Decisões Sumárias nº 114/16 de Tribunal Constitucional (Port, 16 de Fevereiro de 2016

Magistrado ResponsávelCons. Catarina Sarmento e Castro
Data da Resolução16 de Fevereiro de 2016
EmissorTribunal Constitucional (Port

DECISÃO SUMÁRIA N.º 114/2016

Processo n.º 846/2015

  1. Secção

Relator: Conselheira Catarina Sarmento e Castro

Decisão sumária (artigo 78.º-A da Lei n.º 28/82, de 15 de novembro)

Recorrente: Ministério Público

Recorrido: A.

I - Relatório

1. Nos presentes autos, vindos do Tribunal Judicial da comarca de Aveiro, Instância Local, Secção de Competência Genérica, Ílhavo, veio o Ministério Público interpor recurso da sentença, datada de 27 de fevereiro de 2015, invocando o artigo 70.º, n.º 1, alínea a), da Lei n.º 28/82, de 15 de novembro (Lei de Organização, Funcionamento e Processo do Tribunal Constitucional, doravante designada por LTC), e a recusa de aplicação, pelo tribunal a quo, do artigo 25.º do Regulamento sobre Fiscalização de Produtos Explosivos, anexo ao Decreto-Lei n.º 376/84, de 30 de novembro, e do artigo 7.º do Decreto-Lei n.º 265/94, de 25 de outubro.

  1. A sentença recorrida foi proferida no âmbito de processo de impugnação judicial de decisão que, no âmbito de autos de contraordenação, condenou o arguido A. numa coima, pela prática de uma contraordenação prevista e punida pelo artigo 25.º do Regulamento sobre a Fiscalização de Produtos Explosivos, publicado em anexo ao Decreto-Lei n.º 376/84, de 30 de novembro, em conjugação com o artigo 7.º do Decreto-Lei n.º 265/94, de 25 de outubro e com a alínea a), §4, do n.º 13 das Instruções sobre a Utilização de Artigos Pirotécnicos.

    O tribunal a quo, depois de afirmar que a previsão da contraordenação em causa resulta da conjugação do artigo 25.º do Regulamento sobre a Fiscalização de Produtos Explosivos, com o artigo 13.º, parágrafo 4.º, alínea a), do Manual de Instruções para Utilização de Artigos Pirotécnicos, elaborado pela PSP, bem como com o artigo 1.º do Decreto-Lei n.º 107/92, de 2 de junho, e ainda o artigo 7.º do Decreto-Lei n.º 265/94, de 25 de outubro, conclui pela existência de dúvidas sérias a propósito “da constitucionalidade desta técnica legislativa de remissão em cadeia, na medida em que apenas da conjugação de todos os diplomas supra mencionados resulta a qualificação de determinada conduta como contraordenação”.

    Especifica que as dúvidas de constitucionalidade se reportam ao descrito procedimento legislativo, desde logo porque “a declaração genérica constante do DL 376/84, de 30.11 (…) deixa na discricionariedade da PSP a elaboração das referidas instruções cuja violação consubstancia contraordenação”.

    Mais refere que se verifica uma violação do princípio da confiança e da determinabilidade da lei aplicável, decorrente dos artigos 2.º e 18.º, da Constituição da República Portuguesa.

    Finaliza tal raciocínio, referindo que “as citadas normas violam princípios constitucionais basilares, razão pela qual não se aplicam tais dispositivos legais.”

    Cumpre apreciar e decidir.

    II - Fundamentos

  2. O Ministério Público delimitou o objeto do recurso, como correspondendo à questão da constitucionalidade da norma resultante da conjugação dos artigos 25.º do Regulamento sobre Fiscalização de Produtos Explosivos, anexo ao Decreto-Lei n.º 376/84, de 30 de novembro, e do artigo 7.º do Decreto-Lei n.º 265/94, de 25 de outubro.

    Em rigor, a decisão recorrida, que motivou o recurso, faz assentar o critério normativo reputado inconstitucional e cuja aplicação foi, em consequência, recusado, num arco de preceitos legais mais amplo, incluindo, desde logo, a referência à instrução n.º 13, §4, alínea a), das Instruções sobre a Utilização de Artigos Pirotécnicos, emitida pela Polícia de Segurança Pública. Menciona, ainda, o artigo 1.º do Decreto-Lei n.º 107/92, de 2 de junho, que se traduz numa norma atributiva de competências à PSP, em substituição da entidade referenciada no artigo 25.º do Decreto-Lei n.º 376/84, de 30 de novembro, que foi extinta.

    Não obstante não existir uma absoluta coincidência entre a delimitação do objeto do recurso, apresentada no respetivo requerimento de interposição, e a norma recusada pelo tribunal a quo, pode afirmar-se que tal delimitação abarca o núcleo essencial da referida norma.

    Assim, precisando, com maior rigor, o critério normativo cuja apreciação é pretendida, sem alteração substancial ou relevante do objeto do recurso, consigna-se que o mesmo corresponde à norma, extraível da conjugação do artigo 25.º do Regulamento sobre a Fiscalização de Produtos Explosivos, publicado em anexo ao Decreto-Lei n.º 376/84, de 30 de novembro – com a alteração introduzida pelo n.º 2 do artigo 1.º do Decreto-Lei 107/92, de 2 de junho – com a Instrução 13.º, § 4.º, alínea a), do Manual de Instruções sobre a Utilização de Artigos Pirotécnicos, elaborado pela PSP e ainda com o artigo 7.º do Decreto-Lei n.º 265/94, de 25 de outubro, na dimensão em que permite que seja punida como contraordenação a violação de Instrução da Polícia de Segurança Pública, relativa à obrigatoriedade de identificação dos operadores pirotécnicos com colete refletor cor de laranja, assim remetendo a fixação do conteúdo da contraordenação para instruções desta entidade.

    Refere o tribunal a quo que tal norma, face à sua estrutura remissiva em cadeia, viola os princípios da confiança e da determinabilidade, previstos nos artigos 2.º e 18.º, ambos da Constituição da República Portuguesa.

  3. Antes de entrarmos na análise da questão de constitucionalidade, cumpre referir que ao conhecimento da mesma não obsta a circunstância de a decisão recorrida conter um fundamento alternativo conducente, de forma autónoma e suficiente, à mesma solução jurídica – no caso, a existência de “vícios” da “decisão administrativa condenatória” que se traduz na omissão de “formalidade essencial do procedimento contraordenacional, geradora de nulidade insuprível da inerente decisão aplicadora da coima”, que sempre daria origem à procedência do recurso interposto pelo arguido, independentemente da questão de constitucionalidade colocada – face ao facto de o presente recurso ter sido interposto ao abrigo da alínea a) do n.º 1 do artigo 70.º da LTC.

    De facto, no âmbito dos recursos abrangidos por tal alínea, o pressuposto da utilidade processual é perspetivado de uma forma abrangente, considerando-se que deve ser aferido em função da suscetibilidade de projeção do juízo de sindicância de constitucionalidade “sobre o desfecho da ação, e não restritamente sobre a concreta decisão judicial recorrida, quando esta não é a decisão definitiva” (cfr. Acórdão n.º 256/2004 (disponível em www.tribunalconstitucional.pt).

    Tal especificidade decorre da circunstância de, neste tipo de recursos, não ser exigível a prévia exaustão dos recursos ordinários, face à prevalência do interesse objetivo do ordenamento jurídico na resolução rápida do “conflito entre o poder judicial e o poder legislativo” inerente à recusa de aplicação de normas, com fundamento em inconstitucionalidade (cfr. Acórdão n.º 40/2011, disponível no sítio da internet já aludido).

    Nestes termos, conclui-se...

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