Acórdão nº 340/03.7TBPNH.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 09 de Novembro de 2009

Magistrado ResponsávelGONÇALVES FERREIRA
Data da Resolução09 de Novembro de 2009
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

S Meio Processual: APELAÇÃO Legislação Nacional: ARTIGOS 494.º; 496.º; 562.º DO CÓDIGO CIVIL Sumário: 1. É ajustado o montante de € 200.000,00 para indemnizar o dano patrimonial futuro relativo a lesado com 42 anos, que ficou com uma IPP de 40% e auferia um salário mensal na ordem dos € 5.700,00, mas sem que se tenha provado a efectiva perda de rendimentos do trabalho.

  1. Para ressarcir o dano não patrimonial é adequada a quantia de € 40.000,00.

  2. As importâncias que o lesado despendeu ou deixou de receber por força do acidente podem ser actualizadas, desde que tenham perdido valor por via da inflação.

  3. Cabe, no entanto, ao lesado alegar e provar o valor da inflação.

    Decisão Texto Integral: Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra: I. Relatório: A...., casado, assessor e director comercial, residente em ….., n.º 5 – Daimiel, Ciudad Real, Espanha, intentou acção declarativa, com forma de processo ordinário, contra B...., com sede ….. Lisboa, alegando, em síntese, que: No dia 9 de Fevereiro de 1999, pelas 13H15, ao Km 178,2 do IP n.º 5, freguesia de Pínzio, concelho de Pinhel, ocorreu um acidente de viação, no qual foram intervenientes os veículos matrícula 36-98-EH, conduzido por D....e no qual ele, autor, seguia como passageiro, no banco de trás, e o pesado de mercadorias 01-23-KF/L 136053.

    O acidente foi provocado exclusivamente pelo condutor do veículo 36-98-EH, que seguia desatento e, por isso, invadiu a metade da faixa de rodagem destinada ao trânsito que circulava em sentido contrário, nomeadamente ao veículo pesado, tendo, por isso, ocorrido o embate entre os dois veículos.

    Ainda que se não provasse a culpa do condutor do EH, sempre haveria uma presunção de culpa, nos termos do artigo 503º nº3 do CC, ou, em último caso, responsabilidade pelo risco.

    A proprietária do veículo em que se fazia transportar havia transferido a sua responsabilidade para a ora ré, que, aliás, a assumiu perante si, só que não chegaram a acordo quanto à indemnização a pagar.

    Sofreu danos patrimoniais e não patrimoniais que discrimina, dos quais pretende ser ressarcido, quantificando alguns, mas remetendo a quantificação de outros para posterior liquidação, por impossibilidade de o fazer de momento.

    Concluiu pelo pedido de condenação da ré no pagamento da importância de € 452.577,76, acrescida de juros de mora, à taxa legal, desde a citação e até efectivo pagamento, e, bem assim, no pagamento da indemnização a liquidar posteriormente, acrescida, igualmente, de juros de mora, nos termos sobreditos.

    A ré, regularmente citada, apresentou-se a contestar pela forma seguinte: Desconhece as circunstâncias exactas em que ocorreu o acidente, mas aceita a versão dos factos aduzida pelo autor e, consequentemente, a obrigação de indemnizar os danos provocados pelo seu segurado.

    Ainda assim, o autor não seguia com o cinto de segurança, sendo certo que, se tal acontecesse, os danos sofridos seriam certamente menores, pelo que, atento tal facto, a culpa do lesado exclui ou reduz a obrigação de indemnizar a cargo do lesante, nos termos do disposto no artigo 570.º do CC.

    Os danos peticionados pelo autor são manifestamente exagerados.

    Deverá, finaliza, ser a acção julgada de acordo com a prova que se produzir.

    O autor respondeu à contestação, sustentando serem falsos os factos alegados no que respeita à circunstância do autor alegadamente não levar o cinto de segurança.

    No despacho saneador foram declaradas a validade e a regularidade da lide.

    A selecção da matéria de facto foi alvo de reclamação do autor, atendida.

    Concluída perícia médico-legal, apresentou o autor articulado superveniente, onde ampliou o pedido para o montante de € 502 577,76, em face do teor do relatório elaborado.

    A ré respondeu de forma a impugnar os factos alegados, acabando por concluir pela improcedência do peticionado, por, para além do mais, já se achar contido no pedido inicialmente formulado. O articulado foi admitido, na sequência do que foi seleccionada a matéria de facto considerada pertinente.

    Realizada a audiência de discussão e julgamento – onde o autor voltou a requerer a ampliação do pedido, agora para € 1.000.000,00, que foi admitida – e dadas as respostas aos pontos de facto da base instrutória, foi proferida sentença, que condenou a ré a pagar ao autor a quantia líquida de € 229.171,12 acrescida de juros de mora, à taxa legal, sobre a importância de € 44.171,12, desde a citação, e sobre o restante valor, desde a própria sentença, e, ainda, uma importância a liquidar, relativa aos danos que o autor venha a sofrer com as operações a que terá, ainda, de se submeter.

    Da sentença interpuseram recurso o autor e a ré, que alegaram e formularam as seguintes conclusões: A – o Autor:

    1. O apelante suportou e suportará, no futuro, danos não patrimoniais traduzidos em sofrimento, dores, angústia, desespero, tristeza, desgosto, inibição e dano/perda estética, conforme ficou provado nos quesitos 4 a 66, inclusive, e, em especial, nos quesitos 67 a 71, inclusive, da base instrutória. Por tais danos, e atenta a sua gravidade, deverá ser-lhe atribuída uma compensação não inferior a € 75.000,00.

    2. Sofreu, ainda, dano não patrimonial traduzido no dano biológico permanente com que irá viver até ao fim dos seus dias, com a perda da disponibilidade e uso do seu corpo para os normais afazeres da vida quotidiana, fixada num juízo médico-legal em 40% (35%+5%) de incapacidade parcial permanente geral ou anátomo-funcional, conforme ficou demonstrado na resposta dada aos quesitos 66 e 66-D da base instrutória. Tal dano merece uma compensação não inferior a € 120.450,00.

    3. Sofreu, também, o dano patrimonial futuro da perda de capacidade de ganho ou de perda de rendimentos, resultante da incapacidade parcial permanente profissional/laboral de 40% de que ficou afectado, conforme resulta da resposta dada aos quesitos 66-E, 72 a 75 e 93 da base instrutória. Esse dano deverá ser indemnizado em quantia não inferior a € 750.000,00.

    4. Desembolsou a importância de € 500,00 em exame médico anterior aos presentes autos e destinado a apurar as lesões e sequelas que sofreu, conforme decorre da resposta dada aos quesitos 1, 2, 3 e 89 da base instrutória. Terá de ser ressarcido dessa quantia.

    5. Desembolsou as quantias peticionadas nos artigos 92 e 95 da petição inicial, respectivamente, € 22.770,19 e € 1.000,00, e deixou de auferir as peticionadas no artigo 92 da mesma petição, no valor de € 21.125,57, das quais o tribunal recorrido já ordenou o pagamento de um total de € 44,395,76. Trata-se de importâncias de que deixou de dispor como bem entendesse, desde a data em que as suportou ou desde a data em que as poderia ter recebido e que perderam valor aquisitivo até à data da entrada da petição inicial em juízo, o que deverá levar a que sobre elas se vençam juros compensatórios, destinados a manter o valor da moeda até à data da citação da ré, ou, sempre, ao menos, desde 24.11.2003, data da entrada da propositura da acção, contados a uma taxa anual igual à da inflação, ou seja, de 4%. Esses juros, calculados até 24.11.2003, foram por si peticionados nos artigos 96 a 101, inclusive, e 120, todos da petição inicial, no valor de € 8.600,00, e deverão ser-lhe pagos pela ré.

    6. O tribunal “a quo” fez uma errada aplicação dos artigos 483.º, 496.º, 562.º, 564.º e 566.º do Código Civil, pelo que a sentença terá, nas referidas partes, de ser alterada e substituída por outra que condene a ré a pagar-lhe as quantias em questão que, somadas ao já fixado em primeira instância, atingirão o montante global de € 998.721,00.

      B – a Ré:

    7. O ponto 73 da base instrutória deveria ter recebido a resposta de que o autor, à data do acidente, auferia um vencimento mensal correspondente ao salário mínimo nacional em vigor à data da realização do julgamento, ou seja, € 426,00, com base na declaração fiscal que consta de folhas 658, em conjugação com o disposto nos números 7 e 8 do artigo 64.º do decreto-lei n.º 291/2007, de 21 de Agosto, na redacção que lhe foi dada pelo decreto-lei n.º 153/2008, de 6 de Agosto.

    8. Auferindo o autor, à data do acidente, uma remuneração de € 426,00, a indemnização pelos danos patrimoniais futuros decorrentes da incapacidade parcial permanente de 40% que lhe foi atribuída deve ser fixada em € 16.000,00.

    9. Auferindo o autor, à data do acidente, uma remuneração de € 426,00, a indemnização pelo período de cerca de 4 meses (113 dias) em que esteve impossibilitado de exercer as suas funções deve ser fixada em € 1.704,00.

    10. Não está demonstrado nos autos que a incapacidade de que o autor ficou portador importa uma redução da sua capacidade de ganho proporcional à da incapacidade que lhe foi atribuída.

    11. O autor não sofrerá um dano patrimonial futuro propriamente dito, mas um dano biológico com reflexo patrimonial, por cuja indemnização, na hipótese de se não alterar a resposta ao ponto 73 da matéria de facto, deve ser fixada em € 100.000,00.

    12. A sentença recorrida violou os artigos 342.º, n.º 1 e 564.º, n.º 2, do Código Civil e os números 7 e 8 do artigo 64.º do decreto-lei n.º 291/2007, de 21 de Agosto, na redacção que lhe foi dada pelo decreto-lei n.º 153/2008, de 6 de Agosto.

      O autor apresentou resposta à alegação da ré, pugnando pela improcedência do seu recurso, que concluiu assim:

    13. A resposta dada ao quesito 73 não merece censura.

    14. O tribunal baseou-se, e podia fazê-lo, num documento junto aos autos e no depoimento de uma testemunha e não, apenas, no documento, como a apelante pretende fazer crer.

    15. Os números 7 e 8 do artigo 64.º do decreto-lei n.º 291/2007, de 21 de Agosto, não são aplicáveis aos factos dos autos, ocorridos em 9 de Fevereiro de 1999.

    16. A interpretação a dar ao falado n.º 7 é a de que o tribunal deve ponderar as declarações ali aludidas, mas sem prejuízo de poder, também, ponderar outros elementos de prova, tudo com vista ao apuramento, como se lhe impõe pelos artigos 562.º e 566, n.º 2, do código Civil e do artigo 20.º da Constituição da República Portuguesa, do...

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