Acórdão nº 07S2360 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 07 de Novembro de 2007

Magistrado ResponsávelSOUSA GRANDÃO
Data da Resolução07 de Novembro de 2007
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça: 1. RELATÓRIO 1.1.

"AA" intentou, no Tribunal do Trabalho de Almada, acção declarativa de condenação, com processo comum, emergente de contrato individual de trabalho, contra "Empresa-A, S.A.", pedindo o seu reconhecimento como trabalhador subordinado da Ré desde Outubro de 1998 e que seja afirmada a ilicitude do despedimento de que foi alvo, condenando-se a Ré, por via disso, a reintegrá-lo e a pagar-lhe a quantia global de € 32.556,36, acrescida das retribuições vincendas, até efectiva reintegração, e dos correspondentes juros moratórios.

Alega, em síntese, que é trabalhador efectivo da Ré desde Setembro de 1998, não obstante ter sido por ela obrigado a subscrever um contrato de trabalho a termo em Maio de 2003, tendo sido despedido em Outubro seguinte, na sequência de um processo disciplinar em que se lhe imputam factos que, para além de falsos, não têm a virtualidade de justificar aquela medida sancionatória.

Mais aduz que, entre a sua admissão na empresa e a celebração do referido contrato a termo, a Ré não lhe pagou as prestações remuneratórias que identifica no petitório.

A Ré contrapõe a plena validade do vínculo aprazado em Maio de 2003 - pois vigorou entre as partes, até então, um contrato de prestação de serviços, que não previa o pagamento das prestações ora reclamadas - sendo que o decretado despedimento se ajusta à conduta infraccional do Autor - faltas injustificadas e violação do dever de respeito para com os seus superiores hierárquicos.

1.2.

Instruída e discutida a causa, veio a 1ª instância a concluir: - que o Autor é trabalhador da Ré desde 1 de Setembro de 1998, sendo-lhe devidos os créditos laborais que descrimina; - que o seu despedimento tem plena justificação legal, atenta a gravidade da violação dos deveres de assiduidade e de obediência em que incorreu.

Ambas as partes apelaram da sentença, fazendo-o o Autor subordinadamente, tendo o Tribunal da Relação de Lisboa julgado improcedente o recurso da Ré e parcialmente procedente o do Autor, em consequência do que: - alterou parcialmente a decisão factual; - qualificou de ilícito o despedimento do Autor; - condenou a Ré a reintegrá-lo nos seus quadros e a pagar-lhe as prestações retributivas discriminadas no segmento decisório do Acórdão; - confirmou a sentença no mais.

1.3.

Continuando irresignada, a Ré pede a presente revista, cujas alegações remata com o seguinte núcleo conclusivo: 1- a recorrente não se conforma com a parte da decisão que julgou ilícito o despedimento do Autor e condenou a Ré na reintegração do mesmo e no pagamento de retribuições desde 8/9/04 até trânsito em julgado, incluindo férias, subsídios de férias e de Natal, com dedução dos rendimentos de trabalho auferidos por ele em actividade iniciada após o despedimento, a apurar em execução de sentença, com acréscimo de juros de mora e custas; 2- entende a recorrente que houve violação, por erro de interpretação e aplicação, do art.º 9º n.ºs 1 e 2 do D.L. n.º 64-A/89, de 27/2; 3- ficou provado que a entidade patronal, ora recorrente, autorizou o gozo de 4 dias de férias, de 28 e 29 de Agosto e de 1 e 2 de Setembro de 2003; que o trabalhador quis gozar férias em período subsequente - o que a entidade patronal não autorizou; que o Autor, contra as instruções recebidas, decidiu fazer valer aquele que entendia ser o seu direito, prolongando as suas férias até ao dia 10 de Setembro de 2003; pelo que o Autor se ausentou, no período de 3 a 10 daquele mês sem estar expressamente autorizado a fazê-lo e contra as instruções que, para tanto, lhe foram dadas pela hierarquia da empresa; 4- a lei, em caso algum, atribui ao trabalhador o direito de marcar o período de férias, direito que pertence à entidade patronal, embora condicionado no seu exercício, tendo a marcação que respeitar o período entre 1 de Maio e 31 de Outubro (cfr. D.L. n.º 874/76, de 28/12, max. art. 8º). Se o plano de férias não respeitar o direito do trabalhador, este pode lançar mão dos meios que a lei faculta para assegurar o direito que lhe assiste (art. 8º, citado supra). Está também provado que o "autor não alegou nem provou que não pôde recorrer em tempo útil aos meios coercivos normais para evitar a inutilização prática do seu direito a gozar o período de férias a que tinha direito", pelo que a causa de justificação, eventualmente considerada admissível - recurso à acção directa - não funciona; 5- assim, o Autor cometeu a infracção disciplinar prevista no art.º 9º n.º 2 al. G) do D.L. n.º 64-A/89, faltando sem justificação por 6 dias seguidos, assumindo um comportamento culposo que, pela gravidade e consequências, tornou impossível a subsistência da relação de trabalho, integrando justa causa de despedimento (cfr. idem e n.º 1 art. citado); 6- além disso, o Autor sabia, pelo menos desde Maio de 2003, que havia na empresa vários horários; desde Junho de 2003, o Autor deu e acumulou muitíssimas horas de atraso, além de, em muitos dias, nem sequer ter procedido ao registo de entradas e saídas da empresa; e, como também está provado, o Autor várias vezes não respeitou o controlo das entradas e saídas através do cartão magnético que, para o efeito, lhe estava entregue, sendo que em Agosto de 2003 deu um total de 21 horas de atraso; 7- estes comportamentos também constituem infracções graves e culposas mas, ainda que se entenda que cada uma, de per si, não constitui infracção, ainda assim terá, pelo menos, de se considerar que tais atitudes e comportamentos ocorreram e que, em consequência da sua própria existência, têm necessariamente de relevar para o apuramento do comportamento culposo do trabalhador, tornando impossível, de imediato, a subsistência da relação de trabalho; 8- sobretudo quando, como é o caso, está provado que existe a sobredita justa causa de despedimento; 9- o corpo do n.º 2 e da sua al. G do citado art.º 9º prescrevem que constitui justa causa de despedimento o comportamento do trabalhador que incorre em faltas não justificadas, quando o número de faltas atinja, em cada ano, 5 seguidas ou 10 interpoladas: é o caso; 10- por outro lado, discorda-se do Acórdão quando ali se refere que a mera verificação objectiva de faltas, no número e condicionalismo acima referidos, não chega para justificar o despedimento; mas, discorde-se ou não desse entendimento, sempre haverá que interpretar e aplicar o regime daquele art.º 9º à luz do critério geral fixado no seu n.º 1, por forma a saber se dos comportamentos do trabalhador resulta a impossibilidade prática da subsistência da relação de trabalho - ou seja se, como pretende o Acórdão, para representarem justa causa de despedimento, as faltas injustificadas têm de surgir como reflexo de manifesto desinteresse pelo dever de assiduidade, revelando um comportamento culposo; 11- à luz do entendimento do bónus pater famílias, reúnem-se, no caso, todos os requisitos: infracção imputável apenas ao trabalhador; comportamento grave e culposo, impeditivo, como sua consequência directa e necessária, da manutenção da relação de trabalho; 12- a correcta interpretação do art.º 9º n.ºs 1 e 2 conduz à licitude do despedimento do Autor, sob pena de se cair no absurdo de não ser permitida a aplicação do próprio regime que determina a justa causa do despedimento; 13- de facto, o conceito de justa causa consta do referido n.º 1, prevendo-se no n.º 2, em enumeração exemplificativa, quais os comportamentos do trabalhador que integram aquele conceito; 14- ora, as faltas injustificadas do Autor, em Setembro de 2003, constituem um dos comportamentos, exemplificativamente enumerados no citado preceito como integrantes de justa causa de despedimento; 15- acresce que, se ao cometimento de tal infracção, for entendido ser necessário ponderar ainda outras realidades para se aferir da licitude do despedimento, há que ponderar as realidades que os autos também contêm - mesmo quando esses comportamentos ainda que culposos e até dolosos, não mereçam a qualificação de infracção de per si; 16- a sanção aplicada ao Autor foi proporcionada, atendendo à gravidade da infracção e ao grau de culpa e à impossibilidade de manutenção da relação de trabalho, razão por que o despedimento foi lícito, como bem decidiu a 1ª instância, cuja sentença deve ser confirmada.

1.4.

O Autor contra-alegou, sustentando a improcedência do recurso.

1.5.

No mesmo sentido se pronunciou a Ex.ma Procuradora-Geral Adjunta, cujo douto Parecer não foi objecto de resposta.

1.6.

Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.

2- FACTOS 2.1.

A 1ª instância fixou a seguinte factualidade: 1- o A. iniciou a prestação da sua actividades para a R. em Setembro de 1998; 2- o A. exercia, ultimamente, as funções profissionais de escriturário; 3- auferindo a remuneração mensal base de € 749,50, acrescida de subsídio diário de alimentação no...

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