Acórdão nº 4503/14.1TCLRS.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 29 de Junho de 2017

Data29 Junho 2017
Órgãohttp://vlex.com/desc1/1997_01,Supreme Court of Justice (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: I – RELATÓRIO AA instaurou, em 23 de setembro de 2002, na então Vara Mista da Comarca de Loures (Juízos Centrais Cíveis de Loures, Comarca de Lisboa Norte), contra Banco BB, S.A., ação declarativa, sob a forma de processo ordinário, pedindo que o Réu fosse condenado a pagar-lhe a quantia de € 50 149,33, acrescida de juros legais, desde a citação até integral pagamento.

Para tanto, alegou, em síntese, que, com sua mulher, sendo titulares de uma conta bancária no R., que movimenta, em 1998, encontrou dificuldades em solver compromissos de tesouraria, agravadas por o R., inexplicavelmente, ter apreendido o seu cartão de débito e haver deixado de entregar-lhe módulos de cheques, sem rescisão da convenção do uso do cheque, para além de lhe ter recusado um crédito, estrangulando-o assim financeiramente e limitando-lhe a atividade comercial; o R., entretanto, instaurou-lhe execução hipotecária, à revelia das negociações, cobrando pelo distrate um valor superior; tendo solicitado o encerramento da conta, com a devolução do saldo, o R. entregou parte deste sem emissão de documento da retenção ou cobrança da parte não devolvida; a prática incorreta do R. causou-lhe danos patrimoniais, no valor de € 20 149,33, e danos não patrimoniais avaliados na quantia de € 30 000,00 Contestou o R., por impugnação, concluindo, pela improcedência da ação ação.

O A. pediu ainda a condenação do R. em multa e indemnização, como litigante de má fé, designadamente pela forma como respondeu na contestação.

Realizada a audiência de discussão e julgamento, foi proferida, em 16 fevereiro de 2007, sentença, julgando-se a ação improcedente, prejudicada pelo provimento de agravo interposto pelo A.

Repetido o julgamento, foi proferida, em 17 de janeiro de 2012, nova sentença absolutória, da qual apelou o A., tendo o Tribunal da Relação de Lisboa, por acórdão de 23 de janeiro de 2014, anulado a sentença, para a ampliação da matéria de facto.

Efetuado novo julgamento, exarou-se, em 1 de dezembro de 2015, outra sentença, absolvendo-se o R. do pedido.

Inconformado, o A. voltou a apelar para o Tribunal da Relação de Lisboa, que, por acórdão de 20 de outubro de 2016, julgando improcedente a apelação, confirmou a sentença.

Inconformado ainda, o A. recorreu para o Supremo Tribunal de Justiça e, tendo alegado, formulou essencialmente as conclusões:

  1. O acórdão recorrido é nulo, nos termos do art.615.º, n.º s 1, alínea c), e 4, do CPC, por falta de fundamentação de direito, nomeadamente das normas aplicadas quanto à exigência formal de demonstração dos elementos típicos do dano e nexo de causalidade que possam sobrestar ao reconhecimento da dispensa de prova e de presunção do nexo causal.

  2. Existiu ilicitude culposa do R., ao recusar a entrega de módulos de cheques sem fundamento ou razão expressa nem tutela na lei própria, ao apreender o cartão de débito sem fundamento legal e aviso prévio, ao omitir o dever de quitação por documento contabilístico bastante e ao omitir deveres de informação certa e fidedigna em questão relevante como a contabilização detalhada da liquidação de crédito hipotecário.

  3. Este conjunto de ilícitos limitou a normal transcorrência da vida pessoal, profissional e comercial do Recorrente, causando-lhe danos patrimoniais diretos e indiretos.

  4. As presunções têm parte relevante e atendível para alcançar o que materialmente não pode ser alcançado, dispensando-se de prova plena o nexo causal, em especial quando nenhum outro é alvitrado, em substituição do invocado em juízo, atentos à regra do art. 412.º, n.º 1, do CPC, cuja aplicação o Tribunal a quo rejeitou.

  5. Presumem-se também os danos morais perenes através de conduta ilícita e culposa, segundo as regras dos arts. 349.º e 351.º do Código Civil.

  6. O acórdão recorrido violou os arts. 1.º, 1.º-A e 8.º, do DL n.º 454/91, de 28/12, na redação do DL n.º 316/97, de 19/11, 3.º, da LUCh., 21.º, alínea a), e 22.º, alínea b), do DL n.º 446/85, de 25/10, 224.º, n.º 1, 334.º, 406.º, 433.º, 787.º, n.º 1, 847.º, 848.º, 1142.º, 1143.º, 1154.º, 1157.º, 1170.º, n.º 1, 1180.º e 1206.º, do Código Civil, 542.º, n.º 2, alíneas a) e b), e 446.º, n.º 1, do CPC, 74.º do RGISSF, DL n.º 298/92, de 31/12, 28.º, n.º 1, alínea b), e 35.º, n.º 1, do CIVA, e 75.º, n.º 1, da Lei Geral Tributária.

  7. Acrescem ainda os arts. 349.º e 351.º, do CC, e 412.º, n.º 1, do CPC, cuja interpretação, aplicação ou afastamento se arguem de inconstitucionalidade, por violação dos imperativos dos arts. 3.º, n.º 2, 9.º alínea b), 13.º, 18.º, n.º 1, 20.º, n.º 5, 26.º, n.º 1, 60.º, n.º 1, 62.º, n.º 1, 202.º, n.º 2, e 203.º, da Constituição da República Portuguesa.

    Com a revista, o Recorrente pretende a revogação do acórdão recorrido e a sua substituição por decisão, que condene o Réu no pedido e ainda, como litigante de má fé, em multa e indemnização.

    O R. não contra-alegou.

    Por acórdão de 9 de março de 2017, a Relação indeferiu ainda a arguição da nulidade do acórdão.

    Corridos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.

    Neste recurso, para além da nulidade do acórdão recorrido, está essencialmente em discussão, a efetivação da responsabilidade civil de entidade bancária pelo exercício da sua atividade em relação a certo cliente.

    II – FUNDAMENTAÇÃO 2.1. Pelas instâncias, foram dados como provados os seguintes factos: 1.

    O A. é co-titular com a sua mulher, CC, desde 10 de maio de 1995, da conta de depósitos, na modalidade solidária, na agência de Loures do R., identificada com o n.º 36…60.

    1. Ao longo dos tempos, o A. veio fazendo, nessa conta, aplicações financeiras, descontos comerciais e crédito de vários tipos.

    2. Movimentando-a com recurso a cheques e cartões de débito e crédito.

    3. Em 1998, nessa conta, foram apresentados a saque alguns cheques que o A. emitiu e entregou “em promessa” de pagamento.

    4. O R. apreendeu o cartão de débito, que permitia ao A. ter acesso imediato ao saldo da conta.

    5. O R. recusou ao A. um crédito solicitado em fevereiro de 2000.

    6. O R. deixou de emitir módulos de cheques referentes à conta, sem rescindir a convenção do uso de cheque com qualquer dos seus titulares.

    7. O R. instaurou, em 7 de janeiro de 2000, execução (hipotecária) ordinária, para pagamento de quantia certa, que correu termos no Tribunal Judicial de Paredes de Coura, contra o ora A. e a mulher, tendo vindo a...

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