Acórdão nº 9713/05.0TBBRG.G1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 07 de Maio de 2015

Magistrado ResponsávelFERNANDA ISABEL PEREIRA
Data da Resolução07 de Maio de 2015
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça I. Relatório: AA[1] intentou, em 7 de Novembro de 2005, a presente acção declarativa, sob a forma ordinária, no Tribunal Judicial de Braga, demandando BB e outros, pedindo se condenassem os réus a ver declarado: a) que não é correcta nem exacta a relação dos legados deixados pelo testador tal como é apresentada pela cabeça de casal no processo de inventário que corre termos no 2º Juízo Cível da Comarca de Braga sob o nº …/2000; b) que deve ser eliminada do teor da relação de bens a menção exarada na sua parte final, que diz que o legado efectuado ao autor incide apenas sobre a casa de habitação e um pequeno jardim ou logradouro; c) que os legados constituem uma unidade predial formada pela “Quinta de CC” e pelos adjacentes Eidos da DD e da EE e respectivas casas, tudo delimitado por caminhos, por ter sido essa a intenção do testador ao instituir os ditos legados, prédio misto hoje com a descrição na Conservatória do Registo Predial de Braga sob o nº … e que inclui os artigos matriciais urbanos nº 78, 82 e 83 e o rústico nº 458 da freguesia de Sequeira, Braga; é em conformidade com a descrita unidade predial que a cabeça de casal deve relacionar os bens e os legados no processo de inventário.

d) que a cabeça-de-casal, aqui segunda ré, deve relacionar os bens e os legados no referido processo de inventário.

Alegou, essencialmente, que por testamento outorgado em 18 de Maio de 1995 seu pai lhe legou a Quinta de CC, como unidade predial constituída pela casa, jardim e terrenos adjacentes, o que não foi considerado na relação dos legados apresentada pela cabeça-de-casal no processo de inventário instaurado na sequência do óbito do seu pai, Dr. FF.

Os réus BB e outros apresentaram-se a contestar, excepcionando a ilegitimidade passiva e alegando que a Quinta de CC, à qual o autor pretende ver alargado o legado testamentário, é um imóvel recente, nascido aquando da formação da nova matriz cadastral, cuja alteração foi levada a cabo pelo autor, pois a Quinta de CC era integrada por uma parcela diminuta daquela que o A pretende ver alargada na sua extensão (delimitada através de um muro e de uma cancela) encontrando-se os restantes prédios que o A considera integrados na Quinta de CC autonomizados entre si.

Deduziram pedido reconvencional no sentido de ser ordenado o cancelamento da descrição nº … que engloba os artigos matriciais urbanos nº 78,82 e 83 e o rústico nº 458, da freguesia de Sequeira, Braga, bem como a inscrição da mesma a favor do A.

Os réus GG e mulher contestaram e deduziram reconvenção em conformidade com o articulado apresentado pelos demais réus.

O A apresentou réplica, mantendo a posição defendida na petição inicial e pronunciam-se pela improcedência do pedido reconvencional.

Foi deduzida a intervenção principal provocada de HH, II, JJ e KK, que foi admitida.

Efectuado o julgamento, foi proferida sentença, a qual, julgando a acção totalmente procedente e a reconvenção totalmente improcedente, decidiu: “1. condenar os réus a ver declarado que: a) não é correcta a relação dos legados deixada pelo testador, tal como está apresentada pela cabeça de casal no processo de inventário n.º … que corre termos no 2º Juízo Cível desta comarca, na parte final da descrição da verba n.º12, quando a cabeça de casal refere que o testador instituiu o legado do usufruto a favor da interessada LL e o legado da raiz ou nua propriedade a favor do interessado AA, legados estes que incidem, apenas e somente, sobre a casa de habitação e um pequeno jardim de logradouro, tudo devidamente delimitado; b) deve ser eliminada da verba nº 12 da relação dos legados a menção referida em a); c) o legado ao A constitui uma unidade predial formada pela “Quinta de CC” composta pela casa referida no facto provado 8º, o jardim referido no facto provado 9º e os terrenos adjacentes que compreendem a bouça de dentro de mato e pinhal que têm a área de 7.206,00 m2, terreno de cultivo com horta, pomar, laranjal, vinha em ramadas, o “Eido” da DD e o “Eido” da EE bem como as casas neles implantadas, devidamente delimitada por ser marginada de todos os lados por caminhos muito antigos, por ter sido essa a vontade do testador, descrito na CR Predial de Braga sob o nº … e que inclui os artigos matriciais urbanos nº 78, 82 e 83 e o rústico nº 458 da freguesia de Sequeira, Braga.

d) a cabeça de casal no processo de inventário deve relacionar o imóvel legado ao A em conformidade com o referido em c).

  1. Absolver o A. do pedido reconvencional.” Desta sentença apelaram os réus MM, GG e NN II – Imobiliária, SA, tendo o Tribunal da Relação de Guimarães, por acórdão de 20 de Fevereiro de 2014, julgado o recurso improcedente e confirmado a sentença recorrida.

    De novo inconformados, recorreram de revista os mesmos réus.

    Na respectiva alegação formularam as seguintes conclusões (sic): «1. A motivação essencial do presente recurso reside na discordância relativamente à interpretação que o douto acórdão sufragou quanto à extensão do prédio objecto do referido legado, designadamente a interpretação relativa à composição da referida "Quinta de CC" que extraiu da declaração, casa de habitação e um pequeno jardim e logradouro tudo devidamente delimitado.

  2. A douta sentença recorrida considerou que o testador ao identificar o "logradouro" se quis referir a uma "unidade predial com a área de 25.430,00 m2, em especial a parte agrícola, terrenos adjacentes que compreendem a bouça de dentro de mato e pinhal, terreno de cultivo com horta, pomar, laranjal, vinha em ramadas, o Eido da DD e o Eido da EE bem como as casas neles implantadas." (cfr. pontos 19 e 21 da matéria de facto assente).

  3. Dispõe o artº 722°, n" 1, do CPC (art° 674°, nº 1 no NCPC), que, em sede de recurso de revista, pode o recorrente alegar, além da violação de lei substantiva, a violação da lei de processo.

  4. Assim, sendo da competência do STJ o julgamento da questão de direito, com base nos factos julgados pelas instâncias, cabe-lhe proceder ao expurgo da matéria conclusiva e de direito incluída nos pontos 19, 20, 21, 22, 23, 24, 25 e 26 da matéria de facto, em violação das disposições do art° 607°, nºs 3, 4 e 5 do NCPC (art°s 264°, n? 1 e 2, 664° e 666°, nº 4 no anterior CPC), para julgar, apenas, com base em "factos", designadamente declarando como não escritas as referidas respostas, na esteira do princípio contido nos art° 646°, nº 4 e 666° do anterior CPC.

  5. Tais respostas afiguram-se como de carácter conclusivo, uma vez que, nos seus próprios termos, pré-determinam, em sede de resposta a matéria de facto, a interpretação da vontade do testador.

  6. Ilegalidade e consequente pedido de desconsideração que aqui expressamente se invoca para todos os efeitos decorrentes da mesma, nos termos previstos no artº 674° do NCPC (anteriores art°s 721°, nº 2,722°, nº 1).

  7. No douto acórdão recorrido concluiu-se "como o tribunal recorrido, que não existe qualquer delimitação física entre os terrenos".

  8. Conforme se refere no douto acórdão recorrido, em jeito de fundamentação para tal conclusão, "a Mmª" Juíza refere na decisão sobre essa matéria o que viu no local, tendo referido que "na inspecção ao local foi possível constatar que a parte do terreno que os réus (aqui recorrentes) alegam ter sido legada ao A. (casa de terreno até à fossa de tis. 675) termina com um socalco suportado, em parte. por um muro acedendo-se ao socalco inferior através de umas escadas".

  9. Acrescentando-se ainda no mesmo acórdão que "do depoimento da testemunha OO, resulta que existia um socalco que tinha como função o suporte de terras".

  10. Isto posto, verifica-se que aquela conclusão está em absoluta contradição com a referida fundamentação uma vez que a negada existência de delimitação física é evidenciada pela reconhecida existência de um muro e um socalco.

  11. Para além disso, o douto acórdão recorrido revela ainda falta de adequada e errada fundamentação, na parte em que refere que "não existe qualquer delimitação entre o jardim e o terreno que a recorrente diz dever ser considerado como logradouro" e quando refere que "também dos referidos depoimentos não resulta que haja qualquer delimitação entre o jardim e o terreno que os réus (aqui recorrentes) dizem ser o logradouro".

  12. Ora, é manifesto que a delimitação que estava em causa e que importava apurar se existia ou não, não era a que existisse entre o jardim e o terreno que os recorrentes dizem ser o logradouro.

  13. A delimitação em causa nos presentes autos é a que separa o jardim e terreno que os recorrentes entendem corresponder ao logradouro, dos restantes terrenos que o Autor (recorrido) diz fazerem parte do logradouro.

  14. Tal é o que resulta do auto de inspecção ao local, que consta da audiência de julgamento do dia 24/09/2012 e que é do seguinte teor: - O local que os RR. consideram como sendo o legado ao A., termina com um socalco, suportado em parte, por um muro ( ... ) - Prosseguindo no socalco junto à casa em direcção ao muro que confronta com o caminho, existem junto a esse muro, quatro degraus que permitem o acesso ao terreno de baixo e que se encontram no mapa topográfico na sequência da linha que passa junto à fossa.

    - Tais escadas, também constam do plano topográfico junto à linha que termina junto ao tanque 15. Por isso que se verifica que os fundamentos invocados no acórdão recorrido para justificar a conclusão da inexistência de delimitação física dos prédios em causa, estão em contradição com a referida conclusão, sendo que deveriam ter conduzido logicamente a conclusão oposta.

  15. Assim, a conclusão expedida no douto acórdão no sentido da negação da existência de delimitação física entre os terrenos em causa padece de um vício real no raciocínio do julgador, concretizado em erro notório nos pressupostos de apreciação da questão em causa.

  16. Padece ainda do vício de fundamentação contraditória, por omissão de fundamentos de facto e de direito adequados, revelando-se, ademais, contraditórios nos seus termos e com os...

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