Acórdão nº 802/13.8TTVNF.P1.G1-A.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 28 de Janeiro de 2016

Magistrado ResponsávelANA LUÍSA GERALDES
Data da Resolução28 de Janeiro de 2016
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Proc. Nº 802/13.8TTVNF.P1.G1-A.S1 Reclamação – 4ª Secção ALG/RC/PH ACORDAM, EM CONFERÊNCIA, na SECÇÃO SOCIAL do SUPREMO TRIBUNAL de JUSTIÇA I – 1.

AA instaurou requerimento visando a impugnação da decisão de despedimento proferida pela sua empregadora BB S.A., pedindo, em síntese, que seja declarada a prescrição do exercício do poder disciplinar pelo decurso de 1 ano, desde a data da prática de cada infracção, bem como a sua caducidade e, no demais, que seja, nomeadamente, reconhecida a existência de diferenciação de tratamento pela empregadora entre este trabalhador e outro por factos idênticos.

Deduziu, ainda, pedido reconvencional peticionando a sua reintegração e a condenação da Ré no pagamento de todas as retribuições que deixou de auferir, desde a data de despedimento até ao trânsito em julgado da decisão, e em indemnização por danos não patrimoniais resultante da cessação do contrato de trabalho, no valor que indica.

  1. A empregadora Ré “BB”, por sua vez, alegou que o trabalhador não tem razão, porquanto se aproveitou do sistema de leituras de consumo por via do exercício da sua profissão e alterou as leituras reais existentes no sistema e relativas ao contrato de que era titular, de modo a proceder a um pagamento inferior ao que consumia em energia eléctrica, lesando patrimonialmente a empregadora, sem quaisquer escrúpulos. Por ser seu trabalhador, os factos praticados pelo Autor são até susceptíveis de consubstanciar crime de burla informática, furto ou falsidade informática, pelo que, o prazo prescricional invocado pelo Autor sempre será mais alargado.

    Rebate, também, os restantes factos alegados pelo A.

  2. Realizada a audiência de julgamento foi proferida sentença que, em síntese, declarou ilícito o despedimento efectuado pela Ré “BB”, por verificação de caducidade do procedimento disciplinar, condenando-a a reintegrar o trabalhador e a pagar a este as retribuições e demais quantias nos termos que constam da sentença.

  3. Inconformada, a Ré “BB” interpôs recurso de apelação para o Tribunal da Relação de Guimarães, que proferiu Acórdão, no qual julgou o recurso improcedente, confirmando a sentença recorrida.

  4. Irresignada, a Ré interpôs recurso de revista, para a Secção Social deste STJ. Recurso que não foi admitido pelo Tribunal da Relação, por ter considerado existir dupla conforme entre a decisão proferida pela 1ª instância e o Acórdão exarado nos autos.

  5. A Ré “BB” deduziu reclamação nos termos e para os efeitos do disposto nos artigos 641º nº 6 e 643º, ambos do CPC.

    Alegou para tanto, a título conclusivo e em síntese, que: 1.

    Ao contrário do decidido pelo Tribunal da Relação de Guimarães, o presente recurso é admissível, nos termos e para os efeitos do art. 671º, nºs 1 e 3, do CPC, porquanto não se pode falar de uma verdadeira confirmação da decisão proferida pelo Tribunal de 1ª instância, inexistindo dupla conforme.

    [1] 2.

    Com efeito, a BB, em sede de recurso para a Relação, pugnou pela inclusão, no ponto 6º da fundamentação de facto da sentença, de um conjunto de diligências de investigação que não haviam sido consideradas pelo Tribunal da 1ª instância.

  6. Para tanto, a BB indicou prova documental e testemunhal constante dos autos e do processo disciplinar que demonstravam a efectivação das referidas diligências. 4.

    A Relação recusou-se, contudo, a apreciar a prova indicada, considerando, por um lado, que a BB tinha apenas sustentado a sua impugnação em prova testemunhal e, por outro lado, que este meio de prova não era apto à demonstração da realização das referidas diligências no âmbito do procedimento disciplinar.

  7. A Relação entendeu que, por força do disposto no art. 392º do CC e na cláus. 4ª, n.º 5 do Anexo VI do IRCT aplicável,[2] a prova das referidas diligências era vinculada, tendo de ser feita documentalmente (através de redução a escrito e rubrica de todos os actos processuais). 6.

    Ora, para além de ter incorrido em nulidade por omissão de pronúncia, a Relação incorreu também em violação de lei substantiva e em ofensa a disposição expressa de lei que fixe a força de determinado meio de prova, nos termos e para os efeitos do art. 674º, n.º 1, al. a), e n.º 3, do CPC, conforme se detalhou em sede de fundamentação de recurso.

  8. A Relação de Guimarães ao adoptar uma atitude meramente formalista, de absoluta recusa de análise de meios de prova submetidos à sua apreciação, com violação da lei substantiva e em ofensa a disposição expressa de lei que fixa a força de determinado meio de prova, tomou uma decisão com base em fundamentação jurídica nova/diferente que não pode deixar de ser submetida à apreciação de Tribunal Superior (neste caso o Supremo Tribunal de Justiça), sob pena de não se encontrar assegurado o duplo grau de jurisdição. 8.

    Nesta sede, não pode deixar de ser novamente relevada a circunstância de, apesar de uma parte importante do recurso da BB para a Relação ter incidido sobre a fundamentação de facto da Sentença da 1ª instância, mais concretamente sobre erros na apreciação da prova produzida, 9.

    E do cuidado com que a BB fundamentou o seu recurso, indicando, conforme lhe competia, (i) os concretos pontos de facto que considerava incorrectamente julgados, (ii) os concretos meios de probatórios (prova documental e testemunhal), constantes do processo e da gravação realizada, que impunham decisão diversa, (iii) bem como a decisão que, no seu entender, devia ser proferida sobre as questões de facto impugnadas, 10.

    O Tribunal da Relação ter-se eximido, sempre e em todos os casos, de analisar e reapreciar a prova indicada, com recurso a argumentos que, na verdade, consubstanciam verdadeiros obstáculos, injustificados, ao direito geral dos cidadãos de recorrerem das decisões judiciais que os afectem, unanimemente considerado como uma imanência do direito fundamental de acesso ao direito e de tutela jurisdicional efectiva, que, na nossa Constituição, tem consagração expressa no seu artigo 20º.

  9. Termos em que é forçoso concluir-se pela admissibilidade do recurso de revista interposto do Ac. da Relação de Guimarães, devendo, por isso, ser recebida e apreciada a presente reclamação nos termos e para os efeitos do disposto no art. 82.º do CPT e do art. 643º do CPC.

  10. O Autor apresentou resposta à Reclamação, a fls. 324 e segts, defendendo a improcedência da mesma.

  11. A reclamação deduzida pela Ré foi deferida por decisão da ora Relatora, nos termos que os autos documentam, e onde ressalta a seguinte síntese conclusiva: “A R., no recurso, suscitou uma série de questões que puseram em causa o modo como a Relação apreciou a impugnação da decisão da matéria de facto – cf. fls. 51 e segts.

    [3] Além disso, constata-se que, do teor dessas alegações de recurso, os factos que a R. pretendia ver consignados na matéria de facto provada têm uma directa conexão com o início do prazo de caducidade que foi o motivo essencial pelo qual as instâncias acolheram a pretensão deduzida pelo A.

    A R. imputa à Relação vícios decisórios, na medida em que não terá consignado determinados factos que, no seu entender, seriam decisivos para se obter uma resposta diversa quanto à caducidade do procedimento disciplinar.

    Na sua perspectiva, se tais factos tivessem sido considerados provados, haveria uma conclusão diversa quanto à apreciação dessa caducidade.

    Nesta estrita medida, uma vez que as questões foram suscitadas pela primeira vez perante a Relação, no âmbito do recurso de apelação, invocando a...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT