Acórdão nº 1061/09.2JDLSB-A.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 13 de Outubro de 2016

Magistrado ResponsávelHELENA MONIZ
Data da Resolução13 de Outubro de 2016
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam, em conferência, no Supremo Tribunal de Justiça: I Relatório 1.1.

AA foi condenado, entre outros, por acórdão de 10.05.2010, pela prática de: - 4 (quatro) crimes de abuso sexual de criança agravado, previsto e punido pelos arts. 171.º, n.ºs 1 e 2, e 177.º, n.º 1, al. b), todos do CP, com a pena de prisão de 7 (sete) anos por cada um deles, - 6 (seis) crimes de abuso sexual de criança agravado, previsto e punido pelos arts. 171.º, n.º 3, al. b) e 177.º, n.º 1, al. b), todos do CP, com a pena de prisão de 1 (um) anos por cada um deles, e - 3 (três) crimes de abuso sexual de criança agravado, previsto e punido pelos arts.171.º, n.ºs 1 e 2 e 177.º, n.º 1, al. b), todos do CP, com a pena de prisão de 8 (oito) anos por cada um deles; - em cúmulo jurídico foi condenado na pena única de prisão de 15 (quinze) anos.

1.2.

Inconformado, o arguido recorreu para o Tribunal da Relação de Lisboa que, por acórdão de 21.09.2010 (cujo trânsito em julgado, segundo a certidão junta a fls. 55, ocorreu a 18.10.2010), julgou parcialmente o recurso e absolveu “da incriminação autónoma por três dos seis crimes de abuso sexual agravados, p (s). e p(s). pelos arts. 171/3, b) e 177/1, b), C.P.

” (cf. fls. 36/verso, destes autos). Em consequência, modificou a pena única aplicada, condenando o arguido AA em uma pena de 14 (catorze) anos de prisão.

1.3.

Ainda inconformado, o arguido interpôs recurso para o Supremo Tribunal de Justiça que por decisão sumária, de 17.02.2014 (que transitou em julgado a 18.04.2011, segundo certidão a fls. 55), rejeitou a interposição do recurso por o considerar extemporâneo, dado a decisão segundo aquele acórdão já ter transitado em julgado, pois já tinha decorrido o prazo desde a notificação do acórdão recorrido ao mandatário, embora não tivesse havido notificação daquele ao arguido.

1.4.

Tendo em conta que o acórdão do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem, de 02.02.2016, refere no relatório (ponto I.18) ter havido um acórdão do STJ de 31.03.2011, embora nada estivesse junto aos autos deste processo de revisão, a Relatora do presente acórdão, consultando o Habilus, verificou que o arguido reclamou daquela decisão sumária para a conferência, ao abrigo do disposto no art. 417.º, n.º 8, do CPP; por acórdão de 31.03.2011 (transitado em julgado em 18.04.2011) foi mantida a decisão de rejeição do recurso.

1.5.

Desta última decisão o arguido recorreu para o Tribunal Europeu dos Direitos do Homem que considerou, por acórdão de 02.02.2016 tornado definitivo a 02.05.2016 (cf. fls. 6 destes autos), ter havido “violação do artigo 6.º, n.º 1, da Convenção”, e tendo condenado o Estado Português ao pagamento ao requerente, “no prazo de três a contar do dia em que o acórdão se tornar definitivo, nos termos do artigo 44.º, n.º 2, da Convenção: a) 3.250 EUR (três mil duzentos e cinquenta euros), acrescidos de qualquer montante que possa ser devido a título de imposto, por dano moral; b) que a contar da expiração do referido prazo e até ao pagamento, estes montantes serão acrescidos de juro simples a uma taxa igual à da facilidade de empréstimo marginal do Banco Central Europeu aplicável durante este período, aumentada de 3 pontos percentuais” (cf. fls. 15 e 38, destes autos).

  1. Perante o processado anterior, vem agora o arguido AA interpor o presente recurso extraordinário de revisão, ao abrigo do disposto no art. 449.º, n.º 1, al. g), do CPP, com os seguintes fundamentos: «1- em 21-9-2010 o recorrente foi condenado a 14 anos de prisão pelo Tribunal da Relação de Lisboa- acórdão proferido nos autos principais cuja Certidão se requer a final seja junta com o presente recurso; 2- o recorrente não foi notificado pessoalmente nem por carta registada do Acórdão; 3-nem foi visitado pelo seu Mandatário, que não lhe deu conhecimento da condenação; 4- em 2-11-2010 o recorrente foi pessoalmente notificado da Liquidação da Pena conforme consta dos autos principais; 5- em 29-11-2010 o recorrente recorreu para o Supremo Tribunal de Justiça; 6- o Supremo Tribunal de Justiça rejeitou o recurso por considerar que o Acórdão da Relação Lisboa transitou em 18-10-2010; 7- o recorrente deveria ter sido notificado pessoalmente do Acórdão da Relação Lisboa, o que nunca ocorreu até hoje !....

    8- o direito ao recurso e a ser informado de todos os actos processuais são GARANTIAS do Estado de Direito - dixit art 32º- 1 da Constituição da Republica Portuguesa; 9- no artº 113 – 9 do CPP impõe-se a notificação da Sentença ao arguido; neste caso o prazo para a prática do acto processual subsequente conta-se a partir da notificação efectuada em último lugar; 10- o que equivale a dizer que o arguido é o destinatário da Justiça pelo que só este e apenas este decide se quer ou não recorrer! 11- o arguido padeceu de indefesa pois desconhecia em 9-11-2010 que o mandatário nos autos foi notificado antes e não recorreu….

    12- o prazo para recorrer contava-se a partir de 9-11-2010 pelo que, face aos 20 dias após a notificação da Decisão –artº 411-1-a) CPP - estava e está em tempo para apelar a este Alto Tribunal para reduzir a pena ( 9/11 + 20 dias= 29/11) 13-o direito ao recurso e a ser informado de todos os actos processuais - maxime a junção aos autos da transcrição - são GARANTIAS do Estado de Direito - art. 32-1 da CRP.

    14- o Principio Constitucional da defesa, do direito ao recurso e a um processo equitativo - arts. 5º e 6º da Convenção Europeia D. Homem parecem ter sido ostracizados in totum ao julgar-se como transitada a Decisão e imediatamente liquidada a pena.

    15- os arts. 113-9 e 411-1-

    1. CPP violam os arts. 16, 18, 21 e 32-1 da Lei Fundamental se entendidos que o prazo para recorrer se conta a partir da notificação do defensor e não do arguido, sendo este “dispensado” de ser notificado da Sentença que o afecta pessoalmente: POR ESTAS OMISSÕES DEVE SER DECLARADA A NULIDADE DO PROCESSADO E DECLARADO VIOLADO O DIREITO AO RECURSO FACE À SENTENÇA DO TRIBUNAL EUROPEU- doc 1 16- Portugal tem como ( mau) hábito na Jurisprudência não notificar o arguido da decisão que o afecta pessoalmente o que viola o art. 6º da Convenção Europeia; o arguido deve ser informado da decisão que o afecta e ver a culpa apreciada por um Tribunal Superior; face ao exposto, 17- em 28-6-2011 o arguido apelou ao Tribunal Europeu dos Direitos do Homem - artigos 34º e 6º -1 da Convenção Europeia dos Direitos do Homem- doc 1 18- em 2-2-2016 a Cour Européenne condenou Portugal pela manifesta violação do artº 6º- 1 da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, o que aliás é de conhecimento oficioso, face á Notificação do Estado Português e do advogado signatário conforme comunicação do Tribunal Europeu de 9-5-2016 - doc 1 19- na Sentença do Tribunal Europeu considerou-se que: § 38- o Tribunal Europeu lembra que a regulamentação referente às formalidades e aos prazos a respeitar para apresentar um recurso visam assegurar a boa administração da Justiça e particular respeito do Principio da Segurança Juridica. Os interessados devem atender a que as regras sejam aplicadas ( Miragall Escolano e outros contra Espanha, nºs 38366/97, 38688/97, 40777/98, 40843/98…..CEDH 2000 I) § 49- a interpretação particularmente restritiva efectuada pelo Supremo Tribunal Justiça duma regra processual e o não respeito da Jurisprudência do Tribunal Constitucional sobre o caso privaram o requerente do seu direito de acesso a um Tribunal……um Estado que se dota de Jurisdições tem a obrigação de vigiar a que os cidadãos tenham as garantias fundamentais do artigo 6º da Convenção.

    § 50- portanto, ocorreu violação do artigo 6º- 1 da Convenção 20- o recorrente ficou em choque com a rejeição do apelo ao Supremo Tribunal Justiça e espera há 6 ( seis) anos que Portugal cumpra com os direitos efectivos e não meramente ilusórios no instituto do direito a um Tribunal Superior; assim, 21- em cumprimento da Sentença do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem e dos arts 8º, 16º da Constituição da Republica e 449- 1- g) do CPP deve: a)- declarar-se que ocorreu violação do direito ao recurso; b)- declarar-se que os autos são nulos desde 21-9-2010; por via disso, c)-declarar-se que o Acórdão de 21-9-2010 não transitou em julgado; d)-declarar-se que o recurso interposto em 29-11-2010 o foi de modo tempestivo; e)- declarar-se que o arguido tem direito a ver apreciado pelo Supremo Tribunal de Justiça o recurso interposto em 29-11-2010; f)-declarar-se que, por via da declaração de nulidade do processado desde 21-9-2010 e face ao recurso interposto em 29-11-2010 a julgar pelo Supremo Tribunal de Justiça, o arguido está em prisão preventiva e, consequentemente, libertado de imediato por excesso de prazo e violação do direito fundamental ao recurso; REQUER A INSTRUÇÂO DA PRESENTE REVISÂO COM CERTIDÃO DO ACÓRDÃO CONDENATÓRIO DE 21-9-2010 POIS O ARGUIDO NÂO TEM POSSES NEM RENDIMENTOS CAPAZES DE SUPORTAR TAXAS, CUSTAS E ENCARGOS; REQUER A V. EXA. SE DIGNE ORDENAR A TRADUÇÃO DA SENTENÇA DO TRIBUNAL EUROPEU QUE SE JUNTA, SE SE MOSTRAR ABSOLUTAMENTE NECESSÁRIO À INSTRUÇÃO DOS AUTOS.

    A PROCURADORIA GERAL DA REPUBLICA FOI NOTIFICADA DA SENTENÇA CUJA CÓPIA SE JUNTA E CONFORME NOTIFICAÇÃO DO TRIBUNAL EUROPEU DE 9 MAIO 2016 QUE SE ANEXA SOB DOC 1.

    Requer ao abrigo do art. 462º do CPP seja fixada indemnização não inferior a 5.000,00€ a pagar ao arguido recorrente face ás circunstancias supra expostas.» Foram juntas cópias de todas decisões em questão.

  2. A Senhora Procuradora da República (Comarca de Lisboa — Inst. Central — 1.ª Secção Criminal) pronunciou‑se pela improcedência deste pedido de revisão considerando que: «O "recorrente" nem sequer invoca nenhuma condição, limitando-se a pedir que se cumpra a sentença do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem que alegadamente terá condenado o Estado Português a pagar-lhe uma indeminização. (...) Conforme a Jurisprudência tem vindo a considerar e decorre da Lei, o Recurso Extraordinário de Revisão de Sentença não pode constituir uma forma encapotada de pôr em causa a estabilidade das...

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