Acórdão nº 07S1933 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 26 de Setembro de 2007

Magistrado ResponsávelSOUSA GRANDÃO
Data da Resolução26 de Setembro de 2007
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça: 1- RELATÓRIO 1.1.

"AA" intentou, no Tribunal do Trabalho de Setúbal, acção declarativa de condenação, com processo comum, contra "Empresa-A, Ld.ª", pedindo se reconheça que entre as partes existia um contrato de trabalho sem termo e, por via disso, se considere ilícito o seu despedimento e se condene a Ré a reintegrar a Autora no seu posto de trabalho, bem como a pagar-lhe, com juros moratórios, as retribuições discriminadas na P.I., e ainda uma indemnização por antiguidade, caso a demandante venha por ela a optar, em detrimento da sua reintegração nos quadros da empresa.

Alega, para o efeito e em síntese, a nulidade, por inveracidade do motivo invocado, da estipulação do termo aposto no contrato a termo incerto, aprazado entre as partes em 19 de Março de 2001.

Na sua contestação, a Ré contraria a tese da Autora, afirmando a veracidade do motivo justificativo da contratação precária em análise e, consequentemente, a licitude da operação cessação do vínculo laboral.

1.2.

Instruída e discutida a causa, veio a 1ª instância a concluir pela improcedência integral da acção, sufragando por inteiro a tese da Ré.

Sob apelação da Autora, o Tribunal da Relação de Évora revogou a sentença da 1ª instância e conferiu integral ganho de causa à demandante, ainda que um dos Ex.mos Adjuntos tivesse lavrado declaração de sinal contrário.

Nesse sentido, entendeu-se maioritariamente que as funções efectivamente exercidas pela Autora não tiveram a menor correspondência com o motivo justificativo da sua contratação precária.

1.3.

Irresignada com tal decisão, a Ré pede a presente revista, onde convoca o seguinte núcleo conclusivo: 1- nos termos dos arts. 42º n.º 1 al. A) e 48º do D.L. n.º 64-A/89, é lícita a contratação de trabalhador, ao abrigo de contrato de trabalho a termo incerto, para substituição temporária de trabalhador impedido de prestar serviço; 2- a lei não exige que a substituição opere desde o início do impedimento do trabalhador, cabendo ao empregador decidir sobre o momento da mesma, com base na conveniência (tendo em conta, designadamente, o previsível regresso do trabalhador a curto prazo ou o prolongamento da incapacidade) e necessidade; 3- o regime legal do contrato a termo (enquanto destinado à satisfação de necessidades temporárias de trabalho), não pode ser encarado como algo de anómalo e contrário ao princípio constitucional da segurança no emprego, mas antes, ou também, como veículo de promoção do emprego e de respeito pelo princípio constitucional da liberdade económica e de organização empresarial; 4- em 19/3/01 existia uma necessidade de trabalho correspondente à posição de trabalho de operador de produção, que era a posição ocupada pela trabalhadora BB antes do impedimento; 5- nessa data, a A. já havia cessado a sua relação profissional com a R., por força da cessação do contrato de utilização de trabalho temporário cuja validade e legitimidade não foram questionadas. Não havia, pois, impedimento legal a que a R. celebrasse com ela contrato a termo, sendo certo, por outro lado, que também não era obrigada a contratá-la; 6- como decorre da matéria de facto, a R. pretendeu, ao contratar a A., substituir a trabalhadora BB; 7- por isso, o contrato em causa, a termo incerto, é legítimo e formalmente válido; 8- segundo o Acórdão recorrido, não houve real substituição, quer porque durante o período de tempo em que se manteve ao serviço da R. nunca a A. exerceu funções na área de trabalho em que estava colocada a BB à data do início do impedimento, quer porque não está demonstrada nos autos a proximidade de funções de uma e outra trabalhadora; 9- para que possa haver substituição, não é forçoso que o trabalhador substituto seja colocado na mesma área organizacional em que o trabalhador substituído exercia a sua actividade antes do início do impedimento; 10- por via da organização existente na R., os operadores de produção têm todos o mesmo núcleo funcional e as tarefas exercidas são similares, qualquer que seja a área de trabalho ou linha de produção em que sejam colocados em dado momento. Assim, podem ser colocados em qualquer área ou linha de acordo com as necessidades de trabalho em cada momento, sendo frequente, por isso, a rotação de trabalhadores dentro da mesma área ou entre áreas; 11- não existem, assim, postos de trabalho ou áreas fixas, mas antes posições de trabalho rotativas de operador de produção, sendo a divisão por áreas apenas para efeitos contabilísticos e financeiros; 12- se a BB tivesse regressado ao serviço em 19/3/01, podia ser colocada na área de Módulos, onde foi colocada a A., pois não detinha, como se provou, qualquer posto de trabalho fixo; 13- dada a concreta organização da R., ditada por razões ergonómicas, a substituição não pode ser aferida, como entendeu o Acórdão, tendo em conta a posição e área de trabalho que a BB ocupava à data do início da ausência - aliás, largos meses antes, como se refere no Acórdão - mas sim o que ocuparia ou poderia ocupar se houvesse regressado ao serviço em 19/3/01, sendo de salientar que a própria A., na vigência do contrato, mudou de turno de trabalho; 14- a vingar a tese do Acórdão, dada a sua concreta organização, a R. só poderia substituir os operadores de produção ausentes se o fizesse na própria data do início da ausência, na mesma posição de trabalho, uma vez que no dia seguinte, ou algum tempo depois, eles poderiam já não estar na mesma posição de trabalho se se tivessem mantido ao serviço. Semelhante interpretação e aplicação da lei seria ostensivamente contrária à sua letra e ao seu espírito; 15- foram violados os arts. 41º n.º 1 al. A) e n.º 2, 42º n.º 3 e 48º do D.L. n.º 64-A/89, de 27 de Fevereiro, bem como o art.º 389º n.ºs 1 e 4 do Código de Trabalho.

1.4.

A Autora contra-alegou, sustentando a confirmação do julgado, no que é acompanhada, sem resposta da recorrente, pela Ex.ma Procuradora-Geral Adjunta.

1.5.

Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.

2- FACTOS As instâncias fixaram a seguinte factualidade: Factos constantes da matéria de facto assente: A. Autora e Ré celebraram, em 19 de Março de 2001, o acordo escrito cuja cópia consta dos autos como documento n.º 1 apresentado com a petição inicial, intitulado "Contrato de Trabalho a Termo Incerto", cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido e onde se pode ler, quanto às funções a desempenhar pela Autora, o seguinte: "As funções a desempenhar consistirão essencialmente, mas não exclusivamente, em manufacturar componentes e subgrupos, inserção manual, carregamento e descarregamento de materiais aos produtos em processo, trabalhos de soldadura, armazenagem, movimento e contagem de materiais, operação de equipamentos electrónicos ou electromecânicos, pequenas reparações, inspecções pré-estabelecidas no produtos ou materiais, ajustes e calibrações elementares, cálculos matemáticos elementares, colheita de dados, preparação de relatórios escritos pré-estabelecidos, manutenção da continuidade da produção ou da sua interrupção sempre que for necessário parta manter a qualidade do produto, limpeza da área de trabalho, limpeza e lubrificação do equipamento e outras que, dentro do mesmo género, venham a ser indicadas pela Empresa-A, LTD" ..

  1. Por aquele escrito se convencionou que a Autora era admitida ao serviço da Ré em 19/03/2001, mediante contrato de trabalho a termo incerto, com a categoria profissional de Operadora - PE 1º Escalão, auferindo mensalmente a retribuição base de 100.840$00.

  2. A Autora exercia a actividade profissional para que foi contratada, sujeita a ordens, instruções e fiscalização da Ré, auferindo em contrapartida, uma retribuição.

  3. Ultimamente, a Autora estava classificada com a categoria de Operadora Especializada OF 2 e auferia mensalmente de remuneração base a quantia de Euros 635,30 acrescido de Subsídio de Trabalho Nocturno no valor de 1,84 Euros por cada hora de trabalho nocturno prestada.

  4. A Ré dedica-se à actividade de Fabrico e Montagem de Material Eléctrico e Electrónico.

  5. A Autora foi admitida para desempenhar a sua actividade durante 8 horas diárias e 40h semanais, de 2ª a 6ª feira, com intervalo de 30 minutos, tendo sido integrada pela R. no 3º turno, cumprindo um horário das 0h00 às 8h30, horário que cumpriu até Maio de 2002, mês em que a A. passou a integrar o 2º turno, cumprindo um horário com entrada 16h30 e saída às 0h30.

  6. Em 16 de Julho de 2004, a Ré comunicou à Autora, por carta que lhe entregou em mão, a cessação por caducidade, do contrato de trabalho a termo incerto entre ambas celebrado em 19/03/2001 em virtude de terem tomado conhecimento que a trabalhadora BB, que se encontrava ausente por motivo de Baixa, ter rescindido o seu contrato de trabalho na data de 16 de Julho de 2004, tudo nos termos do doc. n.º 3 apresentado com a petição inicial, cujo teor se dá aqui para todos os efeitos como inteiramente reproduzido.

  7. A Ré comunicou ainda à Autora que aquele seria o seu último...

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