Acórdão nº 06494/02 de Tribunal Central Administrativo Sul, 19 de Dezembro de 2007
Magistrado Responsável | Rui Pereira |
Data da Resolução | 19 de Dezembro de 2007 |
Emissor | Tribunal Central Administrativo Sul |
ACORDAM EM CONFERÊNCIA NO 1º JUÍZO LIQUIDATÁRIO DO TRIBUNAL CENTRAL ADMINISTRATIVO SUL I. RELATÓRIO Isabel ...
, com os sinais dos autos, veio interpor recurso contencioso de anulação do despacho do Senhor Secretário de Estado da Administração Educativa, datado de 31-5-2002, que lhe aplicou a pena disciplinar de inactividade, graduada em dois anos.
Imputa ao acto impugnado o vício de violação de lei, por erro nos respectivos pressupostos de facto e de direito, e também a violação dos princípios da legalidade, da imparcialidade, da boa-fé e da justiça.
A entidade recorrida respondeu, pugnando pelo improvimento do recurso [cfr. fls. 46/52 dos autos, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido].
Notificada para apresentar alegações, veio a recorrente fazê-lo, formulando para o efeito as seguintes conclusões: "A. Todo o processo deixa de fora um elemento essencial - a prova da acusação. Ora, "nos processos disciplinares não é ao arguido que incumbe o ónus de provar a sua inocência perante os factos de que é acusado, mas ao titular da acção disciplinar que cabe provar, positivamente, a matéria da acusação" - Acórdão do STA, de 14-11-74, in Ac. Dout. do STA, nº 157, pág. 35, Acórdão do STA, de 18-10-79, in Ac. Dout. do STA, nº 214, pág. 549.
B. A única acusação que poderá ser efectuada contra a recorrente será a de ter exigido, aquilo que ilegalmente lhe estava sendo negado, o que se traduz em mais uma infracção na conduta da Presidente do Conselho Executivo, que confundiu poder discricionário com livre arbítrio.
C. Eventualmente, a forma como o fez pode não ter sido a mais consentânea com o direito, mas, é a própria presidente do Conselho Executivo que esconde evidências, nega a existência de documentos e que em auto de acareação afirma peremptoriamente que não ia dar conhecimento daquele despacho à recorrente.
D. Ora, tudo isto, consubstancia clara violação do princípio da legalidade e da boa fé - artigo 3º e 6º-A do CPA. Aliás, E. Ao não terem sido devidamente qualificados os factos e elementos apresentados pela ora recorrente aquando da defesa e das acareações requeridas, designadamente por não terem sido valorados como deveriam, quer as acareações quer os depoimentos da recorrente e da única testemunha, e estando desta feita a recorrente a ser punida por infracção não cometida, F. O acto recorrido enferma de vício de violação de lei por erro nos pressupostos de direito.
G. Ainda neste capítulo, não foram juntas ao processo as certidões requeridas pela recorrente, tendo o Sr. Instrutor admitido - e por via dele o despacho recorrido - a simples negativa ou declaração de inexistência das mesmas por parte da participante, H. Não foram pois valorados como elementos de prova pelo menos a acta nº 190, em que o Sr. Instrutor esteve presente na reunião a que aquela acta se refere, na qualidade de consultor jurídico do Conselho Executivo, tendo-a assinado nessa qualidade, I. O que releva, in casu, para se aquilatar da falta de verdade do Sr. Instrutor e da sua posição de má-fé em que manifestamente se colocou, já que ele próprio sabe ter assinado pelo menos, que se saiba, aquela acta e naquela qualidade.
J. Ferindo desta feita o contraditório - pedra angular do processo disciplinar e penal - e mais uma vez o principio da boa fé, o que torna o acto recorrido ilegal por vicio de violação de lei.
K. Por outro lado, enquanto advogado, deveria o Sr. instrutor ter recusado liminarmente o patrocínio do presente processo por ter chegado ao conhecimento dos factos pela via da profissão - consultor jurídico - abstendo-se desta feita de participar no processo por uma das partes, com a agravante de o ter feito com funções de acusação.
L. Tal conduta consubstancia, para o acto recorrido, vício de violação de lei, por violação clara dos princípios da imparcialidade e da justiça, artigo 6º do CPA, M. Na medida em que todo o procedimento se pautou por uma actuação nitidamente em defesa de uma das partes - a participante - em detrimento da verdade material que se lhe impunha, N. Sendo assim determinado à condenação prévia da recorrente, independentemente de quem viesse a ouvir o que tivesse para dizer, ou ainda do que viesse a provar.
O. O acto recorrido é ainda ilegal porque o quantum da pena [aposentação compulsiva] se mostra tão descabido como exagerado para a hipotética infracção que lhe é imputada - nada tendo que ver enquanto graduação "in concretum", antes com a não adequação aos pressupostos previstos no artigo 26º, ou 25º, ambos do EDFAACRL, no caso do acto recorrido, o que se traduz em erro nos pressupostos de direito por erro quanto à qualificação. Ou seja, P. A existir infracção ela nunca poderia ser qualificada ou sequer inserida no espírito quer da norma proposta pelo Sr. Instrutor quer pela norma apontada pelo acto recorrido.
Q. O acto recorrido, nesta medida acaba por não conter a fundamentação que "de iure" se lhe exige para punir a recorrente com a pena de inactividade graduada em dois anos, pois que de todo o conteúdo do parecer não se extrai em que medida surgem violadas qualquer das condutas que o artigo 25º do EDFAACRL se reporta. E, R. Nesta medida, o acto recorrido é ilegal por manifesta violação do artigo 25º, pois que os factos não correspondem, nem com eles é feita qualquer correspondência que traduza a pena determinada - inactividade graduada em 24 meses.
S. Há também que curar da própria fundamentação do acto recorrido que enferma de vício de violação de lei - artigos 124º e 125º do CPA, por falta de fundamentação, atendendo que fundamentação errada - falsa conforme se deixou expresso supra e na PI - significa o mesmo que ausência de fundamentação, T. Configurando esta situação um vício de violação de lei por erro nos pressuposto de facto.
U. O acto recorrido encontra-se também ferido de ilegalidade na exacta medida em que dá como provado o conluio da recorrente com a sua superior hierárquica e a premeditação, o que, V. Sempre implicaria provar que a conduta já estava acordada entre ambas. Ora, W. Nem a recorrente nem a sua superior hierárquica imediata podiam antever e muito menos prever aquela actuação da Presidente do Conselho Executivo.
X. Muito menos se poderá confundir a omissão ou estupefacção ou a posição atónita da Chefe de Serviços de Administração Escolar com conluio ou premeditação.
Y. Trata-se pois de meras ilações que, na medida em que influenciaram o exercício de prognose do acto recorrido, irremediavelmente o inquinam com erro nos pressupostos de direito, por erro na qualificação e na interpretação.
Z. Finalmente, o acto recorrido viola o principio da justiça, porquanto, sendo o acto punitivo efectivamente injusto na medida em que assenta em factos falsos, mais "parecendo" "montados" do que apurados, já que as testemunhas arroladas pela acusação viram o que não viram porque não podiam ver, ouviram o que não foi dito e por isso não ouvido, não existindo assim os factos de que vem acusada, que apenas subsistem na montagem arquitectada pela acusação, o acto recorrido incorre em erro nos pressupostos de facto quer quanto à motivação quer sobre o objecto".
Por seu turno, a entidade recorrida, nas contra-alegações apresentadas, formulou as seguintes conclusões: "Quanto às conclusões A a D, a instrução produziu prova inequívoca da prática, pela recorrente, das infracções por que veio a ser disciplinarmente punida, constantes da acusação.
Relativamente às conclusões E e F, todos os elementos da defesa, designadamente, as acareações e os depoimentos, foram devidamente valorados.
Em relação às conclusões G a N, o incidente deduzido contra o instrutor foi indeferido em sede graciosa de apreciação, encontrando-se, presentemente, em apreciação no Processo nº 11.072, da 2ª Subsecção da 1ª Secção deste Tribunal Administrativo.
Na verdade, nenhuma das alíneas do artigo 52º do Estatuto Disciplinar [DL nº 24/84, de 16/1] era aplicável ao instrutor.
O citado artigo 52º, nº 1 apenas legítima a dedução da suspeição do instrutor nos casos em que haja grande intimidade entre ele e o participante.
A recorrente não apresentou factos que permitissem concluir pela existência de grande intimidade entre ambos, aludindo unicamente a amizade entre colegas, apenas porque se tratavam por "tu", como um mero juízo valorativo-conclusivo.
Não existe, estatutariamente, nas escolas secundárias, o cargo de consultor jurídico, pelo que não pode falar-se da existência de mandato jurídico.
Quanto às conclusões O e P, a pena aplicada, de que ora se recorre, foi a de dois anos de inactividade e não a de aposentação compulsiva.
No processo disciplinar, deram-se como provados factos que denunciam graves desrespeitos e injúrias à Presidente do Conselho Executivo, em conluio com a chefe dos Serviços de Administração Escolar, também arguida noutro processo disciplinar.
Relativamente às conclusões Q a T, o acto recorrido está devidamente fundamentado, de modo a que um destinatário normal entenda o sentido e o alcance da decisão.
Em relação às conclusões U a Z, a punição da recorrente não resulta de meras ilações, mas está assente em factos comprovados no processo".
Neste TCA Sul, o Digno Magistrado do Ministério Público emitiu douto parecer, no qual defende que o recurso merece provimento [cfr. fls. 71/72 dos autos, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido].
Colhidos os vistos legais, vêm os autos à conferência para julgamento.
II. FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO Com interesse para a apreciação do mérito do presente recurso, e tendo em conta os documentos constantes do processo instrutor apenso, consideram-se assentes os seguintes factos: i.
Na sequência de participação efectuada pela Presidente do Conselho Executivo da Escola Secundária de António Nobre, no Porto, o Director Regional de Educação do Norte, por despacho datado de 8-3-2001, determinou a instauração de procedimento disciplinar à aqui recorrente, nomeando desde logo instrutor o professor daquela escola Dr. Vítor Simões, e solicitou ao...
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