Acórdão nº 01/09 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 03 de Novembro de 2009

Data03 Novembro 2009
Órgãohttp://vlex.com/desc1/1541_01,Supremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam no Tribunal dos Conflitos 1 – A… instaurou no Tribunal Judicial de Marco de Canavezes procedimento cautelar de embargo de obra contra D…, S.A.

, C…, E.P.

, e MUNICÍPIO DE MARCO DE CANAVEZES.

Aquele Tribunal veio a declarar-se incompetente em razão da matéria para a apreciação do procedimento cautelar, absolvendo os Requeridos da instância.

O Requerente, ora Recorrente, interpôs recurso de agravo para o Tribunal de Relação do Porto que, por acórdão de 21-4-2008, negou provimento ao recurso, confirmando a decisão recorrida.

O Recorrente interpôs recurso de agravo desse acórdão para o Supremo Tribunal de Justiça.

Por acórdão de 27-11-2008, o Supremo Tribunal de Justiça, baseando-se no art. 107.º, n.º 2, do CPC, decidiu não conhecer do recurso, ordenando a remessa do processo a este Tribunal dos Conflitos.

O Recorrente apresentou alegações com as seguintes conclusões: 1 – O Tribunal a quo entendeu que, para o caso vertente, era materialmente competente a jurisdição administrativa, sem apreciar o pedido formulado no requerimento de Embargo de obra nova e a causa de pedir que lhe está subjacente.

2 – Como também não apreciou o pedido formulado e “a causa petendi” da acção principal de que a providência cautelar é dependência.

3 – Além de que, tendo em conta a factualidade apresentada, erradamente reportou o litígio a uma relação jurídico-administrativa.

4 – O douto despacho recorrido enferma de nulidade, com base no disposto na al. b) do n.º 1 do art. 668.º do C.P.C..

5 – O referido despacho também é nulo, nos termos da al. d) do n.º 1 do art. 668.º do C.P.C., pois não se pronunciou sobre questões, da maior importância para a decisão, que deveria conhecer e apreciar.

6 – O douto acórdão viola pela sua errada aplicação, o disposto na alínea g) e h) do n.º 1 do art. 4.º do ETAF (aprovado pela Lei n.º 13/2002 de 19 de Fevereiro; 7 – Enferma de manifesta violação do art. 1º n.º 1 do ETAF.

8 – Contraria, igualmente, o disposto no art. 212.º, n.º 3 da Constituição da República Portuguesa, 9 – Bem como o art. 66.º e 67.º do Código de Processo Civil.

TERMOS EM QUE, nos melhores de direito e com o sempre mui douto suprimento de V.Exas. deve ser concedido provimento ao presente recurso, e consequentemente ser revogado o douto acórdão do Tribunal da Relação do Porto, sendo declarado que o Tribunal Judicial de Marco de Canaveses é competente, em razão da matéria, para a apreciação do procedimento cautelar de Embargo de Obra Nova.

DANDO-SE PROVIMENTO AO RECURSO SERÁ FEITA, COMO SEMPRE JUSTIÇA A C…, E.P. contra-alegou, defendendo que o recurso não merece provimento.

O Excelentíssimo Procurador-Geral Adjunto emitiu douto parecer nos seguintes termos: Vem o presente recurso interposto do douto acórdão do Tribunal da Relação do Porto que, negando provimento ao recurso de agravo, confirmou a decisão recorrida e absolveu os requeridos da instância, por incompetência absoluta do tribunal comum para apreciação da providência cautelar requerida, em face da competência pertencente, nesta sede, aos tribunais da jurisdição administrativa.

Em nosso parecer, o recurso não merecerá provimento.

A competência em razão da matéria do tribunal afere-se pela natureza da relação jurídica, tal como ela é configurada pelo autor na petição inicial, ou seja, no confronto entre a pretensão deduzida (pedido), independentemente do seu mérito, e os respectivos fundamentos (causa de pedir).

O pedido deduzido no requerimento inicial é a imediata suspensão das alegadas “obras” ou “trabalhos novos” em curso nos prédios rústicos do requerente, denominados por Quinta do …, e tem como fundamento a sua execução por parte de D…, SA, visando a supressão de várias passagens de nível da linha do Douro – por adjudicação da requerida C…, EP, na sequência de acordo estabelecido entre esta e o requerido Município – com violação explícita dos direitos do requerente, designadamente de propriedade, e consequente destruição e descaracterização da referida quinta.

Ao invés do sustentado pelo recorrente, a alegada violação do seu direito de propriedade não exclui que ela não derive de um acto de gestão pública nem que o litígio que a consubstancia não seja emergente de uma relação jurídica administrativa.

Conforme bem entendeu o douto acórdão recorrido, a obra em causa enquadra-se dentro dos fins de interesse público prosseguidos pela C…, EP, e revela-se como acto de gestão pública na medida em que se compreende no exercício de um poder público e integra, ele mesmo, a realização de uma função pública dessa pessoa colectiva.

Por outro lado, o litígio emerge de uma relação jurídica administrativa já que as obras levadas a cabo pela requerida D…, alegadamente ofensivas do direito de propriedade do recorrente, decorrem da execução dos trabalhos de empreitada adjudicada pela C…, EP, nos termos do contrato administrativo de empreitada de obras públicas entre ambas celebrado, ou seja, emerge de uma relação estabelecida entre uma entidade pública e um particular, regulada por normas de direito administrativo, da qual resultam posições jurídicas subjectivas — cfr. fls. 114 a 124 e alínea p) dos factos provados.

Finalmente, deverá considerar-se revogada pela Lei n.º 13/2002, de 19 de Fevereiro, por força do disposto no art. 7.º, n.ºs 2 (parte final) e n.º 3 (2 parte) do C. Civil, a invocada norma do art. 32, n.º 1 dos Estatutos da C…, aprovados pelo DL n.º 104/97, de 19 de Abril, Anexo 1, nos termos da qual “... compete aos tribunais judiciais o julgamento de todos os litígios em que seja parte a C…, E.P., incluindo as acções para efectivação da responsabilidade civil dos titulares dos seus órgãos para com a respectiva empresa” — Neste sentido, o douto acórdão deste Tribunal, de 23/01/2008, Conflito n.º 017/07.

Em consequência, deverá ser negado provimento ao recurso, julgando-se competentes os tribunais administrativos para conhecer do procedimento cautelar em causa, nos termos dos arts. 1º, n.º 1 e 2, n.º 1, g) do ETAF e do art. 212º, n.º 3 da CRP.

Corridos os vistos legais, cumpre decidir.

2 – No acórdão recorrido deu-se como assente a seguinte matéria de facto:

  1. A aquisição dos prédios descritos na Conservatória do Registo...

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