Acórdão nº 417/14.3TBVFR.P1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 26 de Janeiro de 2017

Magistrado ResponsávelABRANTES GERALDES
Data da Resolução26 de Janeiro de 2017
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

I - AA e marido BB intentaram a presente acção declarativa sob a forma comum contra CC e mulher DD e EE e mulher FF, pedindo a declaração da ineficácia (impugnação pauliana) em relação aos AA. da compra e venda de um imóvel outorgado por escritura pública, devendo ser ordenado a restituição do mesmo imóvel aos 1ºs RR. para que os AA. possam satisfazer o seu crédito à custa desse bem.

Alegaram que o A. e o 1º R. eram os únicos sócios de uma sociedade comercial por quotas, com uma quota para cada um de 50% no capital social, no valor de € 25.000,00. Por dificuldades económicas, mercê de uma conjuntura negativa na área da construção, a sociedade celebrou três contratos com a Caixa Geral GG. E como caução do integral pagamento de todas as responsabilidades foram aceites duas livranças em branco, as quais foram avalizadas pelos AA. e pelos 1ºs RR. a favor do Banco mutuante.

A referida sociedade celebrou ainda com o com o Banco HH, SA, um acordo escrito denominado “Conta Gestão de Tesouraria”, destinado a satisfazer as necessidades de tesouraria, tendo sido concedida uma abertura de crédito.

A sociedade não cumpriu as suas obrigações perante as duas instituições de crédito, tendo sido os AA. que negociaram as dívidas com o HH e com a Caixa Geral GG, liquidando, respectivamente os montantes de € 20.300,00 e de € 62.509,29 e subsequentemente obtiveram a condenação dos 1ºs RR. no pagamento da quantia de € 41.404,64, acrescida de juros de mora, à taxa de 4%, desde a citação até pagamento.

Os 1ºs RR. venderam aos 2ºs RR. um imóvel de que eram proprietários, com o objectivo comum de prejudicarem os AA., impedindo-os de cobrar o seu crédito.

Os 1ºs RR. contestaram e alegaram que o preço do imóvel serviu para que liquidassem a hipoteca que estava inscrita sobre o mesmo. Negaram ainda que houvesse o intuito de prejudicar os AA.

Os 2ºs RR. também contestaram e alegaram ainda que desconheciam a existência do crédito dos Autores.

Foi realizada a audiência de julgamento e proferida sentença que julgou a acção procedente, declarando a ineficácia em relação aos AA. do acto de compra e venda outorgado por escritura pública no dia 31-3-09, devendo ainda ser ordenado aos 2º RR. a restituição do mesmo imóvel de modo a que os AA. se possam pagar à custa desse bem.

Os RR.

apelaram da sentença e a Relação, depois de modificar a decisão da matéria de facto, julgou a acção improcedente.

Os AA. interpuseram recurso de revista na qual se insurgem contra a modificação da decisão da matéria de facto e alegam que se verificam os pressupostos da impugnação pauliana, com destaque para o nexo de causalidade entre o acto impugnado e a decadência da garantia patrimonial e para a má fé dos vendedores e dos compradores.

Não houve contra-alegações.

Cumpre decidir.

III – Questão prévia: 1.

Os recorrentes alegam que a Relação, ao apreciar a impugnação da decisão da matéria de facto, introduziu alterações relativamente ao que fora consignado na sentença da 1ª instância, pretendendo que este Supremo Tribunal revogue, nesta parte, do acórdão recorrido.

Trata-se de uma alegação sem qualquer consistência e que menos se compreende em face do acórdão recorrido que se revela exemplar não apenas quanto ao modo como foi decidida a pretendida anulação do julgamento, como ainda quanto ao modo como foi apreciada e motivada a impugnação da decisão da matéria de facto.

  1. Foi anteriormente proferido despacho de aperfeiçoamento do ora relator com o seguinte teor: “Existem limitações em sede de intervenção do Supremo Tribunal de Justiça no que concerne à decisão da matéria de facto, sendo fulcral a percepção e aplicação do que consta do art. 674º, nº 3, em conjugação com o que se dispõe no art. 662º, nº 4, do CPC.

    A ampliação dos poderes da Relação no que concerne à reapreciação da decisão da matéria de facto que foi consagrada na Reforma de 1995/96, reforçada na Reforma de 2007 e confirmada com a Reforma de 2013, foi o corolário de um longo processo – impulsionado essencialmente pela advocacia – no sentido de implantar no terreno um efectivo segundo grau de jurisdição em sede de matéria de facto.

    Na medida em que era exigido – e foi conseguido – o registo das audiências de julgamento, com a gravação dos depoimentos testemunhais, não parece legítimo que, agora, perante decisões que desembocam na alteração da matéria de facto provada e não provada, sejam subscritas alegações que procuram retirar à 2ª instância a capacidade – anteriormente reclamada - de modificar a decisão da matéria de facto quando esta envolva a reapreciação de meios de prova submetidos ao princípio da livre apreciação e, por isso, fora do âmbito de aplicação nº 3 do art. 674º do CPC.

    Ora, as concretas alegações também incorrem nesse vício e atribuem a este Supremo tribunal o poder de sindicar o modo como a Relação reapreciou os meios de prova em que se baseou para alterar a decisão da matéria de facto, como se à Relação não coubesse modificar tal decisão em face da convicção criada a partir da reapreciação de meios de prova sujeitos à livre apreciação.

    Parece evidente que a este Supremo Tribunal não cabe reapreciar os depoimentos testemunhais, nem interferir nas regras de experiência que foram tidas em consideração pelas instâncias, nem modificar a decisão da matéria de facto que esteja relacionada com meios de prova sujeitos à libre apreciação”.

  2. Apesar do precedente convite ao aperfeiçoamento das alegações, os recorrentes insistem – agora com menor energia – em que houve errada apreciação da matéria de facto pela Relação, tanto no segmento em que modificou os factos que foram considerados provados pela 1ª instância, como no segmento em que integrou na...

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