Acórdão nº 1370/10.8TBPFR.P1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 11 de Dezembro de 2014
Magistrado Responsável | JOÃO BERNARDO |
Data da Resolução | 11 de Dezembro de 2014 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: 1 .
AA e marido, BB, intentaram contra: A Irmandade da Santa Casa da Misericórdia de …; A presente ação declarativa.
Alegaram, em síntese, que: No dia 18 de Outubro de 2001, a ré anunciou no jornal local denominado “Gazeta de …”, a venda de diversos bens imóveis, de que era proprietária e se encontravam devolutos; Referia a base de licitação e as condições de adjudicação e de pagamento, fazendo saber que no dia 25 seguinte, pelas 17.00 horas, no seu salão nobre, se realizaria a hasta pública respetiva; Eles, autores, confiando no teor do anúncio, mostraram-se interessados na aquisição do prédio urbano, sito no Lugar de …, freguesia de Penamaior, concelho de Paços de Ferreira, inscrito na matriz sob o artigo … e que tinha por valor base de licitação a quantia de 25.000.000$00.
Para o efeito, compareceram, no dia e hora indicados, no salão nobre da ré, tendo apresentado uma proposta em carta fechada com referência ao montante de 25.200.000$00; Esta aceitou, de imediato, a proposta, tendo-lhes sido logo adjudicado o imóvel e ficado consignado tal facto em ata da assembleia.
Perante a aceitação, procederem à entrega à ré de 6.300.000$00, a título de sinal e princípio de pagamento.
No dia 12 de Novembro de 2001 entregaram-lhe mais 16.380.000$00¸ No início de Dezembro de 2001, interpelaram-na verbalmente, no sentido de ser agendado dia e hora para a realização da escritura pública de compra e venda, tendo esta respondido que era condição de outorga da escritura, o prévio pagamento integral do preço e que, feito tal pagamento, procederia, até ao fim do ano de 2001, à marcação da respectiva escritura, contactando-os para o efeito.
Nessa conformidade, no dia 19 de Dezembro de 2001 entregaram-lhe mais 2.520.000$00.
Como a ré não procedeu à marcação da escritura, foram-na interpelando verbalmente para a realização da mesma.
Entretanto, por sua vez, convictos que o contrato definitivo seria outorgado em breve, prometeram vender o aludido prédio à sociedade “CC - Imobiliária, S.A.”, com a qual celebraram um contrato-promessa de compra e venda, em 03 de Outubro de 2006, vinculando-se, nele, a outorgar a escritura pública até 30 de Janeiro de 2007.
Em 19-01-2007 e em 15/1/2010 interpelaram, infrutiferamente, a ré, agora por escrito, para que marcasse a escritura pública de compra e venda.
Com estas comunicações e o total silêncio e omissão da ré converteu-se em incumprimento definitivo a mora dela; Pelo que – também atenta a falta de interesse que sobreveio na efetivação do contrato – comunicaram-lhe a resolução do contrato-promessa.
A ré sabia da impossibilidade de cumprir com os termos do contrato prometido, atuando em manifesta má fé, usufruindo como quis das quantias recebidas, o que nunca teria sucedido se tivessem sido informados da condição que impendia e impende sobre o imóvel, pelo que, pelo menos, a título de enriquecimento sem causa, deverá ser condenada a pagar-lhes juros moratórios desde as referidas datas, no montante global de € 49.082,46.
Pediram, em conformidade: Que seja declarado válida e eficaz a resolução do contrato-promessa; Que se condene a ré a: Restituir-lhes as quantias entregues, a título de sinal, no montante global de € 125.697,07; Pagar-lhes € 125.697,07, a título de sinal em dobro, ou seja, na quantia global de € 251,394,14; Pagar-lhes os juros moratórios calculados à taxa legal desde a data da entrega de cada uma das quantias a título de sinal e reforço do mesmo, até esta data, no montante vencido de € 49.082,46; Ou, caso assim se não entenda, quanto a este último pedido, Que se condene a ré a pagar-lhes os juros moratórios vencidos, calculados à taxa legal desde 31-01-2007, até esta data, no montante vencido de € 17.315,20 e, bem assim, os juros moratórios vincendos.
2 .
Contestou a ré.
Sustentou, em resumo, que: Resulta do anúncio que a escritura seria marcada por ela; Não consta qualquer prazo para a sua marcação; Sem prazo certo não pode falar-se em mora; De qualquer modo, os prazos concedidos pelos autores, de 10 e 20 dias, respectivamente, também não se podem considerar, nas circunstâncias concretas, razoáveis; Não havendo acordo das partes quanto ao prazo dentro do qual a marcação da escritura deveria ter lugar, o caminho correto seria o recurso à fixação judicial de prazo, o que não foi feito.
A mora em si não justifica a perda de interesse, apenas permite que sejam invocadas circunstâncias que justifiquem objetivamente essa perda de interesse na prestação. A não marcação da escritura no prazo concedido de 20 dias é um falso fundamento, pois é inócuo para se aferir perda de interesse na prestação, só relevando em sede de transformação de mora em incumprimento definitivo.
Seja como for, a fundamentação dos autores não sustenta a alegação de perda de interesse na prestação; pelo contrário, alegaram ter celebrado com terceiros um contrato-promessa de compra e venda do imóvel aqui em causa, sendo normal que mantenham interesse na aquisição do imóvel, para poderem cumprir esse contrato-promessa.
Concluem, dizendo que foi ilícita a resolução do contrato, o que inviabiliza a procedência da ação.
Mas, mesmo que assim não fosse, as consequências teriam de ser outras, pois não foi outorgado qualquer contrato-promessa entre as partes.
O anúncio não é um contrato-promessa, nem contém a assinatura dela, ré. Os recibos de quitação dos pagamentos efetuados pelos autores não são contratos-promessa nem o substituem. Sendo ainda certo que não estão assinados por quem tenha poderes para validamente a representar.
Por isso, nem formalmente nem materialmente se estão face a um contrato-promessa.
As vendas efetuadas desta forma não têm as características próprias do contrato-promessa, antes se enquadrando na figura da oferta ao público que necessita de formalização adicional por se tratar de transmissão de imóveis.
De qualquer modo, mesmo que a resolução tivesse sido lícita (o que não concede), as consequências não seriam a devolução em dobro acrescida de juros.
3 .
Na réplica os autores mantiveram as suas posições.
4 .
Por despacho proferido a fls. 60 e ss., foi admitida a intervenção acessória provocada de DD, EE, FF, GG, HH e II.
Os intervenientes EE, FF, GG e II, a fls. 91 e ss., contestaram, alegando que cessaram as suas funções na ré em Junho de 2004, tendo decorrido mais de cinco anos até à data em que foi intentada a presente...
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Acórdão nº 370/13.0TBEPS-A.G1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 08 de Outubro de 2015
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