Acórdão nº 620/09.8TBCNT.C1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 02 de Novembro de 2017
Magistrado Responsável | FERNANDA ISABEL PEREIRA |
Data da Resolução | 02 de Novembro de 2017 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: I. Relatório: AA intentou, em 15 de Junho de 2009, no Tribunal Judicial de …., acção declarativa de condenação, com processo ordinário, contra a Companhia de Seguros BB, SA, pedindo que esta fosse condenada: - a liquidar à Caixa Geral de Depósitos o montante ainda em dívida relativo ao mútuo contraído pela autora e seu marido junto daquela entidade, no valor de € 46.077,07; - a pagar à autora as prestações pagas por si à mesma Caixa Geral de Depósitos e à própria ré, desde Abril de 2007 até à data da propositura da acção, acrescidas de juros até pagamento, computando os vencidos em € 826,02; - a devolver-lhe o valor por si pago a título de prémios de seguro desde a data da comunicação da sua incapacidade, no montante de €244,83, acrescido de juros vencidos e vincendos, sendo os primeiros no valor de € 23,43; - a pagar-lhe todas as prestações decorrentes do empréstimo que a autora liquidar à Caixa Geral de Depósitos desde a data da propositura da acção até pagamento integral da quantia mutuada e, bem assim, a devolver-lhe o valor dos prémios que pagar desde a mesma data até integral liquidação do referido empréstimo.
Para o efeito, alegou, em síntese, que celebrou com a ré um contrato de seguro do ramo vida para garantia do pagamento do empréstimo à Caixa Geral de Depósitos em caso de morte ou invalidez da autora.
Que sofre de depressão severa, com incapacidade de 100%, desde Novembro de 2003 e a ré recusa a responsabilidade, invocando “omissão de declarações” aquando da subscrição do contrato de seguro.
A ré contestou alegando, em suma, que a autora omitiu a sua depressão severa desde 1998, anterior ao contrato, o que exclui a sua responsabilidade em face do clausulado contratual, sendo que se a ré não contrataria nos mesmos termos se soubesse da pré-existência da doença. Mais alegou que os prémios correspondem à apólice em vigor, uma vez que a seguradora continua a correr todos os riscos, com excepção dos decorrentes da doença pré-existente.
Em réplica, a autora afirmou que apenas teve sintomas a partir de Julho de 2003 e só em Março de 2007 ficou a saber que a sua doença era definitivamente incapacitante.
Foi admitida a intervenção principal da Caixa Geral de Depósitos.
A Autora apresentou articulado superveniente, que foi admitido, alegando ter passado a sofrer de carcinoma, tendo-lhe sido atribuída incapacidade de 60%, que igualmente a impede de trabalhar.
Realizado o julgamento, foi proferida sentença, na qual foi decidido o seguinte: «pelo exposto, na parcial procedência da acção, absolvendo a Ré do demais peticionado, condena-se a mesma no seguinte: a) - a liquidar à CGD o montante em dívida do empréstimo referido na apólice n.º 04…9, desde 1.6.2013 e até final do prazo do mútuo, em valor a apurar em incidente posterior.
-
- a pagar à A. os valores que esta pagar à CGD desde o presente momento por conta do mesmo empréstimo (em montante a fixar em liquidação posterior), até integral liquidação pela Ré do valor acima mencionado em a), com juros legais desde as datas em que a A. efectuar tais pagamentos à CGD.
-
- a devolver à A. os valores relativos aos prémios de seguro por si recebidos desta, desde 1.6.2013 e que venha a receber, com juros legais desde as datas de pagamento e até integral devolução das quantias a liquidar em incidente posterior.
Inconformada, apelou a ré.
A autora recorreu subordinadamente.
O Tribunal da Relação de …, por acórdão proferido em 15 de Dezembro de 2016, julgou o recurso da ré procedente e improcedente o recurso subordinado da autora, revogando a sentença recorrida e absolvendo a ré do pedido.
Desta decisão veio a autora interpor recurso de revista, formulando na respectiva alegação as seguintes conclusões: «
-
O acórdão ora recorrido assumiu sem qualquer espécie de crítica o ponto de visa da seguradora R., mas não consta do documento entregue à A. e por ela junta sob o nº. 1 com a petição inicial que a mesma tenha tido conhecimento do artº. 3º. das condições especiais da apólice do seguro de grupo de que era beneficiária e também não resulta do documento entregue à A. e por ela junta sob o nº. 1 com a petição inicial, que a mesma tenha tido conhecimento do artº. 2º., § 4º.º. das condições gerais da apólice do seguro de grupo de que era beneficiária, nem esse conhecimento resulta de qualquer facto considerado provado.
-
O que se escreve na informação entregue à A. e na rubrica relativa à declaração do estado de saúde é apenas isto: “Declaro que nos últimos 6 meses não tive qualquer alteração ao meu estado de saúde devido a doença ou acidente que me tenha impossibilitado de exercer a minha regular e normal actividade profissional. Mais declaro tomar conhecimento que está excluída qualquer incapacidade física já adquirida. A prestação de falsas declarações permitirá à Companhia de Seguros BB anular esta adesão, ficando sem efeito as garantias conferidas por esta Apólice” C) Desta simples comunicação não se pode concluir, sem mais, que a A. tenha tomado conhecimento que, qualquer doença, mesmo que ela desconhecesse está excluída das garantias da apólice, apenas ficando a conhecer que essa existia relativamente às doenças que ela conhecesse e sobre as quais prestasse falsas declarações.
-
Em documento com o logotipo da R. e sobre a epígrafe “RISCOS EXCLUÍDOS” nenhuma referência se faz a essa situação objectiva, qual fosse a de que a existência de qualquer doença anterior, mesmo desconhecida significaria a exclusão da garantia.
-
Ora como bem se refere no Ac. do Supremo Tribunal de Justiça de 15-12-2011 (procº. 4867/07.3TBSTS.P1.S1), cujo relator foi o sr. Cons. Lopes do Rego, decidiu-se que: 1. No âmbito da celebração de um contrato de seguro multi-riscos habitação, configurável como contrato de adesão e visando segurar os danos provenientes de intempéries e inundações em certo muro de divisão e contenção de terras, celebrado por o proprietário ter verificado que, afinal, o originário seguro do imóvel não abrangia tal risco, recai sobre a seguradora um particular dever de informação e esclarecimento do segurado quanto ao exacto âmbito dos riscos efectivamente cobertos, de modo a resultarem, no momento em que se procede à alteração contratual, plenamente apreensíveis os limites, condições e exclusões da cobertura acordada.” F) É isso que determina o diploma das Cláusulas Contratuais Gerais, aprovado pelo Decreto- Lei nº. 446/85, de 25 de Outubro, pois dispõe o art. 1º., n° 1, do referido Diploma Legal que as cláusulas contratuais gerais elaboradas sem prévia negociação individual, que proponentes ou destinatários indeterminados se limitem, respectivamente, a subscrever ou aceitar, regem-se pelo presente diploma, acrescentando o seu n° 2 que tal diploma se aplica igualmente às cláusulas inseridas em contratos individualizados, mas cujo conteúdo previamente elaborado o destinatário não pode influenciar, e o seu n° 3 que o ónus da prova de que uma cláusula contratual resultou de negociação prévia entre as partes recai sobre quem pretenda prevalecer-se do seu conteúdo”.
-
Por sua vez, o art. 5º. do citado Dec. Lei nº 446/85 prescreve que "1 -As cláusulas contratuais gerais devem ser comunicadas na íntegra aos aderentes que se limitem a subscrevê-las ou aceitá-las” e o nº. 2 que “A comunicação deve ser realizada de modo adequado e com a antecedência necessária para que, tendo em conta a importância do contrato e a extensão e complexidade das cláusulas, se torne possível o seu conhecimento completo e efectivo por quem use de comum diligência”, estipulando o nº. 3 que “ O ónus da prova da comunicação adequada e efectiva cabe ao contratante que submeta a outrem as cláusulas contratuais gerais ".
-
Por sua vez, o art. 6º do mesmo diploma prescreve por seu turno que: " 1 - O contraente que recorra a cláusulas contratuais gerais deve informar, de acordo com as circunstâncias: a outra parte dos aspectos nela compreendidos cuja aclaração se justifique” e que “2 - Devem ainda ser prestados todos os esclarecimentos razoáveis solicitados." I) Não resulta dos autos que para além do documento junto pela autora sob o nº. 1 lhe tenha sido enviado qualquer outro com as cláusulas contratuais da apólice de seguro de grupo, a que ela aderiu e não sendo controvertido que o contrato discutido nos autos se configura efectivamente como contrato de adesão, o princípio da boa fé impunha efectivamente à seguradora um particular dever de informação, esclarecimento e comunicação sobre o âmbito efectivo da cobertura.
-
Nem sequer se demonstra, pois a seguradora nem sequer o alegou que tenha remetido à autora a apólice de seguro com as...
-
Para continuar a ler
PEÇA SUA AVALIAÇÃO-
Acórdão nº 857/08.7TVLSB.L1.S2 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 19 de Dezembro de 2018
...e acessível em www.dgsi.pt – e o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 2 de Novembro de 2017 – proferido no processo n.º 620/09.8TBCNT.C1.S1, acessível em www.dgsi.pt e subscrito pela signatária na qualidade de [21] Assim, Almeno de Sá, ob. cit., pág. 61 e Almeida Costa e Menezes Cordei......
-
Acórdão nº 857/08.7TVLSB.L1.S2 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 19 de Dezembro de 2018
...e acessível em www.dgsi.pt – e o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 2 de Novembro de 2017 – proferido no processo n.º 620/09.8TBCNT.C1.S1, acessível em www.dgsi.pt e subscrito pela signatária na qualidade de [21] Assim, Almeno de Sá, ob. cit., pág. 61 e Almeida Costa e Menezes Cordei......