Acórdão nº 448/09 de Tribunal Constitucional (Port, 14 de Setembro de 2009

Data14 Setembro 2009
Órgãohttp://vlex.com/desc1/2000_01,Tribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO N.º 448/09

Processo n.º 744/09

Plenário

Relator: Conselheiro Carlos Pamplona de Oliveira

ACORDAM EM SESSÃO PLENÁRIA NO TRIBUNAL CONSTITUCIONAL

Relatório

  1. Alfredo José Temporão Martins, na qualidade de candidato integrado na lista apresentada pelo Partido Social Democrata (PPD/PSD) para a eleição da Assembleia de Freguesia de Troviscoso, Município de Monção, nas eleições de 11 de Outubro de 2009, recorre para o Tribunal Constitucional do despacho do juiz do Tribunal Judicial de Monção que indeferiu a reclamação que apresentara contra a decisão que julgou elegível o candidato Manuel Fernando Pinto Coração de Maria, integrante das listas do Partido Socialista (PS) à mesma eleição.

    Diz, em suma:

    [...]

    Fundamentos de facto:

  2. Já no ano de 2005, a Freguesia de Troviscoso propôs no Tribunal de Monção a Acção Ordinária 453105.OTBMNC contra o candidato recorrido Manuel Fernando Pinto Coração de Maria (adiante Manuel Fernando Pinto), a qual tem julgamento aprazado para o próximo dia 14/10 (3 dias após as eleições).

  3. Conforme a respectiva Petição Inicial, a Freguesia assim decidiu, propondo a acção, porque o candidato Manuel Fernando Pinto, em 2004, se apossara duma parcela de terreno com a área aproximada de 4.000m2 dum prédio do domínio privado da referida autarquia, vedando o terreno e dele retirando valiosas árvores de madeira, saibro e outras utilidades,

  4. à custa do empobrecimento do erário da autarquia, que, pelo mesmo modo, impede de afectar o referido prédio ao empreendimento social a que se destinava,

  5. e porque, também em 2004, o candidato Manuel Fernando Pinto anexou a uma propriedade dele uma faixa de caminho público vicinal (da mesma Freguesia de Troviscoso) – mais uma vez, à custa do património da autarquia.

  6. Além de demandar o candidato Manuel Fernando Pinto por se ter apossado e de lhe exigir o cumprimento da obrigação de restituição daqueles imóveis dos seus domínios público e privado, já em mora, a Freguesia também lhe exige o pagamento, também em mora desde 2005, da indemnização necessária ao ressarcimento dos danos que já causara quando a acção foi proposta e que continua a causar-lhe, quer os emergentes da subtracção dos imóveis, com impedimento da sua administração – e, quanto ao do domínio particular, da sua transformação –, quer os emergentes da repetida subtracção de árvores e saibro, desde 2004, actos que danificam aqueles imóveis e desvalorizam o domínio particular da autarquia.

    O direito e as conclusões dos factos:

  7. Dispõe o artigo 2º da Constituição que a República Portuguesa é um Estado de Direito Democrático, baseado na soberania popular, no pluralismo de expressão e organização política democráticas, no respeito e na garantia de efectivação dos direitos e liberdades fundamentais e na separação e interdependência de poderes, visando a realização da democracia económica, social e cultural e o aprofundamento da democracia participativa.

  8. Os titulares das Juntas e Assembleias de Freguesia são agentes da Administração Pública, que, nos termos do disposto no art. 266º.2 da Constituição, estão sujeitos ao princípio da imparcialidade.

  9. Conforme os Acórdãos deste Tribunal Constitucional nºs 253/85 e 505/2001, publicados no DR II Série, de 18-03-1986 e de 21-11-2001, a lei eleitoral autárquica “visa proteger a justiça de actuação e a imparcialidade dos órgãos” e tem ‘em vista garantir a isenção e a / independência com que os titulares dos órgãos”.

  10. O art. 7º.2-b) da Lei Org. 1/2001 prescreve que “não são (...) elegíveis para os órgãos das autarquias locais em causa” “os devedores em mora da autarquia local em causa”.

  11. A lei não distinque se a dívida há-de ser certa e líquida, nem cabe na natureza do processo eleitoral um tal julgamento. Por isso que hão-de considerar-se relevantes as dívidas cujo pagamento as autarquias legítima e seriamente venham a exigir dos candidatos que se apresentam a eleições para os respectivos órgãos.

  12. Aliás, dívidas não são apenas as obrigações de pagamento, pois que é devedor todo aquele que esteja vinculado ao cumprimento de uma prestação, seja ela de pagamento ou de prestação de facto exequível, fungível ou infungível, positivo ou negativo (artºs 397º e 827º e ss. do CCivil).

  13. Ora, tendo-se apossado de bens imóveis do domínio público e do domínio privado da autarquia para as eleições de cujos órgãos concorre e tendo causado danos nesses bens, por subtracção de árvores e de saibro e porque, pela manutenção do esbulho, impede a posse e a disponibilidade, em prejuízo da actividade e do património geral da mesma autarquia – como esta entendeu e como demonstra no processo judicial pendente acima referido –, o candidato Manuel Fernando Pinto é devedor da prestação de restituição e de não perturbação da posse e da propriedade dos referidos imóveis autarquia, bem como da prestação do quantitativo correspondente à indemnização pelos danos que ilicitamente causou.

  14. E dispõe o art. 805º.3 do CCivil que em caso de responsabilidade por facto ilícito –como é o caso –, o devedor constitui-se em mora desde a citação, que, no caso também já ocorreu em 2005.

  15. Por isso que a Freguesia constituiu o Manuel Fernando Pinto como devedor em mora, sendo que, quanto à parcela do caminho público que este ocupou, a Freguesia e os seus órgãos actuam no exercício da sua actividade típica de gestão pública, com presunção de legalidade e privilégio de execução directa e liquidação prévias – por não terem de ser antecedidas do reconhecimento judicial.

  16. Para além do que se diz desde 10 supra, uma interpretação restritiva da norma do art. 7º.2- b) da LEOAL que excluísse as dividas contestadas/impugnadas ou objecto de oposição é de rejeitar, por maioria de razão.

  17. Conforme entendeu este Tribunal Constitucional no Ac. de 1993-11-15, sumariado em dgsi.pt como Doc. TEL19931115937161, “a inelegibilidade relativa aos devedores em mora da autarquia visa evitar o conflito de interesses entre o devedor da autarquia e a mesma pessoa, enquanto titular de um órgão representativo da entidade credora.”

  18. Ora, mais grave é o risco para o interesse público se, pela eleição, se permite ao devedor impugnante que assuma a representação da autarquia que o demanda. Assumido o poder, ele...

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