Acórdão nº 07S3783 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 20 de Fevereiro de 2008

Magistrado ResponsávelSOUSA GRANDÃO
Data da Resolução20 de Fevereiro de 2008
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça: 1 - Relatório 1.1 AA intentou, no Tribunal do Trabalho de Almada, acção declarativa de condenação, com processo comum, emergente de contrato individual de trabalho, contra "Papelaria BB, S.A." pedindo, com fundamento na inexistência de justa causa para o despedimento de que foi alvo por parte da Ré, que esta seja condenada a pagar-lhe os componentes ressarcitórios e retributivos descriminados e quantificados na petição inicial.

A Ré sustentou, no instrumento contestatório, a plena justificação da sanção aplicada e reclama, por isso, a sua absolvição do pedido.

1.2.

Instruída e discutida a causa, a 1ª instância julgou ilícita a medida sancionatória aplicada pela Ré e, em consequência disso, na procedência parcial da acção, condenou-a a pagar ao Autor: - a quantia de € 55.219,64, a título de indemnização em substituição da reintegração; - a quantia de € 26.623,75, a título de salários intercalares desde 17/9/05, a que acrescerão os que se vencerem até ao trânsito da sentença, a cujos montantes serão deduzidos aqueles que o Autor tiver recebido por virtude de subsídio de desemprego ou de vencimentos noutro emprego; - a quantia de € 5.000,50 por danos patrimoniais.

A Ré apelou da sentença, coligindo a sua nulidade, impugnando a decisão relativa à matéria de facto e questionando o juízo alcançado sobre a ilicitude do despedimento: porém, fê-lo sem êxito, visto que o Tribunal da Relação de Lisboa confirmou a decisão em crise, ainda que tivesse alterado parcialmente a factualidade fixada pela 1ª instância.

1.3.

Continuando irresignada, a Ré pede a presente revista, onde convoca o seguinte núcleo conclusivo: 1- ao alterar a matéria de facto com base na qual foi decretada uma condenação por danos morais, suprimindo os respectivos fundamentos, impunha-se que o Tribunal da Relação alterasse em conformidade aquela condenação, revogando-a, ainda que tal revogação não estivesse expressa nas conclusões da apelação; 2- na verdade, ao impugnar a ilicitude do despedimento, todas as consequências dessa ilicitude são postas em causa, independentemente de serem expressamente referidas nas conclusões; 3- acresce que, tratando-se de uma condenação baseada na equidade, sempre seria lícita a sua correcção nesta sede; 4- tendo a Relação corrigido a decisão sobre a matéria de facto, retirando qualquer nexo de causalidade no ponto 22 e desconsiderando, em absoluto, a afirmação do M.mo Juiz, no que respeita à violação de regras de igualdade e dignidade da pessoa humana, no exercício do poder disciplinar, há manifesta falta de fundamentação para uma condenação no pagamento de uma indemnização por danos morais, por violação de direitos de personalidade, a qual deve ser revogada; 5- O A., ao declarar, em sede de processo disciplinar, ter dado conhecimento prévio ao seu superior hierárquico de que iria a Tribunal, quando ficou provado que havia declarado que de tarde não iria estar presente na empresa - facto bem diferente e normal na actividade de um comercial - e que, nessa tarde havia telefonado do exterior para o seu superior hierárquico, actividade normal para quem está de serviço, mas anormal para quem está de férias, não apenas faltou à verdade que lhe era exigível, como adoptou um comportamento dissimulatório das suas atitudes; 6- o A., ao declarar, em sede de processo disciplinar, que costumava participar posteriormente as férias de um dia, quando ficou provado que a regra era a da prévia autorização pelo superior hierárquico, faltou à verdade que lhe era exigível; 7-o A., ao declarar, no processo disciplinar, que a Dr.ª CC tinha feito afirmações determinadas, designadamente que esta lhe dizia que apenas tinha de efectuar a comunicação da marcação de férias até ao dia 9 do mês seguinte, o que ficou demonstrado ser rotundamente falso, faltou à verdade que lhe era exigível e tentou responsabilizar colegas seus por comportamentos que só a si eram imputáveis; 8- a Relação não pode desvalorizar a falta de verdade das afirmações do A., considerando "que as mesmas revelam um conhecimento desajustado sobre os procedimentos internos em vigor na Ré" e que as regras, por vezes, compreendem excepções, pois não ficou demonstrada a existência de qualquer excepção; 9- estando provado que o A. tinha telefonado para o seu superior hierárquico na tarde de 29/11, durante o período normal de serviço, e tendo o A. declarado, no processo disciplinar (declarações de 12/1), que esse telefonema se destinava a informá-lo da desmarcação de uma reunião com a Repsol, coincidindo, igualmente, com o facto de a marcação de 1 dia de férias apenas ter sido feita "a posteriori", e admitindo a Relação que o A. teria querido evitar questões do seu superior hierárquico sobre o local onde se dirigiria da parte da tarde, é legítimo concluir pela intenção de ocultação do superior hierárquico do local onde estaria nessa tarde; 10- a eventual confusão, ou conhecimento desajustado, sobre os procedimentos internos da R., por parte do A., não pode ser considerada uma causa adequada que o leve a pôr na boca de outras pessoas, a sua colega Dr.ª CC, afirmações recorrentes falsas; 11- essa eventual confusão ou conhecimento desajustado é contrariada pelas comunicações anteriores do A., que se encontram juntas ao processo disciplinar e não foram impugnadas e que demonstram que o mesmo tinha actuado correctamente aquando de outras marcações; 12- quando o A. falta à verdade, é a si e não à R. que compete demonstrar que existe alguma razão para o fazer, pelo que, nada demonstrando, não se pode aceitar a existência de razões justificativas para tal; 13- a imputação de falsidades à funcionária da direcção de pessoal, consistentes, em si mesmo, em violações das regras da empresa, é objectivamente ofensiva da consideração - profissional e pessoal - daquela a quem as afirmações são imputadas e traduz-se numa enorme falta de respeito e lealdade para com esta; 14- os deveres de lealdade e respeito são tanto mais exigentes quanto maior a antiguidade e mais alta a posição hierárquica do trabalhador; 15- o comércio jurídico exige que a palavra de um vendedor não possa ser, alguma vez, posta em dúvida pela entidade patronal, pois que são verdadeiros embaixadores da empresa perante os clientes, sendo-lhes muito fácil entrar em conluio com estes, com manifesto prejuízo da sua entidade patronal, e gozando da particular autonomia de quem tem a rua como local de trabalho; 16- a exigência de verdade e confiança, que qualquer empregador deve ter relativamente aos seus trabalhadores, é ainda maior para com os que exercem funções de autonomia, como o A., e cargos de chefia, como o de chefe de vendas, pelo que é muito grave, e afecta a confiança mútua, a falta do A. à verdade, quando confrontado com um determinado comportamento com relevância disciplinar; 17- o A. faltou ao seu dever de lealdade, seja para com a empresa, seja para os colegas, quando atirou para cima de outros o fardo da responsabilidade dos actos por si praticados; 18- com a afirmação do A., relativamente às informações por si prestados, a Dr.ª CC ficou sujeita, ela própria, a um processo disciplinar, pois se fosse tomada como certa a mentira que lhe foi assacada pelo A., era a Dr.ª CC quem estava a desobedecer à sua entidade patronal; 19- estando provado que o A. sabia que devia solicitar a autorização de férias ao director comercial, o envio para outrem, que não o superior hierárquico, de um pedido de marcação de férias, que ainda por cima é extemporâneo, tem como único significado razoável...

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