Acórdão nº 0814/08 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 08 de Julho de 2009

Magistrado ResponsávelJOÃO BELCHIOR
Data da Resolução08 de Julho de 2009
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam em conferência os juízes da Secção de Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo (STA): I.RELATÓRIO A Presidente da Câmara Municipal de Caminha e a sociedade A...

, Lda, com sede na Rua ... - Caminha, recorrem da sentença proferida no Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto (TAF) que concedeu provimento ao recurso contencioso ali instaurado por B...

e mulher C...

, residentes na Rua ... Rio Tinto - Gondomar, D... e mulher E..., residentes na Praceta ..., Massamá - Queluz - Sintra, F...

e mulher G..., residentes na Avenida ... - Caminha, H...

e mulher I..., residentes na Rua ... - Porto, J... e mulher K..., residentes na Avenida ...

- Caminha, L... e mulher M..., residentes na Raul ... - Porto, N..., divorciada, residente na Avenida ... - Caminha, O... e mulher P...

, residentes na Avenida ... - Caminha e Q... e mulher R..., residentes na Avenida ... - Caminha, contra o Sr.

Vereador do Pelouro de Obras e Urbanismo da Câmara Municipal de Caminha, sendo recorrida particular a referida "A..., Lda..", e em que peticionavam que se declarasse nulo o despacho da autoria do recorrido de 11-09-2000 que licenciou a construção de um edifício de cave, rés do chão e três andares, sita na referida Avenida ... (gaveto com a Avenida ...) - Caminha.

A Presidente da Câmara rematou a sua alegação com as seguintes Conclusões: "1ª A decisão impugnada respeitou as normas legais aplicáveis, incluindo as do Regulamento do PDM e, dentre estas, a do seu art. 21°, n° 1, não estando, por isso, afectada da ilegalidade que a douta sentença lhe imputa. De facto, 2ª Embora a construção licenciada pelo despacho recorrido implique um coeficiente de ocupação do solo (COS) de 2,98, quando o previsto em termos genéricos, para o espaço territorial onde aquela se insere é de 0,80, tal excesso é permitido e está rigorosamente conforme à lei, v. g. aquele art. 21°, n° 1.

  1. Como se extrai do disposto no art 20° do PDM, os índices urbanísticos nele previstos referem-se a toda a zona por eles abrangida, pelo que é ao conjunto do solo delimitado pela zona respectiva que tem de reportar-se o índice aprovado e não a cada construção individualmente considerada.

  2. A decisão recorrida deu seguimento, aliás, a uma prática jurídica e urbanística que vinha sendo observada na zona do edifício em causa, prática que, inclusivamente, teve os próprios recorrentes por destinatários no tocante ao imóvel onde residem, cujo COS é de 1,58.

  3. É também o caso, entre outros situados na mesma zona, do loteamento contíguo ao prédio licenciado e cujo COS oscila entre os 3,9 e os 5,48.

  4. Sem prejuízo do que acaba de referir-se sobre a plena vigência e cogência do n° 1 do art. 21° do RPDMC, e ao contrário do propugnado pela douta sentença recorrida, aquele articulado em parte alguma do seu texto contém a expressão "estudo de enquadramento aprovado", mas, sim, "...casos aprovados por estudos de enquadramento", sem embargo de a palavra "aprovados" se dever a uma gralha, pois, o que queria e devia ter-se escrito era "apoiados" ou "suportados", conforme claramente se deduz do contexto em que aquele vocábulo está inserido.

  5. Nele se contemplam aqueles casos em que, pela sua localização e envolvente imediata, e desde que apoiados ou suportados em estudo de enquadramento que o justifique, é possível ultrapassar o COS máximo - de 0,80 - conquanto se não ultrapasse a cércea máxima prevista, como no caso se verificou.

  6. Em nenhuma norma legal vinculativa para a Câmara Municipal de Caminha se define o conceito de "estudo de enquadramento", pelo que os serviços municipais gozam de uma certa margem de livre apreciação na integração do respectivo conceito.

  7. O articulado da norma do n° 1 do art. 21° faz apelo a dois elementos ou factores - a localização e a envolvente imediata - complementados por estudo de enquadramento, cujos componentes, âmbito e complexidade variarão de caso para caso, de acordo com as respectivas circunstâncias concretas.

    Ora, 10ª No caso vertente, a decisão proferida no processo de licenciamento de obras particulares n° 846/99 não pode ser desligada do processo n° 377/99 relativo ao pedido de informação prévia, mau grado este ter sido indeferido.

  8. O requerente do processo n° 846/99 requerera anteriormente em 1999.06.30, informação prévia ao abrigo do disposto nos arts 11º, 31º e 37° do Dec-Lei n° 445/91, de 28.11, na redacção do Dec-Lei n° 250/94, de 15.12., tendo juntado os documentos nele incorporados e que aqui se dão por reproduzidos.

  9. Conforme resulta dos processos n°s 377/99 e 846/99, as peças escritas, desenhadas, fotográficas e topográficas que os incorporam, não só fornecem os elementos informativos necessários à apreciação do pedido de licenciamento suportado no estudo de avaliação do seu adequado enquadramento urbanístico no local e na envolvente, como também extravasam clara e inequivocamente dos elementos exigíveis para um pedido de licenciamento normal, rectius, em que não houvesse ultrapassagem (legalmente permitida) do COS.

  10. Com base nos elementos apresentados no processo n° 377/99, e na senda do critério adoptado a propósito de outras intervenções urbanísticas em que o COS também foi excedido, os serviços técnicos, ancorados na prática reiterada para o local e num pormenorizado e rigoroso conhecimento directo da zona, consideraram estarem reunidos os requisitos legais (face ao estudo de enquadramento que realizaram no âmbito da apreciação do projecto) pronunciando-se favoravelmente à aprovação do licenciamento nos termos em que veio a ser feita pelo despacho recorrido.

  11. Ao considerar que "o acto impugnado viola a norma do art. 20º/1 do RPDMC, por inexistência de qualquer estudo de enquadramento aprovado, tal como a norma exige", a douta sentença faz uma errada interpretação e aplicação do preceito em causa, não podendo, assim, subsistir na ordem jurídica".

    A recorrente particular - A..., Ldª formulou as seguintes Conclusões: "1ª A ter existido violação da Lei nos presentes autos tal não pode ser imputado a ora Requerente que para isso não concorreu.

  12. Limitou-se a cumprir as normas e ditames administrativos então exigidos.

  13. A impugnação de normas obedece a processualismo específico, definido autonomamente, e que não pode ser substituído por outro procedimento processual.

  14. Os órgãos autárquicos e respectivos titulares agiram, no caso em Juízo, em conformidade com deliberação de órgão competente pese embora ela não tenha sido ratificada superiormente.

  15. O acto impugnado foi praticado ao abrigo de uma deliberação da Assembleia Municipal que serviu de orientação para os serviços municipais e como regra de conduta que devessem observar.

  16. A não ratificação do conteúdo do art. 22°, n° 1 do RPDMC apenas implica que não goze de força de Lei Geral. Mas não significa que não corresponda a orientações administrativas oriundas dos órgãos autárquicos competentes para apreciar e decidir as matérias abrangidas pelo seu quadro de competências 7ª Desentranhada a Contestação haverá que considerar-se desentranhados os documentos que o acompanham porquanto o documento junto com um articulado deve considerar-se parte integrante dele.

  17. O Tribunal "a quo" procedeu em sentido diverso o que conduziu a uma decisão de mérito que, de outro modo, poderia ser a inversa.

  18. Não existe conceptualização ou definição jurídica da figura de "estudo de enquadramento urbanístico pelo que não obsta que, para fundamentar a aprovação de um projecto a Câmara Municipal recorra os elementos delineados num pedido de viabilidade".

  19. Assim se considerando, inexiste qualquer confusão entre o "estudo de enquadramento urbanístico" e o "pedido e informação prévia" e, consequentemente, também inexiste fundamento para a declaração de nulidade feita em 1ª Instância.

  20. A douta Decisão Recorrida não terá feito a melhor aplicação do disposto no art. 20º, n° 1 do RPDM de Caminha e demais normativos nela referidos.

  21. Pelo que deverá ser revogada por Douto Acórdão que indefira o Recurso em questão".

    Os recorrentes contenciosos, ora recorridos, contra-alegaram sem formular conclusões, sustentando a bondade do decidido.

    O Exmº Procurador-Geral Adjunto neste STA emitiu o seguinte Parecer.

    "I O recorrente público imputa à douta sentença recorrida erro de julgamento, por indevida interpretação e aplicação da norma do art.° 20, nº 1 do RPDM de Caminha, por cuja ofensa nela se julgou procedente o vício de violação de lei invocado e, em consequência, nos termos do artº 52, nº 2, b) do DL nº 445/91, de 20/11, redacção do DL nº 250/94, de 15/10, se declarou nulo o acto de licenciamento contenciosamente impugnado, de 11/9/00, da autoridade recorrida.

    Para tanto, a sentença recorrida considerou que o acto viola aquela norma, "por inexistência de qualquer estudo de enquadramento aprovado, tal como a norma exige, que permitisse a autorização de um COS superior ao regulamentar" - cfr. fls. 404.

    1. Alega o recorrente que os índices urbanísticos previstos naquela disposição se referem a toda a zona por eles abrangida, pelo que é ao conjunto do solo delimitado pela zona respectiva que tem de reportar-se o índice estabelecido e não a cada construção individualmente considerada - concl. 3ª .

      Esta interpretação revela-se, porém, infundada, na medida em que a norma se refere claramente ao tipo de edificação dominante nas várias categorias de espaços urbanos e, concretamente, em espaço urbano de alta densidade - plurifamiliar - bem como às prescrições que deverão observar quanto ao número máximo de pisos - rés-do-chão mais três - e ao coeficiente da ocupação do solo - 0,80, o qual é precisamente apurado em função da área bruta de construção de cada edificação, nos termos do artº 6, nº 7 e nº 2, a) daquele Regulamento.

    2. Alega depois que a inobservância do COS pelo acto contenciosamente impugnado seguiu uma prática jurídica e urbanística que vinha sendo observada relativamente a outros imóveis situados na mesma zona - concl.

      A alegação, na perspectiva da procedência do recurso é, no...

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