Acórdão nº 2058/15.9T8PRD.P1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 12 de Outubro de 2017
Magistrado Responsável | TÁVORA VICTOR |
Data da Resolução | 12 de Outubro de 2017 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
1. RELATÓRIO.
1.
AA veio propor contra os Réus BB, CC e DD a presente acção declarativa de condenação sob a forma de processo comum, pedindo a sua condenação solidária a reconhecer o seu direito de usufruto relativamente ao prédio descrito no artigo 6.º da petição inicial e a restituírem-lho, livre de pessoas, coisas e animais, abstendo-se de perturbar-lhe a sua posse, bem como a indemnizá-la num valor nunca inferior a € 250,00 por cada mês que ocupem o imóvel desde a data da interpelação escrita, referida no ponto 22.º da petição inicial, até à data em que o entreguem livre e desocupado de pessoas, coisas e animais e respectivas chaves.
Para tanto alegou que, por escritura pública de doação, outorgada em 16-01-2008, doou, juntamente com o seu marido, ao filho de ambos, EE, o prédio identificado no artigo 6.º da petição inicial, para si reservando o usufruto. Em 19-12-2009, o filho e a namorada, a Ré BB, decidiram viver juntos, com os filhos desta, no primeiro andar da casa doada, com excepção de um quarto onde estava acamado o marido da Autora, o que ocorreu com o seu consentimento e do marido. Detectado, em 08-09-2012, um cancro a EE, em 10-12-2012, este casou com a Ré BB, com o único objectivo de lhe assegurar uma reforma. EE faleceu em 11-12-2012. Alguns meses depois, interpelou os Réus para desocuparem o imóvel, o que estes recusam fazer, impedindo-a da sua utilização e fruição plena. Esse facto causa-lhe um dano correspondente ao valor locativo da área ocupada, que calcula em € 250,00 mensais.
2. Os Réus deduziram contestação, alegando que a Ré BB começou a namorar com o filho da Autora no ano de 2003, vindo a casar com o exclusivo fim de beneficiar e proteger o seu futuro. A Autora e o seu marido bem sabiam, desde a celebração da escritura pública de doação, que era intenção do filho viver no prédio em causa juntamente com os pais e os Réus, pelo que o usufruto estipulado foi a forma legal encontrada para assegurar uma habitação para a Autora e marido até à sua morte. A casa de banho e sala do primeiro andar, também podem ser usadas pela Autora e marido, o que aquela não faz porque não quer. O usufruto teve sempre como condição a partilha do prédio, pelo que as obras do prédio foram efectuadas e pagas pelo filho da Autora, o EE. Foram feitas após a escritura de doação e para permitir que os Réus fossem para lá viver. Enquanto herdeira do EE, a Ré BB tem direito ao uso e habitação do prédio, que não colide com o direito de usufruto da Autora. De todo o modo, esta excede os limites impostos pela boa fé e age com abuso do direito. Concluíram pela improcedência da acção e absolvição do pedido.
3. Foi realizada audiência prévia e elaborado despacho saneador.
4. A Autora deduziu ampliação do pedido, pedindo a condenação dos Réus em indemnização de 10.000,00 euros por danos não patrimoniais padecidos e de 4.000,00 euros por litigância de má-fé. Foi proferido despacho de não admissão do primeiro pedido.
5. Realizou-se audiência de discussão e julgamento com observância do legal formalismo e foi pronunciada sentença com o seguinte dispositivo: «Pelo exposto, julga-se a acção parcialmente procedente e, em consequência: A) Condenaram-se os RR. a reconhecer o direito de usufruto da A. relativamente o prédio descrito no ponto B) dos factos dados como provados e nos termos constantes do ponto W) dos factos provados; B) Absolveram-se os RR. do demais peticionado pela A.».
6. A Autora recorreu da sentença, tendo a Relação do Porto julgado parcialmente procedente a apelação e em consequência revogou em igual medida a sentença recorrida, reconhecendo o direito de usufruto da Autora AA sobre o prédio urbano sito na Rua … n.º … em Parada …, concelho de …, inscrito na respectiva matriz sob o artigo 880 e descrito na Conservatória do Registo Predial de … sob o artigo 892.º e condenar os RR. BB, CC e DD a restituir-lho livre de pessoas, coisas e animais e abster-se de perturbar a sua posse mantendo a decisão quanto ao demais sentenciado.
Por seu turno, inconformados com o decidido por último, recorreram os RR., agora de revista, tendo no fim de tudo quanto alegaram pedido a revogação do acórdão da 2ª instância. Foram para tanto apresentadas as seguintes, Conclusões.
1. Com o devido respeito pela decisão proferida pelo Tribunal da Relação do Porto e, salvo melhor opinião, cremos, que esta não procedeu a uma correcta e ponderada aplicação do direito aos factos provados devendo a mesma ser revogada.
2. Igualmente, cremos que o acórdão de que se recorre não fez uma correcta e ponderada interpretação da prova produzida em sede de audiência de julgamento e sua submissão ao direito.
3. Em primeiro lugar, importa salientar que segundo o estipulado no art.° 639.º n° 2 do CPC quando o recurso incida sobre matéria de direito, como também era o caso do recurso interposto pela aqui recorrida, para o Tribunal da Relação do Porto, as conclusões deveriam de ter indicado: a) As normas jurídicas violadas; b) O sentido com que, no entender do recorrente, as normas que constituem fundamento jurídico da decisão deviam ter sido interpretadas e aplicadas; c) Invocando-se erro na determinação da norma aplicável, a norma jurídica que, no entendimento do recorrente, devia ter sido aplicada, o que, salvo melhor opinião, a aí recorrente, aqui recorrida, não cumpriu com tais ónus. (sic) 4. Em segundo lugar, e salvo melhor opinião, a decisão proferida em 1ª Instância não apreciou os pedidos deduzidos sob as alíneas b) e c) do requerimento de ampliação do pedido apresentado nos autos pela autora a fls., não fazendo quaisquer considerações de direito ou de facto sobre os mesmos.
5. Tal omissão constitui uma nulidade prevista no art.° 615°, n° 1, al) d) do CPC, que para os devidos efeitos se invoca.
6. Depois, cremos igualmente que o Tribunal recorrido não apreciou convenientemente as questões jurídicas que lhe foram submetidas, não fazendo uma justa e correcta interpretação da prova produzida em sede de audiência de julgamento, que necessariamente, impõem, salvo melhor opinião, solução diferente da sufragada.
7. Sempre com o devido respeito, o Tribunal a quo violou disposições de direito probatório substantivo, nomeadamente, o disposto nos artigos 1439°; 1441°; 1445°; 1484°; 1485°; 1486º; 1487° e 341°; 342° todos do CC.
8. Com efeito e, com o devido respeito, o acórdão proferido pelo Tribunal da Relação do Porto, alterou a resposta aos pontos O); T); U); V) e X dando-os como provados nos termos aí melhor descritos, sem a prova legalmente exigida.
9. Dando consequentemente como não provado o que tinha sido dado com provado em 1ª instância, apesar da prova legalmente impor que fosse dado como provado nos termos dados em 1ª instância.
10. Também, o Tribunal a quo alterou os factos dados como provados em W pelo Tribunal de 1ª Instância, não obstante, não ter sido objecto de impugnação por parte da aí recorrente, aqui recorrida, conforme aliás salientado pelos aqui...
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