Acórdão nº 6458/04.1TVLSB.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 13 de Novembro de 2009

Magistrado ResponsávelFONSECA RAMOS
Data da Resolução13 de Novembro de 2009
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

S Privacidade: 1 Meio Processual: REVISTA Decisão: CONCEDIDA A REVISTA Sumário : I. A proibição da quota-litis é estabelecida no interesse da lisura, probidade, e independência profissional do Advogado, visando evitar que tente ganhar a todo o custo e que use meios eticamente censuráveis, incompatíveis com o seu estatuto de servidor da justiça.

  1. Tendo sido contratado entre o Autor, advogado de profissão, e uma empresa de construção civil promotora de um projecto imobiliário, além de uma remuneração mensal fixa – avença – enquanto durasse a construção – e ainda que, com a publicação do plano de urbanização no “Diário da República”, o Autor receberia da Ré um pagamento final de acordo com os objectivos conseguidos com o seu trabalho (success fee), cujo montante seria posteriormente “estabelecido por acordo entre ambos”, não foram os honorários, pelo trabalho prestado, fixados com fundamento na denominada quota-litis.

  2. O facto da quantificação desse complemento depender de resultado que as partes teriam de considerar dentro dos objectivos pretendidos, e o montante ser fixado a posteriori - não referido a qualquer percentagem - e ter que ser objecto de consenso, não deve ser considerado quota litis por, em bom rigor, não constituir uma parte variável, aleatória, pré-acordada da remuneração pelo exercício do mandato.

  3. Pese embora se prever uma cláusula que poderia exprimir acordo sobre um complemento de remuneração, o facto de dever ser objecto de consenso e não estar sequer dependente de percentagem em relação aos resultados conseguidos, não pode considerar-se quota palmarium, sendo válida.

  4. Assim, a apodada estipulação success fee ou prémio de resultado, no recorte da estipulação concreta, não é inválida.

  5. Para uma justa fixação dos honorários advocatícios, não basta aludir ao conjunto de tarefas que o mandato envolveu, importando, pelo menos, fazer a prova do tempo despendido, das despesas feitas, da complexidade do processo e/ou actividades executadas, do estilo da comarca, do nível dos honorários praticados e da condição económica do mandante para se concluir da sua importância, dificuldade, bem como do esforço dispendido pelo advogado.

Decisão Texto Integral: Acordam no Supremo Tribunal de Justiça AA, advogado, intentou, em 8.11.2004, pelas Varas Cíveis da Comarca de Lisboa – 13ª Vara – acção declarativa de condenação com processo ordinário, contra: I...-Desenvolvimento e Promoção Imobiliária, S.A.

Pedindo que a Ré seja condenada a pagar-lhe, € 200.000,00 de honorários pelos serviços que lhe prestou, na qualidade de advogado, quantia a que acrescem juros de mora à taxa legal, até ao efectivo pagamento, ascendendo os já vencidos a € 2.235,61.

Na sua contestação, a Ré invocou a nulidade do contrato, porque o art. 66° al. c) do Estatuto da Ordem dos Advogados (DL.nº84/84, de 16.03) proíbe o advogado de convencionar que o direito a honorários fique dependente dos resultados da demanda ou negócio.

No mais impugnou os factos, dizendo que entregou ao Autor a contrapartida a que se obrigou, nos termos do contrato para com ele, no montante de € 172.085,31 e que correspondeu à avença mensal paga durante mais de seis anos, afirmando que nada mais lhe deve.

E conclui pela improcedência da acção e pela sua absolvição do pedido.

*** A acção prosseguiu e, a final, foi proferida sentença que a julgou improcedente e absolveu a Ré do pedido por verificada a excepção peremptória de nulidade do contrato, e, consequentemente, absolveu a Ré do pedido e condenou o autor em custas.

*** Inconformado, o Autor recorreu para o Tribunal da Relação de Lisboa, que, por Acórdão de 3.2.2009 – fls. 282 a 288 – julgou o recurso procedente, revogando a sentença apelada, e condenando a Ré no pagamento dos honorários pedidos e juros.

*** Inconformada, a Ré recorreu para este Supremo Tribunal e, alegando, formulou as seguintes conclusões: 1 - Ao contrário do que se decidiu no Acórdão recorrido, a estipulação de “prémio de resultados” ou success fee constante do acordo celebrado entre o Autor e a Ré é, efectivamente, uma estipulação que viola a alínea c) do art. 66° do Estatuto da Ordem dos Advogados, na versão do D.L. n°84/84, de 16 de Março.

É que, 2 — Esta estipulação equivale a fazer depender o direito a honorários dos resultados da demanda ou do negócio, o que é proibido por aquele art. 66°, alínea c), do Estatuto da Ordem dos Advogados.

3 — Sendo que esta proibição se aplica tanto aos casos em que a fixação da totalidade dos honorários fica integralmente dependente do resultado da demanda, como aos casos (como o dos autos) em que só a fixação de parte dos honorários fica dependente daqueles resultados.

4 — Só após a alteração do Estatuto da Ordem dos Advogados operada pela Lei n°15/2005, de 26 de Janeiro, é que esta proibição foi alterada (e mitigada), tendo-se consignado no seu art. 101°, n°3, última parte, que não constitui pacto de quota litis “o acordo pelo qual, além dos honorários calculados em função de outros critérios, se acorde numa majoração em função do resultado obtido”.

5 — À luz desta nova versão do Estatuto da Ordem dos Advogados, a estipulação da “success fee”em análise nos autos seria permitida.

Mas, como expressamente se reconhece no Acórdão recorrido, esta nova versão do EOA não se aplica ao caso sub judice.

6 — E, à luz da versão dada pelo DL. 84/84, de 16 de Março ao Estatuto da Ordem dos Advogados, que lhe é aplicável, tal estipulação é, inquestionavelmente, proibida e, por isso, nula.

Por outro lado, 7 — Ainda que, por absurdo, se aceitasse o entendimento expresso no Acórdão Recorrido de que o acordo em causa nos autos não viola o já referido art. 66°, alínea e), do Estatuto da Ordem dos Advogados, na versão aprovada pelo Decreto-Lei n°84/84, de 16 de Março, sempre teria de se considerar que, por não ter um objecto determinado ou determinável, tal acordo é nulo (art. 280° do Código Civil).

8 — Ficou provado que “foi acordado entre as Partes que, com a publicação do plano de urbanização no Diário da República, o Autor receberia da Ré um pagamento final de acordo com os objectivos conseguidos com o seu trabalho, cujo montante seria estabelecido por acordo entre ambos” (Resposta ao Quesito 4° da Base Instrutória).

Assim, 9 — A fixação do montante a pagar ao Autor nos termos deste acordo dependia, por sua vez, de novo acordo a celebrar entre o Autor e a Ré.

Porém, 10 — Decorre da Alínea G) da Matéria Assente e da resposta dada ao quesito 8° da Base Instrutória que Autor e Ré não chegaram a acordo quanto ao montante deste pagamento e que, por isso, o Autor o fixou unilateralmente.

11 — Um acordo cuja fixação do objecto depende de um novo acordo que nunca chegou a concretizar-se é um acordo...

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