Acórdão nº 4664/06.3TTLSB.1.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 15 de Setembro de 2016
Magistrado Responsável | PINTO HESPANHOL |
Data da Resolução | 15 de Setembro de 2016 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça: I 1.
Em 30 de julho de 2009, no Tribunal do Trabalho de Lisboa, 5.º Juízo, 1.ª Secção, a SEGUROS AA, S. A., a qual, entretanto, adotou a denominação SEGUROS AA, S. A., requereu, por apenso a processo especial emergente de acidente de trabalho, instaurado no dia 20 de dezembro de 2006, e «após observação pelos seus Serviços Clínicos», a realização de exame médico de revisão da incapacidade do sinistrado BB, ao abrigo do disposto nos artigos 25.º da Lei n.º 100/97, de 13 de setembro, e 145.º do Código de Processo do Trabalho, juntando «documentação clínica atualizada (boletim de alta)».
Subsequentemente, o tribunal de 1.ª instância proferiu o seguinte despacho: «De acordo com o disposto no artigo 25.º da Lei n.º 100/97, quando se verifique modificação da capacidade de ganho do sinistrado proveniente de agravamento, recidiva, recaída ou melhoria da lesão ou doença que deu origem à reparação, ou de intervenção clínica ou aplicação de prótese ou ortótese, ou ainda de formação ou reconversão profissional, as prestações poderão ser revistas e aumentadas, reduzidas ou extintas, de harmonia com a alteração verificada.
Nos autos principais, a seguradora e o sinistrado acordaram em que este padecia de uma IPA de 100% desde 13/06/2008 (por conversão de ITA), tendo acordado ainda o montante da pensão anual e vitalícia, bem como o acréscimo por familiar a cargo e subsídio por situação de elevada incapacidade. Tal acordo foi feito em 30 de março de 2009, apenas passando à fase contenciosa a questão da necessidade de auxílio de terceira pessoa ao sinistrado — questão já decidida por sentença ainda não transitada em julgado.
Não obstante, a R. veio requerer a revisão da incapacidade, ao abrigo do disposto no art. 145.º do Código de Processo do Trabalho, em 30 de julho de 2009, sem que no seu requerimento fizesse menção a qualquer “melhoria da lesão ou doença que deu origem à reparação, ou de intervenção clínica ou aplicação de prótese ou ortótese”. Aliás, em sede de alegações de recurso da decisão proferida nos autos principais pugna pela manutenção da decisão no que concerne à prestação suplementar por assistência [de] terceira pessoa, apenas discordando do seu montante e desde quando é o mesmo devido.
Não estando agora em momento em que seja exigível um convite ao aperfeiçoamento, nem por isso é despiciendo considerar a utilidade das sucessivas juntas médicas, quando, ao que parece, a R. nem questiona o montante da pensão fixada, atribuída em função da IPA de 100%. Aliás, a própria decisão dos autos principais parte desse pressuposto — o que a R. nem sequer impugna. Por outro lado, tendo a incapacidade sido fixada por acordo, carece também de sentido útil o apenso de fixação de incapacidade — pois esta já se encontra fixada por acordo.
Assim, com cópia do presente despacho, notifique as partes para, querendo, requererem o que tiverem por conveniente.» A seguradora defendeu o prosseguimento do requerido, «com a realização de todos os atos necessários à revisão da incapacidade fixada ao sinistrado por via de mera conversão de uma ITA em IPA pelo decurso do tempo», invocando, em síntese: «1. A incapacidade fixada nos autos principais resultou da conversão da ITA de que o sinistrado estava afetado e pelo simples decurso dos prazos nos termos do disposto no art. 42.º do Decreto-Lei n.º 143/99, de 30 de abril.
2. Não resultou, pois, de qualquer exame ou junta médica que tivesse fixado ao sinistrado uma IPA. Assim, 3. Não poderia a ora requerente deixar de se conciliar também quanto à atribuição de uma IPA ao sinistrado, já que esta resulta da própria lei e do simples decurso do tempo, que não da fixação de uma incapacidade por exame médico com o qual aquela poderia não concordar, não se conciliando e requerendo a competente realização de uma Junta Médica. De resto, [por lapso, na sequência da exposição repete-se o número 3.
] 3. Exames e juntas médicas há nos autos de que resultam a fixação de incapacidades permanentes não absolutas, mas parciais, o que tanto bastaria para que o presente Incidente de Revisão tivesse pleno cabimento. Acresce que, 4. É próprio da legislação sobre acidentes de trabalho, de que o art. 25.º da Lei n.º 100/97 em causa nos presentes autos é o reflexo, que, havendo acordo ou não sobre uma IPP ou IPA fixada num determinado momento, a todo o tempo, e respeitando os intervalos previstos nessa norma, qualquer das partes pode suscitar Incidentes de Revisão. Donde, 5. Não pode extrair-se de uma aceitação de uma incapacidade num determinado momento, para mais por uma conversão automática por efeitos da lei e do tempo, como nos presentes autos, que qualquer das partes fique impossibilitada de requerer a revisão dessa incapacidade.
[…] 8. Salvo o devido respeito, não faz muito sentido ter de se alegar uma “melhoria da lesão ou doença que deu origem à reparação, ou de intervenção clínica ou aplicação de prótese ou ortótese”, quando a incapacidade fixada anteriormente não resultou de um exame ou junta médica, mas de uma conversão “administrativa”, pelo simples decurso do tempo. Isto é, a situação clínica pode até ser a mesma — o que se desconhece, porque a IPA não foi fixada como resultado de qualquer exame médico. O que a ora requerente estava era impossibilitada de pôr em crise essa IPA dada a forma imperativa como a mesma foi fixada. Assim, restava à ora requerente fazer o que fez: deixar decorrer o prazo previsto no art. 25.º da Lei n.º 100/97 para suscitar a reavaliação dessa incapacidade, a fim de, pela primeira vez, esta incapacidade ser fixada com rigor por exame ou junta médica.
9. Entender-se que carece de “utilidade” a realização das sucessivas juntas médicas — e de resto realizadas na normal tramitação dos autos e de acordo com as necessidades que os médicos entendem por convenientes face à necessidade de consulta de clínicos especialistas — seria coartar a possibilidade da ora requerente exercer o seu direito de rever a incapacidade do sinistrado, nos termos que a lei lhe permite, o que parece, isso sim, não admissível.» Após ponderação da resposta aduzida pela seguradora e do teor dos exames médicos inseridos nos autos, o tribunal proferiu despacho em que decidiu solicitar ao Instituto Nacional de Medicina Legal a realização de exame médico de revisão, no qual se concluiu que o sinistrado se encontrava afetado de uma incapacidade parcial permanente de 49,13%, com incapacidade permanente absoluta para o trabalho habitual desde 22/05/2009 e que continuava dependente de ajuda de terceira pessoa.
Notificadas as partes do exame médico de revisão, foi requerida a realização de junta médica, que confirmou integralmente a perícia médica efetuada.
Em conformidade, foi atribuída ao sinistrado uma incapacidade permanente parcial de 49,13%, com incapacidade permanente absoluta para o trabalho habitual, e condenou-se a seguradora a pagar-lhe, (a) «com início em 29/07/2009», uma pensão anual e vitalícia de € 37.648,50, acrescida de juros de mora, à taxa legal, desde aquela data até efetivo pagamento, e (b) «uma prestação suplementar para assistência de terceira pessoa equivalente a 43,75% da retribuição mínima mensal garantida para os trabalhadores do serviço doméstico com início a partir da data da alta».
2.
Inconformado, o sinistrado interpôs recurso de apelação daquela decisão, no qual explicitou as conclusões que se passam a transcrever: «
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A fls. 91 e 92 dos autos principais, consta o auto de exame médico de 11/07/2008, que descreve as consequências do acidente para a saúde do sinistrado: i) tetraplegia incompleta; ii) disfunção eréctil; iii) lesão do plexo braquial à esquerda.
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Não há notícia nos autos de qualquer alteração dessa situação clínica; pelo contrário, todos os exames subsequentes a confirmam.
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O pedido de revisão nem sequer invoca uma concreta causa de pedir.
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Pelo exposto, o pedido de revisão devia ter sido rejeitado, porque o pedido formulado na ação não respeita as exigências do art. 25.º da Lei n.º 100/97, nem do art. 145.º do CPT.
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A decisão recorrida acolhe os fundamentos constantes dos exames da Junta Médica e fls. 189 a 192 e 202 a 204, que corroboraram o parecer do perito médico de fls. 150 a 153.
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Acontece, porém, que os autos de exame realizados pela Junta Médica referem que, na diligência, se encontrava presente o juiz do processo que, a final, “deu o exame por findo”.
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Ora, os autos não se encontram assinados pelo respetivo magistrado, que supostamente teria estado presente nessas diligências.
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A falta de tal assinatura, quando o magistrado respetivo é dado como presente, invalida tais autos, nos termos do art. 160.º do CPC.
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Tal invalidade é invocável a todo o tempo, como decorre do regime previsto no art. 160.º do CPC, o que gera a impossibilidade de ter em conta os autos de exame médico de fls. 189 e 202, nos quais se fundou a decisão recorrida, a qual, assim sendo...
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