Acórdão nº 02504/08 de Tribunal Central Administrativo Sul, 09 de Dezembro de 2008

Magistrado ResponsávelJOSÉ CORREIA
Data da Resolução09 de Dezembro de 2008
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Acordam nesta Secção do Contencioso do Tribunal Central Administrativo Sul: I-RELATÓRIO A EXCELENTISSIMA REPRESENTANTE DA FAZENDA PÚBLICA, dizendo-se inconformada com a sentença proferida pelo M. Juiz do Tribunal Tributário de 1ª Instância de Leiria que julgou procedente a impugnação judicial deduzida por A.... & C..... -S............, Ldª., contra a liquidação de IRC e de Derrama referente ao exercício do ano de 2004, veio da mesma recorrer para este Tribunal formulando para tanto nas suas alegações as seguintes conclusões e que na íntegra se reproduzem ordenadas numericamente por nossa iniciativa: Não subsistem quaisquer vícios capazes de afectar a validade do acto de liquidação impugnado: 1. Ocorreram dois procedimentos inspectivos e não apenas um; 2. O primeiro procedimento inspectivo teve carácter externo e destinou-se à recolha de elementos, no caso, os ficheiros do programa de registo das operações tributáveis do sujeito passivo; 3.O segundo procedimento inspectivo teve carácter interno e não implicou qualquer acto exterior às instalações da AT; 4. Os dois procedimentos são independentes um do outro; 5.Nem um nem outro dos procedimentos inspectivos obrigavam ao envio de carta aviso; 6. A impugnante ora recorrida não logrou, pôr em crise nenhum dos motivos que levaram a AT à fixação da sua matéria tributável com base no registo de proveitos constante dos ficheiros do programa informático que utilizava no seu estabelecimento e que não foram levados à contabilidade e depois ás declarações fiscais; 7. O impugnante não logrou pôr em crise nem a correcção nem a sua necessidade e muito menos a sua fundamentação; 8. Foi demonstrado de forma clara, suficiente e consistente, quer o montante da correcção, quer a sua necessidade e razão de ser no relatório inspectivo; 9. Na douta sentença recorrida não foram identificados outros vícios além dos atinentes à condução dos procedimentos inspectivos; 10. As ilegalidades eventualmente cometidas no procedimento inspectivo não se projectam na liquidação a que dá lugar; 11. Não assiste, por conseguinte, à ora recorrida, quaisquer razões de facto ou de direito susceptíveis de anular ou revogar o acto tributário controvertido.

Nestes termos deve o presente recurso ser julgado procedente, considerando-se a liquidação legalmente efectuada, revogando-se a douta sentença do Meritíssimo Juiz "a quo", substituindo-se por outra em que seja julgada totalmente improcedente a impugnação judicial.

Também a recorrida veio a produzir as suas alegações, defendendo a bondade do decidido e que deve ser mantido na ordem jurídica com as seguintes conclusões: 1. A ERFP nas alegações de recurso que apresenta da douta sentença do Meritíssimo Juiz a quo invoca que tal sentença padece de erro quanto à factualidade dada como provada e quanto à recondução dessa factualidade ao direito aplicável.

  1. Antes de entrar na análise das alegações da ERFP, assume a maior importância a invocação de uma questão prévia e prejudicial de todas as demais, a saber, a autoridade de caso julgado que a sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Leiria no âmbito do processo n° ..../...BELRA tem no âmbito dos presentes autos.

  2. A autoridade de caso julgado consiste, a par da excepção de caso julgado, numa das vertentes do caso julgado material, e "destina-se a evitar que a relação -m situação jurídica material definida por uma sentença possa ser validamente definida de modo diverso por outra sentença (razão de certeza ou segurança jurídica) ".

  3. Conforme é pacífico na doutrina e na jurisprudência, esta figura, ao contrário da excepção de caso julgado, não exige, quanto aos seus pressupostos, a tríplice identidade de sujeitos, causa de pedir e pedido referida no art. 498° do CPC.

  4. Acresce que a autoridade de caso julgado se traduz no efeito positivo do caso julgado material, na medida em que, essencialmente por razões de segurança e certeza jurídicas, proíbe que uma decisão posterior contrarie uma decisão anterior já transitada em julgado.

  5. Assim sendo, "a autoridade de caso julgado importa a aceitação de tema decisão proferida em acção anterior, que se insere, quanto ao seu objecto, no objecto da segunda, visando obstar a que a relação ou situação jurídica material definida por uma sentença possa ser validamente definida de modo diverso por outra sentença (razão de certeza ou segurança jurídica), não se exigindo a tríplice identidade".

  6. Transpondo o que ficou dito para o caso em apreço, dir-se-á que aquele processo (cuja sentença já transitou em julgado) é em tudo semelhante aos presentes autos, na medida em que em ambos os processos é levada à consideração do Tribunal a (i)legalidade do mesmo procedimento de inspecção levado a cabo.

  7. Foi do mesmo procedimento de inspecção que emergiram as liquidações adicionais de IRC impugnadas pela ora Recorrida tanto naquele processo como nos presentes autos.

  8. Assim sendo, dado que a sentença proferida naquele processo, já transitada em julgado, pronunciou-se no sentido da ilegalidade do procedimento de inspecção em causa nos presentes autos, aquela decisão deverá ser acatada nos presentes autos, mantendo-se por conseguinte, a decisão recorrida.

  9. Sem conceder, caso se entenda que a referida sentença transitada em julgado não tem autoridade de caso julgado nos presentes autos -o que apenas por dever de patrocínio se admite -deverão ser reapreciados os factos e o direito aplicável, devendo a sentença recorrida ser confirmada, por a mesma não merecer qualquer reparo.

  10. Embora o não diga expressamente, a ERFP imputa à sentença recorrida o vício de erro na apreciação da prova, e pretender que o Tribunal considere como provados vários factos que o não foram na decisão a quo.

  11. Contudo, e desde logo, a ERFP não indica sequer, na maioria das vezes, quais os elementos de prova que foram erradamente apreciados e dos quais alegadamente resulta uma conclusão diferente quanto a tais factos.

  12. É que, na realidade, da prova produzida tais factos não resultam indiscutivelmente provados, pelo que não merece neste ponto qualquer censura a decisão recorrida, que deve ser integralmente mantida.

  13. Entrando na matéria de direito, a ERFP começa por defender que, no caso em análise, houve lugar a dois procedimentos de inspecção, um primeiro de carácter externo e um segundo, considerado pela ERFP como aquele que deu origem à liquidação impugnada, de carácter interno, defendendo que ambos são legais.

  14. A ora Recorrida não pode concordar com tal entendimento.

  15. Em primeiro lugar, porque partilha do entendimento do Meritíssimo Juiz a quo segundo o qual se trata no presente caso de um único procedimento de inspecção, o qual teve início com uma diligência de recolha de informação nas instalações da ora Recorrida.

  16. A referida diligência, além de ter tido lugar nas instalações da ora Recorrida, transcenderam em larga medida a análise meramente formal e de coerência dos documentos, pelo que não restam dúvidas de que o mencionado procedimento de inspecção tem carácter externo, aliás como já propugnado pelo Meritíssimo Juiz a quo.

  17. Dado que o procedimento de inspecção é externo, o mesmo padece de diversas ilegalidades, entre as quais a falta de notificação prévia à Impugnante do procedimento de inspecção, conforme impõe o artigo 49° do RCPIT.

  18. Acresce ainda que o referido procedimento enferma de outra ilegalidade na medida em que excedeu o prazo máximo legalmente previsto (6 meses)...

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