Acórdão nº 07S891 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 10 de Julho de 2008

Magistrado ResponsávelSOUSA PEIXOTO
Data da Resolução10 de Julho de 2008
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam na Secção de Contencioso do Supremo Tribunal de Justiça: 1.

A Dr.ª AA, juíza de direito, interpôs recurso para o Supremo Tribunal de Justiça, ao abrigo do disposto no art.º 168.º do Estatuto dos Magistrados Judiciais (EMJ), da deliberação do Plenário do Conselho Superior da Magistratura (CSM), de 23.1.2007, que, no processo de inspecção n.º 176/2006, lhe atribuiu a classificação de Suficiente, relativamente ao serviço por ela prestado no Tribunal Judicial de Celorico da Beira, no período de 17.9.2004 a 14.9.2005, pedindo que aquela deliberação fosse declarada nula ou, quando assim não se entenda, que a mesma fosse anulada e substituída por outra que atribua à recorrente a classificação de Bom.

A recorrente resumiu a fundamentação do recurso nas seguintes conclusões: I. A decisão proferida é nula por preterição de uma formalidade essencial do procedimento inspectivo consubstanciada nas entrevistas, no início e no fim da inspecção, previstas no art.º 17.º, n.º 1, alínea i), do RIJ - cfr. 133.º, n.º 2, alínea d), do C.P.A. -, mostrando-se igualmente violado o princípio da participação previsto no art.º. 267.º, n.º 5, da Constituição da República Portuguesa.

II - A decisão proferida é nula, por não ter feito qualquer efectiva ponderação de elementos que devem ser considerados essenciais na avaliação global (10 trabalhos apresentados ao abrigo do art.º 17.°, n.º 1, alínea g), do RIJ), em violação clara do direito de participação na formação da decisão, constitucionalmente consagrada no art.º 266.°, n.º [2] da CRP.

III - Ainda que assim não se entendesse, sempre deveria [concluir-se] que a decisão é anulável por evidente e grosseira violação do art.º 17.º, n.º 1, alínea g), do RIJ, e ainda dos seus art.os 14.°, n.º 2, e 19.°, n.º 1, alínea e), ou por padecer, na parte respeitante à apreciação feita do trabalhos, de grosseira violação do dever de fundamentação da decisão previsto no art.º 268.°, n.º 3 da CRP e consagrado nos art.os 124.º e 125.º do C.P.A.

IV - A decisão é igualmente nula por violação do direito de resposta previsto no art.º 18.°, n.º 6, do RIJ, que deve ser tido como emanação do direito fundamental de defesa e participação consagrados constitucionalmente no art.º 267.°, n.º 5, ao ter negado a possibilidade de serem juntos ao processo inspectivo certidão integral dos saneadores e articulados respectivos, através dos quais pretendia provar a cuidadosa e morosa depuração dos factos por ela efectuados, em resposta ao relatório da inspecção.

V - Ainda que assim se não entendesse, o que não se receia mas acautela, sempre a decisão seria anulável por violação do art.º 18.°, n.os 6 e 7, do RIJ, e do art.º 135.° do C.P.A., até porque o pedido sempre deveria ter sido entendido, em termos de boa-fé, como a mera tentativa de junção aos autos de elementos que a ora recorrente não mantinha consigo e estavam na disponibilidade do Ex.mo Inspector, e não, verdadeiramente, como uma diligência.

VI - Assim, ao negar a pretensão da requerente, violou o Ex.mo Inspector, de forma flagrante e grosseira, salvo o devido respeito, as normas citadas e o direito de resposta, e subtraiu ao órgão decisor a possibilidade de sindicar o juízo efectuado pelo Ex.mo Inspector.

VII - A decisão é ainda nula por violação do direito de resposta traduzida no indeferimento da audição do Exmo. Procurador e do Delegado local da Ordem dos Advogados e dos funcionários, nos termos do art.º 11.º, n.º 1, alíneas g) e h), do RIJ, - art.º 133.°, n.º 2, alínea d) -, ou, ainda que assim se não entendesse, sempre teria de considerar-se anulável - art.º 135.° do C.P.A.

VIII - A decisão é ainda nula ou anulável em virtude de ter negado à recorrente, na sequência da apresentação da sua resposta, a junção ao processo inspectivo de certidão das respostas aos quesitos em todos os processos cíveis por si dadas, para prova de que fazia adequada análise crítica dos depoimentos, ao contrário do que ficou a constar do relatório, em flagrante violação do seu direito de resposta previsto no art.º 18.°, n.º 6, do RIJ, que deve ser tido como emanação do direito fundamental de defesa e participação consagrados constitucionalmente no art.º 267.°, n.º 5.

IX - Todas essas respostas negativas fizeram errada interpretação e aplicação do disposto no art.º 18.°, n.os 6 e 7 do RIJ, com reflexos no exercício do seu direito fundamental de resposta e participação na formação de uma decisão que lhe dizia respeito - art.os 266.° e 267.°, n.os 1 e 2, da C.R.P. -, o que inquina irremediavelmente a decisão recorrida, ferindo-a de nulidade absoluta - art.º 133.°, n.º 2, alínea d), do C.P.A.

X - A decisão proferida assenta em erro nos pressupostos de facto, pelo que é anulável.

XI - Não obstante a resposta apresentada pela ora recorrente e a junção, nessa altura, de elementos estatísticos que permitiam contrariar completamente os dados avançados pelo Ex.mo Senhor Inspector, sobre os quais assentou a sua convicção, ou suprir aspectos por ele completamente omitidos, e tendo provado mesmo a alteração de dados relevantes, pode ver-se do processo inspectivo que a decisão do Conselho Permanente em nada deu razão à ora recorrente, mantendo - fazendo, aliás, autêntico "copy paste", diga-se em abono da verdade - ao nível da fundamentação da matéria de facto, na íntegra, não só a parte factual, como todas as suas conclusões, acompanhando nessa medida, as conclusões do Ex.mo Inspector, quando era já evidente que essas conclusões, e independentemente de outras críticas de que são passíveis, assentaram claramente em pressupostos de facto errados que, obviamente, as terão condicionado.

XII - Assim se compreende que na decisão ora recorrida se tenham "acrescentado" -finalmente - à matéria factual os factos I a IX absolutamente objectivos e incontestáveis, que por mera facilidade de exposição, se transcrevem: "IV - A Ex.ma Juíza não deixou quaisquer processos conclusos para a sua sucessora na comarca, com excepção de 6 que entregou, já posteriormente a 15/09/2004, despachados; V - A Exma. Juíza fez turno nas férias de Natal e nos últimos 5 dias de Agosto, sendo transferida para o Funchal (onde se deslocou em Agosto e em Setembro); VI - A entrada de processos cíveis no Tribunal duplicou em relação ao ano anterior (19 para 43; e, findas, 32 para 37); VII - E quase duplicou o número de entradas de providências cautelares (5 para 8; e findas, de 3 para 13); VIII - No ano anterior ao da presente inspecção foram elaborados na Comarca 5 Saneadores; IX - No período inspectivo a Exma. Juiz participou em: - três colectivos em Celorico da Beira (dois com uma sessão, um com quatro) e quatro adiamentos; - um colectivo em Fornos de Algodres e um julgamento em substituição da titular (várias sessões).

- 9 colectivos em Gouveia (5 com 2 sessões, 2 com 3, 1 com 4); - 2 singulares em Gouveia em substituição do titular; - 3 intervenções em colectivos na Boa-Hora - 2 intervenções em colectivo em Ílhavo; X - Com excepção de um, todos os recursos interpostos das decisões da Exma. Juíza, resultaram não providos; XII - Na acção sumária n.º 217/03.6TBCLB, o encerramento da discussão ocorreu a 18/11/2004, sendo marcada para 03/12/2004 a leitura da decisão de facto.

XIII - No período inspectivo entraram 125 recursos de contra-ordenação, findando 113 ( e no período anterior entraram 114, findando 73); XIV - A Exma. Juíza elaborou 25 Saneadores (no período anterior o seu antecessor elaborara 5)." XIII - Os factos ora aditados à decisão recorrida - que não vão obviamente postos em causa pela ora recorrente, por corresponderem à verdade, à excepção dos dias de turno em Agosto, que foram 15 e não 5 - estão em absoluta contradição com os factos que ficaram a constar do teor do relatório do Ex.mo Inspector, sendo-lhe claramente favoráveis, o que sempre deveria ter determinado uma nova análise da situação, mesmo por parte do Exmo. Inspector, ou na pior das hipótese, uma análise diferente por parte do órgão decisor que lhe atribuísse a classificação de Bom.

XIV - Desde logo, não será despiciendo afirmar - reiterando-se previamente aqui a justificação sempre aventada pela ora recorrente para as referências que se viu obrigada a fazer ao Ex.mo Colega que a precedeu - que o seu antecessor na Comarca de Celorico da Beira teve Bom, facto esse que, tendo sido motivo da sua reclamação, foi completamente omitido na decisão proferida, não obstante todas as demais referências ao seu antecessor (factos VI, VII, VIII, XIII e XIV).

XV - Uma vez que a decisão recorrida se permite transcrever, ao nível da fundamentação, grande parte das partes conclusivas do Acórdão do Permanente e diz que, atenta a mesma, a exposição do Ex.mo Inspector e os factos aditados, "poder concluir nos mesmos termos" do Permanente - para além de errada avaliação ou erro de julgamento - a mesma, ao fazer sua aquela passagem do Acórdão do Permanente, encerra de insanáveis contradições ao nível da fundamentação que devem ser reconduzidas, atenta a sua gravidade, à ausência de fundamentação, geradora de anulabilidade da decisão - cfr art.º 125.º, n.º 2, do C.P .A. -, por fazer concorrer para a fundamentação da decisão recorrida fundamentos ou argumentos absolutamente inconciliáveis. (A título exemplificativo: Diz-se no relatório inspectivo, no seu ponto 3, que a comarca tem movimento reduzido, após traçar o quadro do estado geral do tribunal, o que, aliás, volta mais à frente a ser vertido na douta decisão recorrida (a fls. 31), mas tal afirmação está em total contradição com os factos dados como provados sob os n.os II, III, VI, VII e XIII e tal fundamento é mesmo infirmado na própria decisão recorrida quando aí se diz que "Celorico não é das Comarcas com menos serviço considerando as de primeiro acesso". Outro exemplo: reconhece-se na fundamentação da decisão recorrida que a recorrente esforçou--se, e muito, por não deixar processos atrasados e conclusos e conseguiu-o; elaborou 25 saneadores e baixou mesmo as pendências; sendo justa e criteriosa a...

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