Acórdão nº 413/06.4JAFAR-A.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 07 de Novembro de 2009
Magistrado Responsável | ALBERTO BORGES |
Data da Resolução | 07 de Novembro de 2009 |
Emissor | Tribunal da Relação de Évora |
S Meio Processual: RECURSO PENAL Decisão: NEGADO PROVIMENTO Sumário: 1- À deficiente fundamentação do despacho que, nos termos do art. 213.º do CPP, procede ao reexame dos pressupostos da prisão preventiva não é aplicável o disposto no art.º 379 do CPP, pois trata-se de uma norma especial apenas aplicável à sentença; tal deficiente fundamentação, não tendo tratamento específico previsto na lei, constituiria uma mera irregularidade processual, submetida ao regime do art.º 123 do CPP.
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Encontrando-se o arguido já pronunciado, por crimes mais graves dos que inicialmente se indiciavam, tal facto - conjugado com a natureza, quantidade e gravidade dos crimes pelos quais foi pronunciado e as razões que justificaram o receio de fuga que fundamentou a aplicação da medida de coacção - permite concluir, de acordo com os critérios da normalidade da vida, que maior será o receio de que o arguido, sobre quem recai tal acusação, e confrontado com a probabilidade de vir a ser condenado em elevada pena, ante a facilidade de fuga que a sua condição lhe proporciona, até pela ligação aos países da América Latina, maior propensão terá para se furtar à acção da justiça, caso tal oportunidade lhe seja dada.
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O receio de que o arguido de furte à acção da justiça está bem demonstrado no despacho que aplicou tal medida, concretamente: i) pela utilização de identidade falsa, com sucesso, circunstância que, objectivamente, dificulta a localização de qualquer arguido (seja em Espanha, em Portugal ou qualquer outra parte do mundo); ii) pela oposição à transferência para Portugal (no âmbito do mandado de detenção europeu), que permite concluir, objectivamente, que não se apresentaria se não fosse forçado a tal; iii) pelas elevadas quantias de que, com outros, se apropriou, que lhe permitiriam ausentar-se para qualquer parte do globo, designadamente para a América Latina, pela ligação do arguido a outros envolvidos nos autos de nacionalidade venezuelana e colombiana.
Decisão Texto Integral: Acordam, em conferência, os Juízes que compõem a Secção Criminal da Relação de Évora: 1. No Tribunal Judicial da Comarca de Loulé (2.º Juízo Criminal) corre termos o Processo n.º …, no qual foi decidido, por despacho de 3.04.2009 (fol.ªs 7244 a 7245), manter a medida de coacção aplicada ao arguido J.V. – de prisão preventiva - a qual lhe fora aplicada por despacho de 19.12.2007, na sequência do interrogatório judicial a que foi submetido.
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Recorreu o arguido desse despacho, concluindo a motivação do seu recurso formulando as seguintes conclusões: a) O recorrente fundamenta a necessidade de ver alterada a medida de coacção a que está sujeito por outra medida menos gravosa com base na atenuação das exigências cautelares que determinaram a sua sujeição à medida de coacção de prisão preventiva.
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Desde logo, porque à data é o único arguido que se encontra em situação de reclusão.
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Já foi deduzida acusação.
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Aquando do Mandado de Detenção Europeu emitido para captura do mesmo, tal foi “encontrado” sem qualquer dificuldade acrescida relativamente a um qualquer cidadão português, é cidadão da União Europeia, espaço comum a todos os cidadãos das referidas nações, onde a cooperação internacional é notória e relevante, caindo por base o malfadado fundamento do perigo de fuga, sendo que, e relativamente aos outros pressupostos de aplicação referidos no art.º 204 do CPP; em concreto, de todo se verificam.
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Para mais, encontra-se já com 18 meses de reclusão, não lhe tendo sido sequer possibilitado o direito ao contraditório no que concerne à decretada especial complexidade processual, a qual hoje, na prática, muito o está a prejudicar, circunstâncias estas que foram completamente ignoradas e desatendidas pela decisão recorrida, a qual, aliás, carece de uma total falta de fundamentação.
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A nossa lei, no art.º 193 do CPP, dispõe que à aplicação das medidas de coacção devem presidir os princípios da adequação, proporcionalidade e subsidiariedade, pelo que se afigura manifestamente excessiva e desadequada a sujeição do arguido à mais gravosa das medidas de coacção existentes: a prisão preventiva.
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A situação dos presentes autos preenche os pressupostos de que depende o recurso à medida de obrigação de apresentação periódica, prevista no art.º 198 do CPP, e, eventualmente, prestação de caução com valor a fixar, medidas que serão claramente adequadas a acautelar as exigências cautelares que ainda assim se considerem persistir.
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Deve revogar-se a decisão recorrida e substituir-se por outra – menos gravosa - que considere atenuados os perigos que determinaram a colocação do arguido em prisão preventiva, no limite, pela obrigação de prestação de caução, de valor a fixar de acordo com o douto critério do tribunal.
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Não se fez a melhor justiça na aplicação da lei penal, quando se tornou patente que no despacho recorrido o tribunal não considerou, em concreto e em conjunto, os pressupostos de facto e de direito que fundamentaram a manutenção da medida de coacção aplicada, não existindo sequer a referência aos factos e/ou à personalidade do recorrente, bastando-se pela invocação abstracta de uma anterior decisão que à data já tem mais de um ano, violando o disposto no art.º 77 n.º 1 do CP e 374 n.º 2 do CPP.
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Deve revogar-se a decisão que indeferiu o requerimento do arguido em que solicitava a revogação da medida de coacção de prisão preventiva, devendo esta ser substituída por outra que determine que seja aplicada uma medida de coacção menos gravosa, a qual, no limite, poderá ser a obrigação de prestação de uma caução.
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Respondeu o M.º P.º junto da 1.ª instância, concluindo, em síntese: a) O presente recurso tem como objecto a revogação do douto despacho de fol.ª 7244, que decidiu manter a medida de coacção aplicada ao arguido recorrente - a prisão preventiva - a que o mesmo se encontra actualmente sujeito, e a sua substituição por outra medida de coacção menos gravosa, a qual, no limite, poderá passar pela obrigação de prestação de uma caução.
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Segundo a douta decisão instrutória proferida nestes autos foram pronunciados, para além do recorrente, os arguidos J.R. e Y.A.
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Considerou a pronúncia que os autos indiciam suficientemente que os arguidos J.R. e Y.A., com um plano prévia e rigorosamente traçado, com o fito de “formar um grupo de colaboradores, atribuições específicas de actuação, tendo em vista elaborar processos de obtenção de financiamentos bancários que formalmente respeitassem todos os requisitos e exigências legais, com base em documentação aparentemente autêntica e pretensamente emitida por quem tinha legitimidade para o efeito”.
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E que, “Para além de outros, os arguidos (aqui J.R. e Y.A.) admitiram na sua organização o arguido J.V., tendo todos eles tomado conhecimento dos propósitos e finalidades do agrupamento, que anuíram na concretização do projecto, bem assim, ficaram bem cientes do papel que a cada um era exigido”.
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“Ao arguido J.V. caberia desempenhar a função de pretenso adquirente de moradias e requerente de financiamento bancário para a sua aquisição”.
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O arguido J.V. encontra-se pronunciado, em concurso efectivo e em autoria material: - pela prática de um crime de associação criminosa, p. e p. pelo art.º 299 n.º 2 do CP; - pela prática de três crimes de burla qualificada, p. e p. pelos art.ºs 217 n.º 1 e 218 n.º 2 al.ª a), ambos do CP; - pela prática de um crime de burla qualificada, na forma tentada, p. e p. pelos art.ºs 217 n.º 1 e 218 n.º 2 al.ª a), conjugados...
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