Acórdão nº 1181/13.9TBMCN-A.P1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 12 de Dezembro de 2017
Magistrado Responsável | ALEXANDRE REIS |
Data da Resolução | 12 de Dezembro de 2017 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam no pleno das Secções Cíveis do Supremo Tribunal de Justiça: AA e BB vieram opor-se à execução que CC e DD lhes movem, alegando, além do mais, a falta de título executivo, em virtude de ao mesmo subjazer um contrato de mútuo nulo por falta de forma.
Os exequentes pugnaram pela validade do título executivo.
Foi proferido saneador-sentença, julgando-se a oposição procedente e a execução extinta, com fundamento na nulidade do contrato de mútuo subjacente à emissão da declaração de dívida apresentada como título executivo.
Inconformados, os exequentes interpuseram apelação, em cujo âmbito a Relação do Porto julgou procedente o recurso, determinando o prosseguimento dos autos.
Os executados interpuseram recurso de revista desse acórdão, requerendo o respectivo julgamento ampliado (com intervenção do pleno das secções cíveis deste Tribunal), nos termos do art. 686º do CPC, por se revelar «conveniente assegurar a uniformidade da jurisprudência», para superar a divergência que se vem manifestando sobre a questão suscitada no recurso, cujo objecto delimitaram com as seguintes conclusões: «A - Toda a execução tem por base um título executivo.
B - A exequibilidade extrínseca da pretensão do exequente é conferida pela sua incorporação num título executivo, num documento que formaliza por via legal a faculdade de realização coactiva da prestação C - O título executivo é assim condição geral de qualquer execução, sua condição necessária e suficiente. Não havendo acção executiva sem título.
D - A confissão de dívida que suporta a execução configura um mútuo no valor de 6.000.000$00 (trinta mil euros) E - Os mútuos de valor de € 30.000,00 só são válidos se forem celebrados por escritura pública (artigo 1143º do C. Civil).
F - O mútuo é a verdadeira causa de pedir da obrigação executada.
G - Havendo invalidade formal do negócio jurídico subjacente ao título executivo tal afectará não só a constituição do próprio dever de prestar, como a eficácia do respectivo documento como título executivo.
H - Atingindo a nulidade formal, não só a exequibilidade da pretensão, como também a exequibilidade do título.
I - O negócio em apreço nestes autos só seria válido se celebrado por escritura pública.
J - Não tendo sido observada tal forma é o mesmo nulo.
L - Sem título não há acção executiva.
M - Violou o douto acórdão em crise o disposto no artigo 1143º do CC e 703º do CPC.».
Os exequentes contra-alegaram, sustentando a improcedência do recurso.
Os autos foram apresentados ao Exmo. Presidente deste Supremo Tribunal, que deferiu a pretensão dos recorrentes de que se procedesse ao julgamento ampliado da revista A Exma. Procuradora-Geral Adjunta emitiu parecer ao abrigo do art. 687º, nº 1, do CPC, culminando com a seguinte proposta de uniformização: «Constitui título executivo, face ao disposto no art. 46.º, n.º 1, al, c), do CPC/95, o documento particular que contém o reconhecimento de dívida resultante de negócio nulo por falta de forma».
Colhidos os vistos, cumpre decidir.
*A Relação considerou assente a seguinte factualidade: «1. Na execução a que os presentes autos estão apensos foi apresentada à execução o documento escrito particular de fls. 8 da execução, o qual se mostra datado de 18-7-95 e contém as assinaturas dos dois executados, tendo o seguinte teor, na parte relevante: “Nós abaixo assinados AA, casado com BB ….declaramos que nos confessamos devedores ao Sr. DD e mulher CC, da importância de 6.000.000$00, que este nos fez o favor de emprestar, a fim de ser utilizado na n/ vida particular, no dia 18-7-95, pelo prazo de um ano.
”».
*A questão suscitada nas enunciadas conclusões consiste em saber se, estando o negócio jurídico subjacente ao escrito particular oferecido à execução afectado de invalidade formal, esta acarreta a inexequibilidade daquele.
No caso em apreço, o título apresentado na execução constitui o reconhecimento da existência de uma obrigação contratual para os executados, decorrente de um contrato de mútuo que os mesmos ali confessavam haver celebrado com os exequentes, no dia 18-7-1995, tendo-se vencido a obrigação, no montante de 6.000.000$00, com a interpelação judicial, concretizada pela citação, nos termos do art. 805.º, n.º 1, do CC.
Contudo, nos termos do art. 1143.º do CC (na redacção conferida pelo DL 190/85 de 24/6), tal contrato de mútuo (de valor superior a 200.000$00) só teria sido válido se celebrado por escritura pública ([1]), o que não sucedeu, como resulta do acordo das partes no processo.
O art. 46.º do CPC (DL 329-A/95, de 12/12) – aplicável, quanto aos títulos executivos, às execuções que, como a dos autos, hajam sido iniciadas até à data da entrada em vigor do NCPC (1-09-2013), em conformidade com o disposto no art. 6.º, n.º 3, da Lei 41/2013, de 26/6 (que aprovou este código) – estabelecia as várias espécies de títulos executivos, entre os quais figuravam: […] «b) Os documentos elaborados ou autenticados, por notário […] que importem constituição ou reconhecimento de qualquer obrigação; c) Os documentos particulares, assinados pelo devedor, que importem constituição ou reconhecimento de obrigações pecuniárias, cujo montante seja determinado ou determinável […], ou de obrigação de entrega de coisa ou de prestação de facto».
Aquela al. b) era aplicável a «documentos elaborados ou autenticados, por notário […]» que importassem constituição ou reconhecimento de «qualquer obrigação», enquanto o campo de acção desta al. c) restringia-se aos documentos (particulares) que importassem constituição ou reconhecimento de obrigações pecuniárias ou de prestação de facto ou de entrega de coisas – «móveis», na redacção original do DL 329-A/95, expressão, depois, eliminada com o DL 38/2003 de 8/3.
O novo CPC, aprovado pela citada Lei n.º 41/2013 e que – como se disse – não é aqui aplicável, veio interromper a tendência evidenciada pela evolução da nossa lei que se caracterizava por uma progressiva simplificação e ampliação dos...
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