Acórdão nº 1577/14.9T8STR.E1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 19 de Outubro de 2017
Magistrado Responsável | ROSA RIBEIRO COELHO |
Data da Resolução | 19 de Outubro de 2017 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
ACORDAM NO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA 2ª SECÇÃO CÍVEL I – Na presente ação declarativa movida por AA - Investimentos Imobiliários, S. A.,[1] contra BB - Serração de Madeiras, Lda.,[2] em que a autora pediu a condenação da ré a reconstituir uma parede exterior de um armazém e as coberturas de cinco armazéns seus, ou a pagar-lhe uma indemnização não inferior a € 244.000,00, foi proferida sentença que julgou a ação inteiramente improcedente, absolvendo a ré dos pedidos, e condenou a autora em multa de 10 UC’s como litigante de má fé, remetendo para momento posterior a fixação da correspondente indemnização até ao limite máximo de € 5.000,00.
A autora apelou, tendo apresentado alegações onde pede a revogação da sentença e a sua substituição por outra decisão que, julgando a ação procedente, condene a ré nos exatos termos pedidos ou em indemnização a calcular em sede de incidente de liquidação; pediu ainda a sua absolvição quanto à litigância de má fé.
Na Relação, a Exma. Relatora proferiu despacho onde convidou a apelante a sintetizar as conclusões formuladas, sob pena de não se conhecer do recurso, nos termos do art. 639º do CPC[3].
Tendo a apelante apresentado novas conclusões no seguimento do referido despacho, foi pela Exma. Relatora proferido um outro que rejeitou o recurso, não conhecendo dele, com custas a cargo da apelante.
Os fundamentos usados para esta decisão foram, em síntese nossa, os seguintes: - o recorrente tem o ónus de formular conclusões, que são uma enunciação resumida do alegado; - pretende-se com isto uma determinação precisa e clara dos aspetos a reapreciar, tanto mais que o objeto do recurso é dado pelo teor das conclusões, só abrangendo as questões aí suscitadas; - não têm cabimento interpretações complacentes e facilitistas do regime estatuído pela lei a este propósito, pois são violadoras do princípio da igualdade, do princípio do contraditório e do princípio da colaboração com o tribunal; - por se ter considerado que as conclusões da apelante não respeitavam a forma sintética exigida, foi formulado convite para que se procedesse à sua síntese; - a apelante não supriu a referida irregularidade, “… pois as proposições finais não constituem qualquer enunciado fundamentado, sintético e resumido dos fundamentos do recurso, limitando-se a ora recorrente a vazar os pormenores argumentativos próprios da alegação …”; A apelante reclamou deste indeferimento para a conferência, defendendo que desenvolveu um claro e manifesto esforço de síntese, tendo em conta a complexidade da matéria de facto em causa e os muitos erros de apreciação por parte do tribunal de 1ª instância; e sustentou ainda que o despacho reclamado não teve em conta, ao declarar a rejeição total do recurso, que esta rejeição apenas deve abarcar a parte afetada.
Foi então proferido acórdão onde, corroborando-se a posição seguida no despacho reclamado – a cuja transcrição procedeu -, se entendeu que o mesmo não violava os princípios referenciados, pelo que negou provimento à reclamação e manteve a decisão de não admissão do recurso, com custas pela recorrente.
Inconformada, a autora AA, S.A., interpôs o presente recurso de revista para este STJ, tendo apresentado alegações onde pede que se declare a nulidade do acórdão recorrido, ou, não se entendendo assim, que se proceda à sua revogação, substituindo-o por outro que admita o recurso na sua totalidade.
Para tanto, formulou as conclusões que passamos a transcrever: 1. O acórdão recorrido é nulo por dois argumentos distintos: 2. Em primeiro lugar, verifica-se que o acórdão se limita a copiar ipsis verbis a decisão singular de rejeição do recurso que havia sido “admito” – sic – pelo Tribunal a quo.
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Não houve qualquer juízo de ponderação que, necessariamente, teria que acontecer.
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A Recorrente fica sem saber qual foi o trabalho resultou da reclamação para conferência.
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Tal equivale a ausência de decisão.
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Nestes termos, o acórdão é nulo por não especificação dos fundamentos de direito e ausência de pronúncia sobre questões que devesse apreciar (art. 615.°, 1, als. b) e d), ex vi art. 674.°, 1, al. c), do CPC).
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Em segundo lugar, impunha-se um juízo valorativo sobre a rejeição total ou parcial do recurso, tal como resulta da parte final do art. 629.°, n.° 3, do CPC, tendo em conta os princípios que norteiam a legislação adjetiva [realização da justiça, busca da verdade material, celeridade, gestão processual, cooperação e boa-fé], e as consequências gravosas que resultam da sua rejeição total ou parcial.
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Tal não aconteceu.
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Nestes termos, o acórdão é igualmente nulo por ausência de pronúncia sobre a parte afetada (total ou parcial) (art. 615.º, 1, als. b) e d), ex vi art. 674.°, 1, al. c), do CPC).
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Caso assim não se entenda, o que apenas se concebe à cautela, por mera hipótese raciocínio, sempre se conclui que o acórdão recorrido, maxime, decisão singular, carece de fundamento, sendo várias as razões.
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Desde logo, há na doutrina autorizada e na jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça, uma clara preferência pelos critérios e princípios materiais, maxime uma preferência manifesta pelo valor da descoberta da verdade material e realização da justiça em detrimento de posições formalistas que ignoram as circunstâncias concretas e, assim, colocam em causa aqueles valores primordiais.
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Descendo ao caso concreto, verificamos que a matéria de recurso reveste uma complexidade, de direito e de facto, considerável.
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São apresentados três fundamentos distintos como causas de nulidade da sentença.
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Relativamente a cada um deles a Recorrente teve necessidade de repetir parte dos factos que constituem o fundamento da nulidade invocada.
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Em termos de impugnação de matéria de facto, o recurso versa sobre factos ocorridos ao longo de mais de 15 anos, envolvendo questões técnicas que exigem uma análise detalhada e cuidada para não se cair no mesmo erro de apreciação em que caiu o tribunal a quo.
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Tais factos são suportados e apoiados por dezenas de documentos, extensos depoimentos, e um relatório pericial extenso.
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Estando consciente dessa complexidade, a Recorrente juntou ao recurso um parecer técnico onde, em duas páginas, são apresentadas, em resumo, uma mera descrição fáctica e sequencial e três conclusões técnicas que permitem ao tribunal ad quem perceber imediatamente e com toda a facilidade o objeto de recurso no que diz respeito à impugnação da meteria de facto.
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Após o convite ao aperfeiçoamento, a Recorrente esforçou-se por sintetizar as suas conclusões.
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As conclusões inicialmente apresentadas estende-se por 244 parágrafos, sendo que 174 parágrafos incidem sobre os três motivos distintos para a nulidade da sentença, e os...
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Acórdão nº 1579/15.8T8VIS.C1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 09 de Maio de 2019
...remissão do art. 666.º, n.º 1, do Código de Processo Civil. [2] Vide, p. ex., o acórdão do STJ de 19 de Outubro de 2017 — processo n.º 1577/14.9T8STR.E1.S1. [3] Sobre a controvérsia em torno dos conceitos de resolução e de revogação, vide Nuno Manuel Pinto Oliveira, “Revogação das doações”,......
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