Acórdão nº 148/16 de Tribunal Constitucional (Port, 09 de Março de 2016

Magistrado ResponsávelCons. Maria José Rangel de Mesquita
Data da Resolução09 de Março de 2016
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO Nº 148/2016

Processo n.º 557/15 3ª Secção

Relator: Conselheira Maria José Rangel de Mesquita

Acordam, em conferência, na 3ª Secção do Tribunal Constitucional

I - Relatório

  1. Nos presentes autos de fiscalização concreta da constitucionalidade, vindos do Tribunal Judicial da Comarca do Porto – 1.ª Secção do Trabalho, em que é recorrente o Ministério Público e recorrido A., a relatora proferiu a Decisão Sumária n.º 430/2015 (de fls. 225-227), a qual, ao abrigo do disposto no n.º 1 do artigo 78.º-A da Lei n.º 28/82, de 15 de novembro, na sua redação atual (LTC), decidiu não julgar inconstitucional a norma do artigo 19.º da Lei n.º 55-A/2010, de 31 de dezembro (Orçamento do Estado para 2011), e, em consequência, conceder provimento ao recurso.

    Assim se ponderou e decidiu:

    II – Fundamentação

    4. A decisão do tribunal a quo ora recorrida recusou, ao abrigo do disposto no artigo 204.º da Constituição da República Portuguesa, a aplicação da norma do artigo 19.º da Lei n.º 55-A/2010, de 31 de dezembro, que aprovou o Orçamento de Estado para 2011, com fundamento em inconstitucionalidade material (cfr. decisão recorrida, Motivação, Direito, fls. 168 e ss., em especial 171 e ss. e Decisão, fls. 218).

    5. A questão da constitucionalidade do artigo 19.º (com a epígrafe «Redução remuneratória») da Lei n.º 55-A/2010, de 31 de dezembro, que aprovou o Orçamento de Estado para 2011, foi já apreciada pelo Plenário deste Tribunal no Acórdão n.º 396/2011, de 21 de Setembro de 2011, no qual se decidiu não declarar a inconstitucionalidade, com força obrigatória geral, da norma constante daquele artigo 19.º da Lei do Orçamento de Estado para 2011 (cfr. III – Decisão). Ora afigurando-se transponível para o presente caso a fundamentação expendida naquele Acórdão n.º 396/2011 (cfr. II – Fundamentação, em especial n.ºs 6 a 9), é de concluir igualmente, pelas razões nele explicitadas, pela não inconstitucionalidade da norma objecto do presente recurso.

    III – Decisão

    6. Pelo exposto, ao abrigo do disposto no n.º 1 do artigo 78.º-A da LTC, decide-se:

    Não julgar inconstitucional a norma do artigo 19.º da Lei n.º 55-A/2010, de 31 de dezembro; e, em consequência,

    Conceder provimento ao recurso, determinando-se a reforma da decisão recorrida em conformidade com o precedente juízo de não inconstitucionalidade.

  2. Notificado da decisão, o recorrido reclamou para a conferência, ao abrigo do artigo 78.º-A, n.º 3, da LTC, alegando, quanto à decisão, o seguinte (cfr. fls. 231-238):

    A., Autor/Recorrido melhor identificados nos autos em referência, discordando da decisão sumária 430/2015 neles proferida, vem, com a devida vénia, ao abrigo do n. 3 do art. 78-A, da Lei 28/82, de 15 de Novembro, RECLAMAR PARA A CONFERÊNCIA,

    com os seguintes fundamentos:

    Excelentíssimos Senhores Conselheiros:

    1. Com o devido respeito, a decisão em reclamação comporta-se como se fosse procedente o entendimento de que, uma vez julgada uma norma não inconstitucional numa única decisão proferida em sede de fiscalização abstrata, tal decisão tem força obrigatória geral para o caso concreto. Ora tal pressuposto não tem nenhum suporte jurídico nem doutrinário.

    Na questão em apreço, sem qualquer outra justificação, optou-se por não julgar inconstitucional a norma do art. 19 da lei n. 55-A/2010, de 31 de Dezembro, já apreciada em sede de fiscalização abstrata, no Acórdão do TC n. 396/2011, de 21 de Setembro de 2011, apenas por se afigurar "transponível para o presente caso a fundamentação expendida naquele Acórdão" e por ser "de concluir igualmente, pelas razões nele explicitadas, pela não inconstitucionalidade da norma objeto do presente recurso".

    Ora, o caso dos presentes autos não se compadece com esta decisão sumária, sobretudo tendo em conta a factualidade assente, as posições doutrinárias expendidas, que incluem pareceres académicos de Ilustres Professores (de que adiante se junta cópia, pois tais pareceres estavam noutros autos que foram apensos a estes até às decisões da Primeira Instância), e também a laboriosa e bem ponderada sentença do Tribunal da Primeira Instância, que merecerá seguramente uma apreciação e decisão mais desenvolvida e fundamentada, por parte do Tribunal Constitucional. Tanto mais que aquele Acórdão (396/2011) não mereceu a unanimidade dos Senhores Conselheiros e algumas das questões nele abordadas foram objeto de revisão ou alterações em acórdãos posteriores congéneres proferidos por este Alto Tribunal (cf. infra).

    2. De notar que a decisão em reclamação ignorou por completo a questão da violação do direito à contratação coletiva ou do princípio da autonomia coletiva, previsto no art. 56 da CRP.

    3. Acresce que a sentença da Primeira Instância fundamenta a decisão na violação de outros princípios para além da referida contratação ou autonomia coletiva, princípios que, só em parte, são enunciados na interposição de recurso (princípio da igualdade dos cidadãos, na vertente da dignidade social dos trabalhadores - art. 13/1 da CRP e princípio da irredutibilidade da retribuição implícito na garantia de uma existência condigna, previsto no art. 59/1/a da CRP), mas que também foram completamente ignorados na decisão sumária em reclamação.

    Também por isso, isto é, por não ter abordado todos os princípios e normas constitucionais invocados na sentença, se justifica a presente reclamação.

    4. Na sentença da Primeira Instância, a Meritíssima Juíza, depois de enunciar o conteúdo de incidências laborais dos art. 19 e 24 da Lei 55-N201O, refere-se resumidamente à evolução da jurisprudência do Tribunal Constitucional (TC), à aplicabilidade da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia (CDFUE) e à constitucionalidade ou não "da medida de redução remuneratória dos trabalhadores e demais medidas relativas à progressão profissional".

    Quanto à jurisprudência do TC, a sentença refere o carácter transitório e a conjuntura excecional que justificou a decisão proferida no Ac. 396/2011, sublinhando logo de seguida as decisões em sentido contrário - as declarações de inconstitucionalidade com força obrigatória geral - proferidas nos Acórdãos 353/2012, 187/12013 e 413/2014, em que, por imperativo do princípio da igualdade e da justa repartição dos encargos públicos, foi determinada a reposição do pagamento do subsídio de natal (Ac. 187/2013) e inviabilizada a redução remuneratória (Ac. 413/2014). Daqui concluiu acertadamente a sentença que a "questão da (in)constitucionalidade das normas que impuseram reduções salariais aos trabalhadores do Estado, está (aparentemente) resolvida pelo Tribunal Constitucional".

    Porém, a sentença não se contenta com essa constatação, entendendo que "o problema é mais complexo e não se pode cingir à evidente violação do princípio da igualdade".

    Escudando-se no eminente constitucionalista Gomes Canotilho, a sentença lembra que "o julgador, quando está em causa a proteção de direitos fundamentais, poderá ser confrontado ( .. .) com uma problemática de internormatividade jusfundamental, ou seja, [poderá ter de apreciar] como a sobre posição dos direitos fundamentais é captada pelos vários tribunais chamados a dizer o direito nos casos concretos (interjurisdicionalidade) ".

    E, continuando, defende a sentença que, na "questão da redução remuneratória ", o direito da União Europeia está e continua a estar diretamente conexionado com esta linha estratégica de atuação do estado Português, ilustrando esta asserção com a) o art. 119 do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia (TFUE), com b) a Resolução do Conselho Europeu de Amesterdão de 17/06/1997 (97 /C36/01) relativa ao Pacto de Estabilidade e Crescimento (PAC), com c) os regulamentos 1466/97 e 1467/97 (alterados respetivamente pelos regulamentos 117512011 e 1177/2011 do Conselho, de 8 de Nov. de 2011) e com d) o art. 126 do TFUE.

    No desenvolvimento desta problemática, concluiu a sentença que a LOE 55-A/2010 e as seguintes "implementaram medidas económico-financeiras com vista designadamente a cumprir o art. 104 do Tratado (atual...

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