Acórdão nº 081329 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 02 de Abril de 1992
Magistrado Responsável | FERNANDO FABIÃO |
Data da Resolução | 02 de Abril de 1992 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: Na comarca de Vila Franca de Xira, A, por si e em representação de seus filhos menores B e C, propôs a presente acção contra Companhia de Caminhos de Ferro Portugues E.P., na qual pediu que esta fosse condenada a pagar-lhes a quantia de 5 milhões de escudos, acrescida de juros legais a contar da citação, como indemnização pelos danos patrimoniais e não patrimoniais por eles sofridos com a morte de seu marido e pai, colhido por um comboio em 10/2/86, quando conduzia um camião e procurava atravessar uma passagem de nível ao Km 23,390 da linha do Norte. A ré contestou e pediu que a acção fosse julgada improcedente logo no saneador. Houve resposta dos autores. Foi concedida aos autores a assistência judiciária que requereram, foi proferido o despacho saneador e organizados a especificação e o questionário. Seguiu o processo a tramitação legal até ao julgamento, após o que o meritissimo Juiz de 1 instância julgou a acção improcedente. Desta sentença apelaram os autores, mas a Relação negou provimento ao recurso. Deste acórdão da Relação interpuseram os autores recurso de revista e, nas suas alegações concluem assim: I- nos termos do n. 2 do artigo 342 do Código Civil, cabia à ré provar os factos imputadores da culpa à vitima mortal por serem impeditivos do direito dos lesados; II- não age com culpa o motorista de um autocarro de passageiros que, pretendendo atravessar uma passagem de nível sem guarda e existindo então nevoeiro intenso, parou, olhou para a esquerda e para a direita e, sem ver avançou vagarosamente, surgindo, então, o comboio a mais de 100 Km hora, dando-se o embate; III- é facto notório que circulam por conta e no interesse da ré os comboios que se deslocam no troço ferroviário entre Lisboa e Vila Franca de Xira e que são conduzidos por maquinistas empregados da mesma ré. IV- a circulação (situação deve ter sido lapso) ferroviária deve considerar-se actividade perigosa pela natureza e poder dos meios que usa; V- por força dos artigos 493 n. 2 e 503 do Código Civil incumbe à ré provar que, nesse acidente em passagem de nível sem guarda, houve culpa do condutor do veículo embatido pelo comboio, só assim excluindo o dever de indemnizar os respectivos prejuízos; VI- entendendo-se que não existe culpa presumida, há que repartir a responsabilidade na produção do risco de cada um dos veículos (artigo 506 do Código Civil), sendo que o risco da circulação de um comboio é, pelo menos, igual ao dobro do risco da circulação de um autocarro, e, subsistindo dúvidas, deve ser igual a medida de contribuição de cada um dos veículos (artigo 506 n. 2 do Codigo Civil); VII- a condenação por via da responsabilidade objectiva deve situar-se nos limites do artigo 508 do Código Civil. VIII- incorre na obrigação de indemnizar o concessionário de Caminhos de Ferro que omitiu a obrigação de tomar todas as medidas indispensáveis para garantir a segurança dos utentes da estrada, sendo obrigação desse concessionário fazer aplicar as normas legais cuja aplicação foi transitoriamente adiada e sendo injustificado, juridicamente, um período superior a dez anos para fazer aplicar integralmente as normas regulamentares que visam garantir a segurança nas passagens de nível, já danificadas segundo a parte vigente do dito Regulamento, pelo que deve o referido concessionário ser condenado a pagar os prejuízos decorrentes de um acidente numa passagem de nível (artigo 486 do Código Civil); IX- o Decreto-Lei 156/81, que aprova o Regulamento das Passagens de Nível deve entender-se com eficácia meramente interna, cuja aplicação se limita às relações entre concessionários dos Caminhos de Ferro e o Estado, já que, se se pretender dar-lhe eficácia externa, é inconstitucional, nomeadamente o seu artigo 29, na medida em que viola o artigo 115 n. 5 da Constituição, além de ser formalmente inconstitucional, por aprovar um regulamento independente contra o disposto no artigo 115 n. 6 da Constituição; X- o montante de 5 milhões de escudos deve considerar-se ajustado para indemnizar os autores, certo sendo que a vítima auferia mais de 50 mil escudos por mês e era pessoa saudável, trabalhadora, poupada e o único sustentáculo económico da familia; XI- foram violados os artigos 342, 483, 487, n. 2 do 493, 495, 496, 499 e s.s., 503, 505 e s.s., 562 a 572, todos do Código Civil. Nas suas contra-alegações, a ré rebateu as alegações dos autores e terminou pedindo se negue provimento ao recurso. Colhidos os vistos legais, cumpre decidir Têm...
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