Acórdão nº 878/15.3T8VRL.G2.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 01 de Março de 2018
Magistrado Responsável | ANTÓNIO PIÇARRA |
Data da Resolução | 01 de Março de 2018 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: Relatório I – AA, ..., instaurou acção declarativa, sob a forma de processo comum, contra BB e mulher, CC, alegando, em síntese, que: Em 27 de Janeiro de 2015, outorgou procuração a favor do Réu, seu sobrinho e pessoa de total confiança, para proceder à venda, pelo preço de €50.000,00, do prédio urbano descrito na Conservatória do Registo Predial de … sob o nº 2…3.
O Réu ficou de receber o preço e, depois de liquidar os ónus e encargos que impendiam sobre o dito imóvel, no montante global de €21.188,73, entregar-lhe o remanescente, ou não encontrando comprador, poderia ficar com o prédio, liquidando os ónus e encargos que sobre o mesmo recaíam.
No início de Março de 2015, recebeu uma melhor proposta para a compra do referido prédio e comunicou ao Réu que ficaria sem efeito a venda do prédio por seu intermédio.
Veio a saber, porém, que o Réu, utilizando a referida procuração, tinha já, em 13 de Março de 2015, outorgado escritura de compra e venda do referido prédio urbano, figurando ele mesmo como comprador pelo preço de €28.016,50, registando-o a seu favor.
Com tais fundamentos, concluiu por pedir que: a) se declare a nulidade da procuração outorgada em 27/01/2015 no consulado geral de Portugal no Canadá, a favor do Réu; b) se declare nula a escritura de compra e venda outorgada no cartório notarial de … em 13 de Março de 2015, sobre o imóvel, sito na rua …, no Concelho de Valpaços e melhor identificado no artigo 1º e celebrada com a referida procuração; c) serem os Réus condenados a reconhecerem isso mesmo e a restituir o imóvel supra referido ao Autor; d) se ordene o cancelamento do registo de aquisição a favor dos Réus, sob a AP. 1202 de 2015/03/13, da Conservatória do registo predial de …; e) a condenação dos Réus a pagar ao Autor uma indemnização no valor de euros 10.000,00.
Os Réus contestaram contrapondo diferente versão, alegando, em resumo, que na base da outorga da procuração esteve a impossibilidade do Autor em suportar os encargos relacionados com o imóvel e pagar a dívida já em execução judicial, tendo sido acordado que seriam eles a fazê-lo como contrapartida da aquisição do prédio, desse modo concluindo pelo infundado do petitório e litigância de má fé do Autor.
Além disso, deduziram reconvenção, pretendendo que este seja condenado a pagar a quantia de €2.631.13, proveniente de despesas relacionadas com a aquisição e manutenção do aludido imóvel, se acaso houver lugar à restituição deste.
O Autor apresentou réplica, pugnando pela improcedência da reconvenção e da litigância de má fé.
Em sede da audiência prévia, foi admitido o pedido reconvencional no tocante apenas ao montante de €900,00 e igualmente julgou-se improcedente o pedido indemnizatório formulado pelo Autor na alínea e) do petitório, absolvendo do mesmo os Réus.
Na sequência da normal tramitação processual, foi realizada a audiência final e lavrada sentença que, na procedência da acção e de parte da reconvenção, decidiu: a) declarar que o Autor revogou a procuração outorgada em 27/01/2015 no Consulado geral de Portugal no ..., a favor do Réu; b) declarar a nulidade da escritura de compra e venda outorgada no Cartório Notarial de … em 13 de Março de 2015, celebrada com a procuração indicada em A), com referência ao prédio urbano sito na Rua …, freguesia de …, descrito na Conservatória do Registo Predial de … sob o n.º 2…3/2003…9 e inscrito na matriz sob o artigo 587; c) condenar os Réus a reconhecerem o referenciado em b) e a restituírem o imóvel supra referido ao Autor; d) ordenar o cancelamento do registo de aquisição a favor do Réu e mulher atinente ao prédio enunciado em B), sob a ap. 1202 de 2015/03/13, da Conservatória do Registo predial de …; e) absolver o Autor do pedido de condenação como litigante de má-fé.
f) condenar o Autor a pagar ao Réu a quantia de euros 900,00.
Discordando dessa decisão, apelaram os Réus, com total êxito, tendo a Relação de …, revogado a sentença e decidido absolvê-los de todos os pedidos.
Agora inconformado, interpôs o Autor recurso de revista, finalizando a sua alegação, com as conclusões que se transcrevem[1]: 1 - Resulta evidente, por provado, que a procuração outorgada pelo Autor a favor do Réu, em 27/01/2015 no consulado geral de Portugal em ..., no ..., tratou-se de uma procuração que conferiu poderes de representação ao Réu – BB, para vender o prédio melhor descrito nos autos, sito em …, portanto, outorgada no interesse exclusivo do dominus/Autor, logo livremente revogável, pelo que enquadrável no Artº 258º , 262º e 265º nº 2 do Código Civil.
2 - O Réu – BB, munido da supra referida procuração, outorgou por si e na qualidade de representante do Autor, a escritura de compra e venda, de 13 de março de 2015, no cartório Notarial de …, adquirindo para si, o referido prédio do Autor, configurando um negócio consigo mesmo, conforme o disposto no Artº 261º do C. Civil.
3 - O sobredito negócio, celebrado pelo Réu, configura uma compra e venda, consigo mesmo, previsto no Artº 874º C. Civil, que desde logo, violou o disposto no Artº 879º al c), por não se ter verificado o pagamento do preço, porquanto não liquidou os ónus sobre o prédio (hipoteca ao Banco DD e penhora a favor de EE), nem entregou qualquer quantia por conta do mesmo ao Autor.
4 - Aferindo-se, no caso, que naufragou a comprovação da factualidade atinente à relação jurídica subjacente, à emissão da procuração, falecendo a matéria passível de configurar um interesse do procurador/Réu BB, a compra e venda, por si realizada, consigo mesmo, é anulável nos termos do disposto no Artº 261º nº 1 do Código Civil.
5 - Excedendo o Réu os poderes que lhe foram conferidos pela procuração, porque contrários aos fins da representação, agiu em abuso de representação, o que tem como consequência que a...
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