Acórdão nº 96S262 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 04 de Junho de 1997

Magistrado ResponsávelLOUREIRO PIPA
Data da Resolução04 de Junho de 1997
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam, em conferência, na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça: A demandou a Companhia de Seguros B, S.A. em acção com processo ordinário de contrato de trabalho alegando, em síntese, que trabalha por conta da Ré, mediante contrato de trabalho, desde 1979 exercendo funções de médico especialista. Está abrangido pelo A.C.T. celebrado entre a Associação Portuguesa de Seguradores e a Fensiq - Federação Nacional de Sindicatos de Quadros (B.T.E. - 1. série, n. 5 de 8 de Fevereiro de 1986), correspondendo à sua categoria profissional a letra H da tabela remuneratória. Porém a partir de 1986, tem-lhe sido pago um vencimento mensal muito inferior ao que lhe é devido por força do referido A.C.T. e suas actualizações. Reclamou, por isso, desde Janeiro de 1986 a Outubro, inclusive, de 1993 a quantia de 15036541 escudos a título de diferenças salariais, nela se incluindo ordenados mensais, prémios de antiguidade e subsídios de férias e de Natal. Pede, igualmente, juros de mora pelas diferenças salariais respeitantes aos anos de 1979 (Julho) a Dezembro de 1985, diferenças que lhe foram reconhecidas judicialmente no âmbito do processo 177/87, por decisão transitada em julgado. Tais juros ascendem à quantia de 796832 escudos, à qual acrescerá, a título de juros diferenças salariais devidas entre 1986 e 1993, a quantia de 7887193 escudos. Reclama, finalmente, que seja reconhecido como trabalhador a "tempo normal" e não a tempo parcial" - como a Ré tem feito constar dos recibos a partir de finais de 1991 - independentemente do horário praticado nas instalações da Ré. Contestou a Ré no sentido de que o Autor cumpria um horário a tempo parcial de 4 horas semanais distribuídas por dois dias da semana, tendo-lhe sido paga a retribuição correspondente a tal período de serviço e sendo certo que as tabelas constantes do A.C.T. foram fixadas em função de horários de trabalho a tempo completo. O Autor respondeu à contestação por, em seu entender, ela conter matéria de excepção. Foi proferido o despacho saneador e elaborados a especificação e o questionário, dos quais a Ré reclamou com êxito parcial, como se vê do despacho de folha 186. Efectuado o julgamento a acção foi julgada parcialmente procedente, tendo a Ré sido condenada no pagamento de diferenças salariais desde 1 de Agosto de 1987 a Novembro de 1993, nos termos a liquidar em execução de sentença, bem como nos respectivos juros a partir da citação. A Ré foi absolvida do demais pedido. Ambas as partes recorreram, tendo sido julgado procedente o recurso da Ré e improcedente o do Autor. De novo inconformado pediu o Autor a presente Revista, na qual formulou as seguintes conclusões. DO HORÁRIO DO RECORRENTE 1) As cláusulas 8. e 9. do A.C.T. Fensiq vêm definir de forma clara "horário normal de trabalho" e "período normal de trabalho", estabelecendo na parte final da 8. e no n. 3 da 9. um regime excepcional aplicável aos médicos subtraindo-os, assim, à aplicabilidade das regras gerais contidas naquelas cláusulas; 2) Esse regime excepcional resulta da especificidade própria da actividade médica e da responsabilidade e diversidade da natureza das tarefas que a integram como tão bem é explicado no n. 1 da cláusula 4. do Anexo II desse A.C.T.; 3) Ou seja, atendendo a essa excepcionalidade da actividade médica, a lei permite nos termos da já mencionada cláusula 4. que o período normal de trabalho e a duração do trabalho semanal sejam livre e arbitrariamente fixados por acordo entre a entidade patronal e o trabalhador; 4) Será a empresa e o trabalhador quem, através do contrato individual de trabalho, definirão pontualmente qual deverá ser o período norma de trabalho, que tanto poderá ser de 4 (quatro) horas semanais, como de 7 (sete) horas diárias; 5) Só fazendo uma interpretação deste tipo se poderá respeitar a excepcionalidade que a lei obriga a ter em conta na definição do horário de trabalho e período de trabalho dos médicos de outra forma não seria necessária a regra excepcional e aplicar-se-ia o regime geral; 6) Quis o legislador fugir à aplicação da regra da proporcionalidade da retribuição em função do número de horas de trabalho prestado porque o trabalho aqui em causa não é um trabalho igual, mas acrescido de responsabilidades e especificidades que o legislador quis salvaguardar; 7) Não podemos ignorar o espírito da lei e ter atenção um regra básica de interpretação das normas que é a de que o intérprete deve presumir que o legislador se expressou da melhor forma; 8) Se o intérprete não deve distinguir onde o legislador não fez distinção, também não é menos verdade que se o legislador distinguiu expressamente os médicos, aplicando-lhe um regime especial, ainda por cima justificando porque é que o fazia, então há que respeitar...

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