Acórdão nº 0991/08 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 09 de Novembro de 2009

Data09 Novembro 2009
Órgãohttp://vlex.com/desc1/1541_01,Supremo Tribunal Administrativo (Portugal)

ACORDAM NA SECÇÃO DO CONTENCIOSO ADMINISTRATIVO DO STA - (2ª Subsecção): 1 – A…, B… e C…, id. a fls. 2, intentaram no Tribunal Administrativo do Círculo de Lisboa recurso contencioso pedindo a anulação do despacho do PRESIDENTE DA CÂMARA MUNICIPAL DO BARREIRO, de 10.01.2002 que ordenou a notificação das recorrentes contenciosas para efectuarem o pagamento do montante de 24.002,15 €, correspondente ao valor das obras de reparação mandadas efectuar no prédio urbano, arrendado, sito na Rua …, no Barreiro, que lhes pertence.

2 – Por sentença do Tribunal Administrativo do Círculo de Lisboa de 06.06.2008 (fls. 136/149), com fundamento em “violação de lei por violação dos princípios da justiça, da proporcionalidade, da boa-fé, da prossecução do interesse público e da protecção dos direitos e interesses dos cidadãos e por conduzir a uma situação de abuso de direito” foi concedido provimento ao recurso e anulado o despacho recorrido.

Inconformado com tal decisão, dela veio o Presidente da Câmara Municipal do Barreiro a interpor recurso jurisdicional que dirigiu a este STA tendo na respectiva alegação (fls. 169/172 cujo conteúdo se reproduz), formulado as seguintes CONCLUSÕES: I - A actuação da ora recorrente não substancia abuso de direito.

II - Tal actuação decorre do legítimo exercício das competências legais que lhe estavam cometidas.

III - Visando a salvaguarda do interesse público.

IV - Não se pode haver por desproporcionado o custo de 24.000,00 € para a realização de uma obra de conservação de um prédio de 6 andares, 12 inquilinos e duas lojas, que, além do mais, importou na reparação integral da coluna de abastecimento de água em face da renda anual de € 6.000,00 que, mantendo devolutos dois andares, tal prédio produz.

V - Renda que, mesmo desprezando a possibilidade de actualizações anuais, permitiria a amortização em 49 meses.

VI - As obras foram pagas pelo Município do Barreiro cujo património empobreceu na mesma medida em que o das recorridas se viu injustificadamente valorizado.

VII - Não tendo impugnado contenciosamente o acto administrativo que as intimou à realização dessas obras, as ora recorridas nunca poderiam considerar-se de boa fé para efeitos de exoneração da responsabilidade de devolver ao recorrente o que este lhes prestou.

Nestes termos deve ser revogada a decisão anulatória.

3 – As recorridas contra-alegaram, concluindo nos seguintes termos: I - As ora Recorridas são proprietárias de um prédio urbano sito na Rua …, no Barreiro, prédio este arrendado por rendas de valores muito baixos, cuja totalidade é insuficiente para custear obras de conservação e de beneficiação do mesmo; II - A Câmara Municipal do Barreiro levou a cabo obras de substituição de uma conduta de água nesse locado e por despacho do Presidente da CMB, de 10.01.2002, ordenou o pagamento de € 24.002,15 referente a estas obras que a CMB realizou; III - Este acto do ora Recorrente ofende o princípio da justiça e ao bloco de legalidade, consubstanciando assim uma situação de Abuso de Direito, por verificar-se desde logo uma manifesta desproporção entre o valor das rendas auferidas e o valor das obras de conservação do prédio e desrespeito pelo princípio da equivalência das atribuições patrimoniais; IV - E mais, quando a CMB actua ao abrigo do art. 15° da RAU e 166° do RGEU, deve prosseguir e salvaguardar os interesses públicos, regendo-se pelos princípios que enformam a sua actividade e respeitando o bloco da legalidade, o que não aconteceu quando actuou para além da intervenção municipal adequada à situação, excedendo o seu poder enquanto Administração; V - O Recorrente como Administração, investida de poder e faculdades concedidas pelo legislador, tem o correlativo dever de garantir que a sua actividade obedece e respeita os princípios e limites impostos pelos fins públicos que prossegue.

VI - Ao impor às Recorridas as obras de substituição e o referido pagamento, impôs um sacrifício e agressões patrimoniais que estas não têm condições de suportar, agiu de forma abusiva, pervertendo os princípios da legalidade, da proporcionalidade, da justiça e da boa-fé, que são o esqueleto de um Estado de Direito, cuja Administração tem uma função com contornos bem definidos; VII - A ofensa aos princípios referidos na conclusão anterior originou pois, uma clara situação de Abuso de Direito, situação essa que se traduziu na exigência injusta e desproporcional de uma quantia que as Recorridas, atendendo ao valor das rendas e à sua situação económica e familiar (uma Recorrente aposentada e duas Recorrentes, suas irmãs, dela dependentes economicamente) não podiam, de maneira nenhuma, suportar.

VIII - Bem andou assim a sentença recorrida ao reconhecer que a actuação do Sr.º Presidente da Câmara Municipal do Barreiro ofendeu os Princípios referidos na conclusão 6.ª, pelo que a mesma não merece qualquer censura legal, antes sendo um exemplo de que os Tribunais Administrativos estão atentos às injustiças praticadas pelos órgãos da Administração Pública; IX - Nestes termos deve o presente recurso ser julgado improcedente por V. Ex.ªs, mantendo-se a sentença recorrida, que anulou o despacho de 10.01.2002 do Presidente da CMB, que ordenou o pagamento de €24.002,15 por obras de substituição no prédio sito na Rua …, no Barreiro.

4 - O Exm.º Magistrado do Ministério Público, emitiu parecer a fls. 195/199, no sentido de ser concedido provimento ao presente recurso.

+Cumpre decidir.

+5 - A Sentença recorrida deu como demonstrada a seguinte MATÉRIA DE FACTO: A - As ora Recorrentes são donas de um prédio urbano sito na Rua …, Barreiro (acordo).

B - Trata-se de um prédio antigo, em mau estado de conservação (acordo; cf. docs. de fls. 96 a 119 e 10 a 30 e 129 a 160 do PA).

C - O referido prédio em Março de 1975 foi ocupado pela CMB e pelos inquilinos, ocupação que durou até 1980 e durante esse período as Recorrentes não receberam rendas (acordo).

D - As Recorrentes B… e C… nunca efectuaram quaisquer descontos para a segurança social e nada recebem a título de pensão e a Recorrente A… aufere uma pensão Caixa Geral de Aposentações que no ano de 2002 era de 1.736,40 € mensais (cf. Doc. de fls. 21 a 25).

E - O supra referido prédio possui 6 andares e duas lojas, encontrando-se arrendado a doze inquilinos, com...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT