Acórdão nº 06P662 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 20 de Dezembro de 2007

Magistrado ResponsávelSOUTO DE MOURA
Data da Resolução20 de Dezembro de 2007
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Em processo comum, o Tribunal Colectivo da Vara Mista de Coimbra, reformulando a decisão anteriormente proferida, em obediência ao Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 26-01-2005, condenou AA, pela prática de um crime de tráfico de estupefacientes p. e p. pelo art. 21.º, n.º 1, do DL 15/93, de 22-01, na pena de 4 anos e 3 meses de prisão.

De tal decisão interpôs o arguido recurso para o Tribunal da Relação de Coimbra, o qual, por acórdão de 07-12-2005, o rejeitou por manifestamente improcedente. É desta decisão que agora foi interposto recurso para o presente S.T.J..

A - DECISÃO DA PRIMEIRA INSTÃNCIA 1 - MATÉRIA DE FACTO No acórdão da Vara Mista de Coimbra de 29/8/2005, que procedeu à reformulação da decisão antes proferida em 1ª instância, apenas em relação ao arguido AA, foram considerados os seguintes a) Factos provados (transcrição): "O arguido BB, desde há cerca de quatro anos que se dedica à venda de produtos estupefacientes, designadamente de ecstasy.

Fá-lo em Lisboa e noutras zonas do país (como Coimbra), mediante contactos que estabelece com consumidores e revendedores.

Tendo nacionalidade holandesa e família a residir na Holanda, com facilidade se desloca a esse país.

Essas deslocações destinam-se a visitar a família e a adquirir ecstasy.

Este produto que traz da Holanda - sendo que de cada vez se abastece de quantia não inferior a 2500 comprimidos -, destina-o o arguido BB à revenda, em Portugal.

Em média adquire cada comprimido por 1 euro e revende-o a 2,5 euros, embolsando o respectivo diferencial pecuniário.

Na verdade, o arguido BB comercializa o referido produto estupefaciente com o intuito de obtenção de lucros que lhe permitam um nível de vida superior ao que conseguiria apenas com os proventos do seu trabalho de carpinteiro, que são parcos.

Aliás, só assim, ou seja, com os dividendos dessa actividade de Comercialização de ecstasy, o arguido BB conseguiu, no período de Outubro de 1998 a Maio de 2002, depositar nas suas contas bancárias a quantia total de 114.489,70 euros.

No dia 21-06-02, na Doca do Jardim do Tabaco, em Lisboa, foi encontrado na posse do arguido BB um saco de plástico contendo comprimidos côr-de-rosa, que denotavam ser ecstasy.

No dia 22/6/02 foram encontrados na residência do arguido BB, em Caxias, 9 pequenos sacos de plástico - três dentro do frigorífico e seis num arrumo do sótão - contendo comprimidos côr-de-rosa com as mesmas características daqueles.

Nesse mesmo dia, num armazém situado no Parque Empresarial da Abrunheira, em Sintra local de trabalho do arguido BB, foram também encontrados três pequenos sacos de plástico contendo idênticos comprimidos, que àquele pertenciam.

Os referidos comprimidos, num total 2016, foram devidamente examinados no Laboratório de Polícia Científica, confirmando-se a suspeita de serem o que vulgarmente se denomina por ecstasy, pois concluiu-se tratar-se de MDMA, substância incluída na Tabela II-A anexa ao DL nº 15/93 de 22-01.

O arguido BB conhecia perfeitamente as características dos comprimidos que tinha na sua posse, bem como a ilegalidade desta, sabendo também que não os podia comercializar, nomeadamente com a ambicionada finalidade de obtenção de lucros.

O arguido BB vende ecstasy a diversos indivíduos, entre eles o arguido AA, a quem vende há cerca de quatro anos.

As transacções efectuadas entre ambos - nunca menos de oito por ano ocorriam em Lisboa ou em Adémia - Coimbra.

De cada vez, o arguido AA adquiria ao BB, por regra, cerca de 1000 comprimidos, podendo acontecer, esporadicamente, adquirir-lhe apenas cerca de 500.

Aliás, no dia 20-06-02, por volta das 12.00 horas, o BB, que para tanto se deslocou desde Lisboa, encontrou-se com o AA na localidade de Adémia - Coimbra, em frente à loja de materiais de construção "Macobego", para onde AA se havia deslocado, desde o seu local de trabalho em Taveiro e ao volante do seu veículo automóvel "Audi-A4", de matrícula ..-..-...

O AA ali estacionou o "Audi" e aguardou pela chegada do BB.

Uma vez no local, este então dirigiu-se ao veículo do AA, nele entrou e permaneceu cerca de dois ou três minutos, tempo suficiente para entregar ao arguido AA, à consignação, um saco de plástico contendo no seu interior dez pequenos sacos de plástico transparente com vários comprimidos côr-de-rosa cada, ou seja, comprimidos de ecstasy.

Após análise laboratorial, concluiu-se que se trata efectivamente de 1001 comprimidos contendo MDMA, substância integrante da Tabela II-A anexa ao DL nº 15/93 de 22-01.

O arguido BB entregava o aludido produto estupefaciente ao arguido AA à consignação, pagando-lhe este depois, quer através de entregas directas de dinheiro, quer por depósitos em conta bancária do BB.

O AA comprava ao BB cada comprimido a 2,5 euros e revendia-os, cada, a quantia que variava entre 3,5 e 5 euros, arrecadando o respectivo lucro.

Efectivamente, o arguido AA, com o intuito de obtenção de lucros que colmatassem o rendimento da sua actividade profissional, para além dos seus desempenhos remunerados, nos tempos livres, como disc-jockey, transaccionava produtos estupefacientes, como ecstasy, haxixe e cocaína.

Fazia-o ciente das características desses produtos e de que não os podia transaccionar com a pretendida obtenção de lucros.

Naquele dia 20-06-02, foram encontrados na residência do arguido AA, sita em Coimbra, concretamente no interior de um roupeiro existente no quarto de dormir do mesmo, 50 comprimidos que também se confirmou laboratorialmente conterem a aludida substância MDMA e que aquele destinava à venda.

Igualmente foi encontrada no mesmo local uma balança de precisão, utilizada pelo arguido AA para pesar e fazer doses de outro tipo de produto estupefaciente, designadamente cocaína.

Os mencionados lucros, depositava-os o AA em instituições de crédito a operar no mercado nacional, como aconteceu com os depósitos efectuados no período de Abril de 1998 a Maio de 2002, no montante total de 129.443,78 euros.

Conforme mencionado, os comprimidos de ecstasy adquiria-os ao arguido BB.

Naquela sua actividade de disc-jockey, em discotecas e festas várias, tinha o arguido AA um ambiente propício à comercialização do ecstasy, produto estupefaciente sobretudo procurado por indivíduos jovens e frequentadores dos locais e eventos referidos.

O arguido AA vendia, pois, ecstasy aos consumidores que nesses locais lho solicitavam, Mas transaccionava produtos estupefacientes também noutros locais, entre eles a sua própria residência e também no Monte Formoso (junto à pastelaria "Panorama") - Coimbra, bem como em Aveiro.

Em datas não concretamente apuradas e pelo menos durante o ano de 2002, o arguido - AA vendeu, quer em Aveiro, quer no Monte Formoso, em Coimbra, quer na sua própria residência, ao arguido CC, quantidades indeterminadas de haxixe.

Vendia-lhe, cada "sabonete" por 250 euros.

O arguido AA durante vários anos também vendeu comprimidos de ecstasy - entre 20 a 40 por semana - ao arguido DD, obtendo o correspondente lucro.

Essas transacções aconteciam na residência do arguido AA e, por vezes, junto à Casa da Cultura, em Coimbra.

O DD chegou a pagar-lhe 6,5 euros por cada comprimido, sendo que ultimamente os pagava a 5 euros cada.

O arguido AA, também na sua residência e em ocasiões não concretamente apuradas, vendeu a consumidores vários, que para tanto ali o procuravam, para além dos comprimidos de ecstasy, doses várias de haxixe e cocaína (preparando estas com o auxílio da aludida balança de precisão).

Também com estas transacções embolsou um diferencial pecuniário que não foi possível concretizar.

Em situações que não foi possível definir, também o arguido AA vendeu comprimidos de ecstasy ao arguido EE, igualmente arrecadando os respectivos benefícios pecuniários.

O arguido AA abastecia-se de haxixe junto de vários indivíduos, conhecendo as características desse produto - integrável na Tabela I-C anexa ao DL nº 15/93 de 22-01 - e sabendo que o mesmo não podia ser Comercializado para obtenção de lucros.

O arguido AA abastecia-se de cocaína - e esporadicamente de haxixe junto de, entre outros, o arguido EE.

Na verdade, desde há alguns anos que o arguido EE vem dedicando, com o intuito de obtenção de lucros, à comercialização de produtos estupefacientes, sobretudo de cocaína - substância integrada na Tabela I-B anexa ao DL nº 15/93 de 22-01.

Para tanto, o arguido EE comprava, a fornecedores não conhecidos, cocaína a cerca de 42,50 euros por grama, vendendo-a a um preço que oscilava entre 50 e 80 euros cada grama, também denominada por "convite".

Atentos estes valores, o arguido EE locupletava-se com os correspondentes lucros.

Nessa sua actividade o arguido fazia-se transportar no veículo automóvel "Audi-A4", de matrícula ..-..-.., As transacções eram efectuadas em locais diversos, mas sobretudo na sua residência (ou próximo dela), sita em Moinhos da Funcheira - Amadora, onde era procurado por inúmeros consumidores.

Nessa residência, no dia 14-10-02 foi encontrado, pertença do arguido EE, além do mais: três sacos de plástico com vários recortes em forma de círculo (para acondicionamento de produto estupefaciente), 4,632 gr de canabis (resina), 1,646 gr de canabis (folhas e sumidades) - substâncias Constantes da Tabela I-B anexa ao DLº 15/93 -, um cofre contendo um rolo de película aderente, 28 comprimidos de ecstasy - contendo, portanto, MDMA, Substância referida na Tabela II-A anexa ao DL nº 15/93-, uma colher em alumínio impregnada de um pó branco que se apurou ser cocaína, uma embalagem de soro denominado "seueroral iposódico" (vulgarmente utilizado Como substância de corte da cocaína), uma navalha (tipo borboleta), uma balança de precisão e 12,647 gr de cocaína (cloridrato) - substância integrada na Tabela I-B anexa ao DL 15/93.

Por inúmeras vezes o arguido EE vendeu cocaína ao arguido AA, o que desde há cerca de um ano ocorria de 15 em 15 dias, sobretudo o arguido AA se deslocava à zona de Lisboa.

Chegou a vender-lhe, numa dessas ocasiões, 20 gramas de cocaína por cerca de 700...

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