Acórdão nº 09B0212 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 28 de Abril de 2009

Magistrado ResponsávelSANTOS BERNARDINO
Data da Resolução28 de Abril de 2009
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: 1.

AA- Serviços Técnicos Especializados, L.da intentou, em 22.02.2007, pela 3ª Vara Cível de Lisboa, contra BB, L.da, acção com processo ordinário, pedindo que a ré seja condenada a pagar-lhe a quantia de € 11.392,26, acrescida de juros moratórios vencidos até àquela data, no valor de € 4.760,36, e dos vencidos desde então e vincendos até integral pagamento, à taxa legal dos juros comerciais.

Alegou, para tanto, ter prestado à demandada, no âmbito do contrato de subempreitada que com esta celebrou em Novembro de 2002, diversos serviços de jardinagem na Urbanização Paço do Lumiar, em Lisboa, que constam das facturas juntas com a petição inicial, e que não foram pagos, nem na data do vencimento das facturas nem posteriormente, não obstante as várias interpelações que, para o efeito, fez à ré.

A ré contestou, alegando, em síntese, ter-se a autora obrigado, no contrato celebrado, a assegurar a manutenção e conservação dos trabalhos adjudicados por um período de seis meses, tendo sido igualmente acordado que ela, ré, só pagaria o preço acordado quando o dono da obra, a EPUL, satisfizesse a esta o preço da empreitada.

Acontece, porém, que a obra não foi aceite, além do mais porque 80% das árvores e arbustos plantados pela autora morreram dentro do prazo de garantia, e não foram substituídas, apesar da ré ter oportunamente reclamado por essa substituição, acrescendo que as medições apresentadas relativas a uma das facturas não correspondem aos trabalhos efectivamente prestados, como também foi, a devido tempo, reclamado pela ré.

Requereu, em consequência, a sua absolvição do pedido, ou, quando menos, a parcial improcedência deste; e, em reconvenção, pediu que a autora fosse condenada a repor as plantas e árvores que pereceram na dita Urbanização, junto aos edifícios P1, L1, L2 e L3.

A autora replicou e contestou a matéria da reconvenção, concluindo pela improcedência das excepções alegadas e pela sua absolvição do pedido reconvencional.

No saneador, foi admitido o pedido reconvencional e operada a selecção da matéria de facto - a assente e a controvertida - com interesse para a decisão do pleito; e, seguindo o processo a sua normal tramitação, foi realizado o julgamento e proferida sentença, na qual se decidiu pela improcedência da acção e pela procedência da reconvenção e, em consequência: a) se absolveu a ré do pedido de pagamento da quantia peticionada pela autora, por se julgar procedente a excepção de não cumprimento do contrato imputável à demandante, ao abrigo do art. 428º n.º 1 do CC; e b) se condenou a autora a repor as árvores que pereceram na Urbanização do Paço do Lumiar, junto aos edifícios P1, L1, L2 e L3, conforme contratualmente acordado.

Da sentença, interpôs a autora o pertinente recurso de apelação.

E a Relação de Lisboa, em acórdão oportunamente proferido, julgou parcialmente procedente a apelação, e improcedente a reconvenção, revogando a sentença apelada e condenando a ré a pagar à autora a quantia de € 7.000,00 mais IVA, acrescida de juros de mora à taxa legal para as sociedades até efectivo pagamento, e ainda a pagar-lhe a parte restante do preço [o valor do pedido (€ 11.392,26) deduzido daquela quantia de € 7.000,00+ IVA], sem juros de mora, contra a plantação pela autora das mesmas árvores perecidas, em quantidade e espécie, absolvendo esta última do pedido reconvencional.

Recorre agora a ré, de revista, para este Supremo Tribunal, apresentando, nas suas alegações, um alargado e pouco claro leque conclusivo, recondutível, em essência, às seguintes proposições: 1ª - O acórdão recorrido padece de erro de interpretação e aplicação das normas aplicáveis - maxime, dos arts. 428º, 762º, n.º 2, 763º, 1207º e 1211º do CC; 2ª - Na verdade, tendo entendido, face à inexistência de prova quanto à forma de pagamento do preço da subempreitada em causa, ser aplicável o art. 1211º, n.º 2, norma supletiva que estabelece que a obrigação de pagamento do preço só se vence no acto de aceitação da obra, não deveria ter decidido como decidiu, pois o que tal norma postula é que o preço da empreitada deve ser pago no acto de aceitação da obra, mas quando esta for efectivamente aceite, concluída em conformidade com o convencionado, sem vícios que excluam ou reduzam o seu valor; 3ª - Se se acham provados defeitos na obra, denunciados atempadamente pela recorrente, que obstaram à sua aceitação até hoje, a decisão recorrida incorre em errada interpretação do citado art. 1211º, n.º 2; 4ª - Também decorre do art. 428º, n.º 1 que, por força do cumprimento defeituoso por parte da autora, traduzido nos defeitos apurados e descritos na sentença, a ré pode recusar o pagamento do preço em falta, até que sejam corrigidos ou eliminados tais defeitos; enquanto a situação se mantiver, a exigibilidade do pagamento do preço fica suspensa na totalidade, não podendo decidir-se, como o fez a Relação, pela condenação da ré no pagamento à autora de uma qualquer verba; 5ª - A excepção de não cumprimento justifica-se por razões de boa fé, de moralidade, de equidade e de justiça comutativa, o que a Relação parece olvidar, ao considerar que o recurso a tal excepção é quase ofensivo dos indicados princípios; 6ª - Devia a Relação ter mantido a sentença da 1ª instância, nos seus exactos termos, concluindo que, sendo legítima a invocação da excepção do não cumprimento, atenta a correspectividade directa da obrigação de pagamento do preço relativamente ao cumprimento integral da realização da obra (art. 1207º), só será exigível a primeira quando a segunda estiver completamente realizada (cfr. arts. 1211º, n.º 2 e 763º); 7ª - A Relação aplicou ainda erroneamente o disposto no art. 762º, n.º 2 - ao considerar que, se o dono da obra tirar desta, mesmo que defeituosa, algum proveito, é de admitir ao empreiteiro o valor correspondente à vantagem que tira - uma vez que este normativo não se aplica ao caso em apreço, por nenhuma das partes ter cumprido a sua obrigação (uma, de executar a obra sem defeitos, e a outra, de pagar o preço respectivo); 8ª - Aliás, a imputar-se a alguma das partes falta de boa fé, só à autora/recorrida poderá fazer-se tal imputação, pois que, apesar de instada e sabedora de que executara uma obra deficientemente, não reparou ainda, desde 2003 até hoje, os seus defeitos; 9ª - Acresce a tudo o que antecede que a Relação "sequer se deu ao trabalho de fundamentar a forma como alcançou aquele brilhante valor de € 7.000,00, acrescido de IVA, que a ré teria de pagar, de imediato, à autora", violando o disposto no art. 713º, n.º 2 do CPC; 10ª - Finalmente, o acórdão recorrido, na medida em que, por um lado, condena a autora a cumprir a prestação a que se achava adstrita, tal como peticionado pela recorrente em reconvenção e, por outro, a absolve do pedido reconvencional, incorre na nulidade prevista no art. 668º/1.c) do CPC, já que se verifica, assim, clara oposição entre os fundamentos e a decisão; 11ª - Deve, pois, o acórdão recorrido ser declarado nulo, ou, caso assim se não entenda, ser revogado, face à errónea interpretação e aplicação das normas acima indicadas, mantendo-se na íntegra a decisão da 1ª instância.

A autora/recorrida apresentou contra-alegações, defendendo a bondade do acórdão recorrido.

Corridos os vistos, cumpre agora conhecer e decidir do mérito do recurso.

  1. Vêm, das instâncias, provados os factos seguintes: 1) A autora dedica-se, de forma habitual e lucrativa, à prestação de serviços de limpeza e conservação de zonas urbanas e jardins, construção de parques de jardinagem, produção e comércio de flores, vigilância, projectos de impacto ambiental e audiometria; 2) No âmbito da sua actividade, a autora prestou à ré, a pedido desta e no âmbito de subempreitada acordada entre ambas em Novembro de 2002, diversos serviços de jardinagem na Urbanização Paço do Lumiar, em Lisboa, no quadro da empreitada n.º 48/2001, que tinha por objecto a execução de arranjos exteriores aos edifícios P1, L1, L2 e L3 na Urbanização do Paço do Lumiar; 3) Na sequência dos serviços prestados pela autora, no âmbito desse acordo, foi emitido e subscrito pela ré e pelo dono da obra (a EPUL) o "Auto de Vistoria" e "Recepção Provisória das Zonas Verdes das Árvores de alinhamento", do qual consta que "ao primeiro dia do mês de Abril de 2003 compareceram no local dos trabalhos a Sr.ª CC Engenheira Agrónoma, em representação...

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