Acórdão nº 0991/08 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 09 de Outubro de 2009

Magistrado ResponsávelEDMUNDO MOSCOSO
Data da Resolução09 de Outubro de 2009
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

ACORDAM NA SECÇÃO DO CONTENCIOSO ADMINISTRATIVO DO STA - (2ª Subsecção): 1 – A…, B… e C…, id. a fls. 2, intentaram no Tribunal Administrativo do Círculo de Lisboa recurso contencioso pedindo a anulação do despacho do PRESIDENTE DA CÂMARA MUNICIPAL DO BARREIRO, de 10.01.2002 que ordenou a notificação das recorrentes contenciosas para efectuarem o pagamento do montante de 24.002,15 €, correspondente ao valor das obras de reparação mandadas efectuar no prédio urbano, arrendado, sito na Rua …, no Barreiro, que lhes pertence.

2 – Por sentença do Tribunal Administrativo do Círculo de Lisboa de 06.06.2008 (fls. 136/149), com fundamento em “violação de lei por violação dos princípios da justiça, da proporcionalidade, da boa-fé, da prossecução do interesse público e da protecção dos direitos e interesses dos cidadãos e por conduzir a uma situação de abuso de direito” foi concedido provimento ao recurso e anulado o despacho recorrido.

Inconformado com tal decisão, dela veio o Presidente da Câmara Municipal do Barreiro a interpor recurso jurisdicional que dirigiu a este STA tendo na respectiva alegação (fls. 169/172 cujo conteúdo se reproduz), formulado as seguintes CONCLUSÕES: I - A actuação da ora recorrente não substancia abuso de direito.

II - Tal actuação decorre do legítimo exercício das competências legais que lhe estavam cometidas.

III - Visando a salvaguarda do interesse público.

IV - Não se pode haver por desproporcionado o custo de 24.000,00 € para a realização de uma obra de conservação de um prédio de 6 andares, 12 inquilinos e duas lojas, que, além do mais, importou na reparação integral da coluna de abastecimento de água em face da renda anual de € 6.000,00 que, mantendo devolutos dois andares, tal prédio produz.

V - Renda que, mesmo desprezando a possibilidade de actualizações anuais, permitiria a amortização em 49 meses.

VI - As obras foram pagas pelo Município do Barreiro cujo património empobreceu na mesma medida em que o das recorridas se viu injustificadamente valorizado.

VII - Não tendo impugnado contenciosamente o acto administrativo que as intimou à realização dessas obras, as ora recorridas nunca poderiam considerar-se de boa fé para efeitos de exoneração da responsabilidade de devolver ao recorrente o que este lhes prestou.

Nestes termos deve ser revogada a decisão anulatória.

3 – As recorridas contra-alegaram, concluindo nos seguintes termos: I - As ora Recorridas são proprietárias de um prédio urbano sito na Rua …, no Barreiro, prédio este arrendado por rendas de valores muito baixos, cuja totalidade é insuficiente para custear obras de conservação e de beneficiação do mesmo; II - A Câmara Municipal do Barreiro levou a cabo obras de substituição de uma conduta de água nesse locado e por despacho do Presidente da CMB, de 10.01.2002, ordenou o pagamento de € 24.002,15 referente a estas obras que a CMB realizou; III - Este acto do ora Recorrente ofende o princípio da justiça e ao bloco de legalidade, consubstanciando assim uma situação de Abuso de Direito, por verificar-se desde logo uma manifesta desproporção entre o valor das rendas auferidas e o valor das obras de conservação do prédio e desrespeito pelo princípio da equivalência das atribuições patrimoniais; IV - E mais, quando a CMB actua ao abrigo do art. 15° da RAU e 166° do RGEU, deve prosseguir e salvaguardar os interesses públicos, regendo-se pelos princípios que enformam a sua actividade e respeitando o bloco da legalidade, o que não aconteceu quando actuou para além da intervenção municipal adequada à situação, excedendo o seu poder enquanto Administração; V - O Recorrente como Administração, investida de poder e faculdades concedidas pelo legislador, tem o correlativo dever de garantir que a sua actividade obedece e respeita os princípios e limites impostos pelos fins públicos que prossegue.

VI - Ao impor às Recorridas as obras de substituição e o referido pagamento, impôs um sacrifício e agressões patrimoniais que estas não têm condições de suportar, agiu de forma abusiva, pervertendo os princípios da legalidade, da proporcionalidade, da justiça e da boa-fé, que são o esqueleto de um Estado de Direito, cuja Administração tem uma função com contornos bem definidos; VII - A ofensa aos princípios referidos na conclusão anterior originou pois, uma clara situação de Abuso de Direito, situação essa que se traduziu na exigência injusta e desproporcional de uma quantia que as Recorridas, atendendo ao valor das rendas e à sua situação económica e familiar (uma Recorrente aposentada e duas Recorrentes, suas irmãs, dela dependentes economicamente) não podiam, de maneira nenhuma, suportar.

VIII - Bem andou assim a sentença recorrida ao reconhecer que a actuação do Sr.º Presidente da Câmara Municipal do Barreiro ofendeu os Princípios referidos na conclusão 6.ª, pelo que a mesma não merece qualquer censura legal, antes sendo um exemplo de que os Tribunais Administrativos estão atentos às injustiças praticadas pelos órgãos da Administração Pública; IX - Nestes termos deve o presente recurso ser julgado improcedente por V. Ex.ªs, mantendo-se a sentença recorrida, que anulou o despacho de 10.01.2002 do Presidente da CMB, que ordenou o pagamento de €24.002,15 por obras de substituição no prédio sito na Rua …, no Barreiro.

4 - O Exm.º Magistrado do Ministério Público, emitiu parecer a fls. 195/199, no sentido de ser concedido provimento ao presente recurso.

+Cumpre decidir.

+5 - A Sentença recorrida deu como demonstrada a seguinte MATÉRIA DE FACTO: A - As ora Recorrentes são donas de um prédio urbano sito na Rua …, Barreiro (acordo).

B - Trata-se de um prédio antigo, em mau estado de conservação (acordo; cf. docs. de fls. 96 a 119 e 10 a 30 e 129 a 160 do PA).

C - O referido prédio em Março de 1975 foi ocupado pela CMB e pelos inquilinos, ocupação que durou até 1980 e durante esse período as Recorrentes não receberam rendas (acordo).

D - As Recorrentes B… e C… nunca efectuaram quaisquer descontos para a segurança social e nada recebem a título de pensão e a Recorrente A… aufere uma pensão Caixa Geral de Aposentações que no ano de 2002 era de 1.736,40 € mensais (cf. Doc. de fls. 21 a 25).

E - O supra referido prédio possui 6 andares e duas lojas, encontrando-se arrendado a doze inquilinos, com...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT