Acórdão nº 21/12.0GBPTM.E1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 26 de Março de 2014
Magistrado Responsável | RODRIGUES DA COSTA |
Data da Resolução | 26 de Março de 2014 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
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RELATÓRIO 1.
No 2.º Juízo do Tribunal Judicial da Comarca de Lagos, foi julgado nestes autos de processo comum colectivo o arguido AA, já devidamente identificado, e condenado pela prática de um crime de tráfico de estupefacientes do art. 21.º, n.º 1 do DL 15/93, de 22/01, na pena de 5 anos e 6 meses de prisão (acórdão de 26/06/2013).
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Inconformado, recorreu para o Tribunal da Relação de Évora, que, por acórdão de 01/10/2013, concedendo parcial provimento ao recurso, alterou a matéria de facto, qualificou o crime como de tráfico de menor gravidade e condenou o arguido na pena de 4 anos de prisão efectiva.
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Ainda insatisfeito, o arguido recorreu para este Tribunal, pretendendo a alteração da pena imposta para 18 meses de prisão e a suspensão da sua execução.
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Respondeu o Ministério Público junto do tribunal “a quo”, pugnando pela manutenção do decidido.
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Neste Tribunal, o Ministério Público emitiu parecer, em que sustentou a rejeição do recurso, por inadmissível, face à existência de dupla conforme in melius, tendo a decisão condenatória sido proferida já depois da entrada em vigor da Lei n.º 20/2013, de 21 de Fevereiro.
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O relator proferiu decisão sumária, datada de 14/02/2014, em que rejeitou o recurso, por inadmissível a impugnação da decisão da Relação para o Supremo Tribunal de Justiça, à luz do art. 400.º, n.º 1, alínea e) do CPP, na nova redacção conferida pela Lei n.º 20/2013, de 21/02.
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Notificado desta decisão, o arguido veio reclamar para a conferência, invocando os seguintes argumentos, que se sumariam: A lei aplicável ao caso é a do art. 400.º, n.º 1, alínea e) do CPP anterior à redacção introduzida pela Lei n.º 20/2013, de 21/12, que permitia recurso para o STJ de acórdãos proferidos, em recurso, pelas relações, que aplicassem pena não privativa de liberdade.
É que, não obstante a decisão condenatória de 1.ª instância ter sido proferida depois da entrada em vigor daquela lei, o processo foi iniciado em 2 de Agosto de 2012, e se o art. 5.º, n.º 1 do CPP determina que «a lei processual penal é de aplicação imediata, sem prejuízo da validade dos actos realizados na vigência da lei anterior», tal não pode excluir a aplicação da antiga redacção da alínea e), do n.º 1, do art. 400.º, do CPP.
A fase dos recursos não pode ser considerada como uma fase processual propriamente dita, como é a de inquérito, instrução e julgamento, em virtude das suas especificidades, como é o caso da susceptibilidade de se regressar à fase de julgamento
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A mesma «jamais se poderá qualificar como fase processual autónoma, havendo uma interligação com a fase de julgamento.» « (…) A solução da questão está na Constituição da República Portuguesa, conjugada com o art. 5.º do CPP», nomeadamente art. 32.º, n.º 1 em que são asseguradas ao processo criminal todas as garantias de defesa, incluindo o recurso, e o art. 29.º, n.º 4, em virtude do qual «ninguém pode sofrer pena ou medida de segurança mais graves do que as previstas no momento da correspondente conduta ou da verificação dos respectivos pressupostos, aplicando-se retroactivamente as leis penais de conteúdo mais favorável».
Assim é que o art. 5.º, n.º 2 do CPP limita a aplicação do n.º 1, ao prever que «A lei processual não se aplica aos processos iniciados anteriormente à sua vigência quando da sua aplicabilidade imediata possa resultar: a) agravamento sensível e ainda evitável da situação processual do arguido, nomeadamente, uma limitação do seu direito de defesa».
(…) Diferente interpretação, além de violar as referidas disposições legais, viola o princípio do Estado de direito democrático, ao violar o respeito e a garantia de efectivação dos direitos e liberdades fundamentais, previsto no art. 2.º da CRP
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E também o princípio da igualdade contido no art 13.º da CRP, pois há arguidos que, por o processo ter andando mais depressa, embora instaurado na mesma data, com constituição de arguido na mesma ocasião, tiveram a possibilidade de lançar mão do direito de recurso para o STJ, ao passo que outros, por um desfasamento temporal, não podem usufruir do mesmo.
Termina pedindo que, em conferência, se declare inconstitucional a actual alínea e), do n.º 1, do art. 400.º do CPP, no sentido de a mesma ser aplicável a processos em que os arguidos foram constituídos como tal em momento anterior à da sua entrada em vigor e que, consequentemente, o recurso seja admitido e apreciado de mérito.
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Colhidos os vistos, o processo foi presente à conferência para decisão.
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FUNDAMENTAÇÃO 9. A decisão sumária do relator: Como se viu, o Tribunal da Relação de Évora alterou a decisão de 1.ª instância, modificando a matéria de facto e requalificando o crime para tráfico de menor gravidade, previsto e punido pelo art. 25.º, alínea a) do DL 15/93, de 22/01 e condenando o arguido na pena de 4 anos de prisão efectiva, quando anteriormente havia sido condenado na pena de 5 anos e 6 meses de prisão.
Porque a alteração efectuada não se limitou a baixar a medida da pena, mas também a matéria de facto e a qualificação, não se pode falar em dupla conforme in melius (art. 400.º, n.º 1, alínea f) do CPP).
Todavia, o recurso não é admissível, por outra via. Em conformidade com o disposto no art. 432.º, n.º1, alínea b) do CPP, recorre-se para o Supremo Tribunal de Justiça “ de decisões que não sejam irrecorríveis...
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