cível de Ponta Delgada – Juiz 3 e, consequentemente, absolveu a ré da instância.

Desta decisão, a autora interpôs recurso, tendo o Tribunal da Relação julgado improcedente a apelação e, em consequência, confirmou a sentença recorrida.

Do acórdão da Relação de Lisboa, a autora interpôs agora recurso para este Tribunal de Conflitos, pedindo que, na sua procedência, o mesmo seja revogado e substituído por outro que fixe, definitivamente, a competência do Tribunal da Comarca dos Açores, Instância Local Cível de Ponta Delgada, para a resolução do litígio, objeto dos autos, deduzindo as seguintes conclusões, que se transcrevem, integralmente: 1ª – A competência para a resolução do presente litígio pertence aos tribunais judiciais, uma vez que não estamos perante uma relação jurídica administrativa.

  1. – O que caracteriza uma relação jurídica administrativa - critério definidor do âmbito da jurisdição administrativa nos termos dos artigos 212.º/3 da Constituição e 1.º/1 do ETAF - é o facto de pelo menos um dos seus sujeitos ser uma entidade pública ou uma entidade privada no exercício de poderes de autoridade para desenvolver o fim público, o que não se verifica nos presentes autos.

  2. – De acordo com o artigo 4.º/1/f) in fine do ETAF, compete aos tribunais administrativos a resolução de litígios que tenham por objecto questões relativas à execução de contratos em que pelo menos uma das partes seja uma entidade pública e tenha sido expressamente submetido a um regime substantivo de direito público.

  3. – A Recorrente e a Recorrida são ambas entidades privadas. A Recorrida é uma sociedade anónima de capitais maioritariamente públicos, constituída nos termos da lei comercial e regida pelo direito privado, nos termos dos artigos 3.º e 9.º/1 do RSPERAA, pelo que é uma entidade privada.

  4. – O conceito de “entidade pública” utilizado na previsão do artigo 4.º/1/f) in fine do ETAF não corresponde aos conceitos do CCP de “entidade adjudicante” e “contraente público”.

  5. – O contrato celebrado pelas partes não constitui o exercício de um poder de autoridade da Recorrida, nem resulta do mesmo. É um mero contrato privado de prestação de serviços.

  6. – O contrato celebrado pelas partes é um contrato de direito privado, regulado pelo regime estabelecido ao abrigo da respectiva autonomia contratual, prevista no artigo 405.º do Código Civil, ainda que as partes tenham optado por uma remissão para a Parte III do CCP.

  7. – As entidades privadas, actuando fora do exercício de poderes de autoridade, não têm capacidade para se submeterem a um regime de direito público.

  8. – A competência absoluta dos tribunais é de conhecimento oficioso, não tendo as partes a capacidade de, por si só e por meio da vontade contratual, alterar as regras legais de competência absoluta, atribuindo aos tribunais administrativos o que é da competência dos tribunais comuns.

  9. – Deste modo, tendo o contrato sido celebrado por entidades privadas, fora do exercício de poderes de autoridade ou de uma função administrativa, o presente litígio não tem por objecto uma relação jurídica administrativa e não se encontra preenchida a previsão dos artigos 212.º/3 da Constituição, 1.º e 4.º/1/f) do ETAF, pelo que a competência para a sua resolução pertence aos tribunais judiciais (artigo 64.º do CPC).

  10. – Assim, o Douto Acórdão recorrido incorre em violação, entre outros, dos artigos 211º/1 e 212.º/3 da Constituição, 1.º e 4.º/1/f) do ETAF, 3.º/1/b) do CCP e 64.º do CPC.

Nas suas contra-alegações, a ré conclui no sentido de que não deve ser dado provimento ao recurso, mantendo-se, assim, o acórdão recorrido, que fixou a competência dos Tribunais Administrativos e Fiscais.

Com interesse para a questão decidenda, importa considerar o seguinte circunstancionalismo fáctico subjacente: 1. A ré é uma sociedade anónima de capitais sociais, maioritariamente, detidos pela Região Autónoma dos Açores, integrando o Setor Público Empresarial Regional, de acordo com o previsto no artigo 3.º, a), do DLR nº 7/2011/A, de 22 de março.

  1. A ré tem por objeto social “a produção, a aquisição, o transporte, a distribuição e a venda de energia elétrica”.

  2. Em 21 de janeiro de 2013, a autora e a ré celebraram um contrato de aquisição de serviços de consultadoria, no âmbito do regime “CELE - Comércio Europeu de Licenças de Emissão — A…………..”.

  3. ...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT