Acórdão nº 03405/08 de Tribunal Central Administrativo Sul, 25 de Junho de 2009

Magistrado ResponsávelRUI PEREIRA
Data da Resolução25 de Junho de 2009
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

ACORDAM EM CONFERÊNCIA NO 2º JUÍZO DO TRIBUNAL CENTRAL ADMINISTRATIVO SUL I. RELATÓRIO O Sindicato Nacional dos Trabalhadores da Administração Local [STAL], em representação e para defesa dos direitos da sua associada M..., Arquitecta de 1ª classe do quadro de pessoal da Câmara Municipal da Marinha Grande, intentou no TAF de Leiria, acção administrativa especial, contra o Município da Marinha Grande, pedindo a declaração de nulidade ou de anulação da deliberação de 24-8-2006, daquela edilidade, que aplicou à sua associada a pena disciplinar de inactividade por um ano.

Por acórdão datado de 24-9-2007 foi a referida acção julgada improcedente e a ré absolvida do pedido [cfr. fls. 145/159 dos autos].

Inconformado com tal decisão, veio o STAL recorrer jurisdicionalmente para este TCA Sul, tendo na respectiva alegação formulado as seguintes conclusões: "1ª - Ao não permitir ao autor fazer prova dos factos por si alegados no sentido de demonstrar que a arguida não tinha adoptado a conduta pela qual fora punido - vd. artigos 26º a 31º da p.i que, ainda por cima, nem haviam sido objecto de impugnação especificada pela entidade demandada - e ao considerar que a arguida adoptara os comportamentos pelos quais havia sido punida, o aresto em recurso viola frontalmente as garantias subjacentes ao direito à tutela judicial efectiva - que impede a subsistência de quaisquer limitações de ordem probatória e obrigam o Tribunal a averiguar se ocorreram ou não os pressupostos de facto em que se baseou a punição decretada pela Administração [vd. RUI MACHETE, "A garantia contenciosa para obter o reconhecimento de um direito ou interesse legalmente protegido", nos "Dez anos da Constituição", pág. 245, LEBRE DE FREITAS, Inconstitucionalidade do CPC, ROA, Ano 52, 1992, pág. 36, e LUÍS VASCONCELOS DE ABREU, "Para o Estudo do Procedimento Disciplinar no Direito Administrativo Português Vigente: as relações com o Processo Penal, pág. 65] e deixou por cumprir formalidades impostas por lei [vd. artigos 87º, nº 1, alínea d) do CPTA e artigo 511º de CPC] e inerentes às mais elementares garantias reconhecidas por um Estado de Direito, geradora da nulidade de todo o processado posterior à apresentação da contestação [vd. artigo 201º do CPC e o próprio Acórdão do TCA Sul, de 2003, Processo nº 10868/01].

  1. - Maior é essa certeza quando se sabe que o Tribunal a quo também não permitiu ao autor fazer prova que as funções que a arguida desempenhava desde 2001 na Câmara Municipal nada tinham a ver com o departamento de administração urbanística e que não tinha qualquer intervenção em processos de licenciamento - tal como se alegara no artigo 37º da p.i. e que era necessário para demonstrar a inexistência de qualquer infracção disciplinar - e, depois, entende que se deve "pressupor" que a arguida desempenhava funções nessa área e que deveria ter qualquer intervenção nos processos de licenciamento.

  2. - O aresto em recurso enferma de um claro erro de julgamento ao não ter anulado o acto impugnado por violação da proibição de os actos renováveis terem eficácia retroactiva, consagrada na alínea b) do nº 1 do artigo 128º do CPA, não só por a retroactividade no caso sub judice não ser mais favorável à arguida mas, sobretudo, por a possibilidade enunciada na alínea a) do nº 2 do artigo 128º só se aplicar "...fora dos casos abrangidos pelo número anterior...", não sendo, consequentemente, possível quando o número anterior [o nº 1] proíbe que os actos renováveis tenham eficácia retroactiva. Na verdade, 4ª - Está provado nos presentes autos que em 2006 a entidade demandada voltou a aplicar à arguida a pena de inactividade com os mesmos fundamentos de 2000, considerando que a pena agora aplicada já havia sido cumprida entre 2000 e 2001.

    Ora, 5ª - Por força do disposto na alínea b) do artigo 128º do CPA, a nova deliberação punitiva de 2006 nunca poderia ter eficácia retroactiva, uma vez que "...a retroactividade dos efeitos do novo acto deixaria sem efectiva sanção jurídica a actuação ilegal da Administração, permitindo assim manter uma situação, criada por essa actuação, lesiva de direitos ou interessas legítimos do recorrente..." [vd. AFONSO QUEIRÓ, in RLJ, 119, págs. 302 e segs., os Acórdãos do STA, de 25-2-86 e de 15-12-87, in AD nº 293/625 e 317/657, e MÁRIO AROSO DE ALMEIDA, in "Anulação de actos administrativos e relações jurídicas emergentes", págs. 667 e 668].

  3. - O próprio aresto em recurso reconheceu a retroactividade da deliberação impugnada, tendo, no entanto, considerado que tal retroactividade era mais favorável à arguida e que, como tal, poderia a entidade demandada atribuir eficácia retroactiva à deliberação punitiva "ex vi" do artigo 128º, nº 2 do CPA.

  4. - Contudo, para além de serem demasiado pobres os argumentos invocados para se considerar que a retroactividade era mais favorável à arguidas - pois esqueceu-se o Tribunal a quo de referir que sem essa retroactividade a arguida teria direito a receber os vencimentos acrescidos de juros de mora e uma indemnização pelos danos morais resultantes de ter estado um ano sem trabalhar -, sempre se dirá que o nº 2 do artigo 128º do CPA só permite à Administração atribuir eficácia retroactiva "FORA DOS CASOS ABRANGIDOS PELO NÚMERO ANTERIOR", pelo que se por força da alínea b) do nº 1 os actos renováveis não podem ter eficácia retroactiva e se o nº 2 só permite atribuir eficácia retroactiva fora destes casos, é por demais manifesto o erro de julgamento em que incorre o aresto ao sancionar como legal uma deliberação que, em sede de execução de sentença, aplica novamente uma punição à arguida e faz retroagir os efeitos de tal punição ao ano de 2000/2001.

  5. - O aresto em recurso enferma igualmente de um claro erro de julgamento, violando frontalmente o disposto no artigo 2º do DL nº 413/93 e no artigo 3º do DL nº 24/84, quando entendeu que se pressupunha que as funções desempenhadas pela arguida eram subsumíveis à previsão do disposto no artigo 2º do DL nº 413/93, uma vez que, enquanto não se permitisse ao autor provar as funções que a arguida desempenhava e enquanto o Tribunal não desse por provado que funções por ela eram efectivamente desempenhadas, não poderia pressupor e, muito menos, considerar que teria sido cometida a infracção disciplinar pela qual fora punida, a não ser que agora se decida com base em "pressuposições" e não com base em factos provados.

    Na verdade, 9ª - Em matéria de acumulação de funções públicas com privadas a proibição é a excepção, pelo que o funcionário só poderá ser impedido de exercer funções privadas em acumulação quando a lei o determinar [vd. PAULO VEIGA E MOURA, A Privatização da Função Pública, 2004, pág. 173].

  6. - Ora, os nºs 1 e 2 do artigo 2º do DL nº 413/93 apenas punem o exercício de actividades privadas que sejam concorrentes ou similares com as funções executadas enquanto funcionário público, e com as quais aquelas conflituem, entendendo-se como tal aquelas que tenham conteúdo idêntico, sejam desenvolvidas de forma permanente e se dirijam ao mesmo círculo de destinatários.

  7. - Tal como o autor alegou no artigo 37º da p.i., entre 2001 e 2006 não exerceu, enquanto arquitecta, qualquer actividade no departamento de administração urbanística da Câmara Municipal da Marinha Grande, nem teve a menor intervenção nos processos de licenciamento de obras submetidos a apreciação camarária, pelo que, ainda que por mera hipótese tivesse elaborado ou subscrito quaisquer projectos após 12-10-1999, é manifesto que tal actividade não só não tinha um conteúdo idêntico às funções executadas no Município como, em qualquer dos...

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