Acórdão nº 00949/06.7BECBR de Tribunal Central Administrativo Norte, 26 de Março de 2009

Magistrado ResponsávelDr
Data da Resolução26 de Março de 2009
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: 1.

RELATÓRIO MUNICÍPIO DE TÁBUA, devidamente identificado nos autos, inconformado, veio interpor recurso jurisdicional da decisão do TAF de Coimbra, datada de 21/11/2007, que no âmbito da acção administrativa comum, sob a forma ordinária, movida contra as RR.

“P…, ... LDA.” e “R…, LDA.”, absolveu da instância, por incompetência em razão da matéria dos tribunais administrativos, quanto ao pedido de condenação das RR. no pagamento da quantia de 110.453,12€ acrescida de juros de mora desde a data de citação até efectivo e integral pagamento e que julgou improcedente absolvendo as RR. do pedido de reconhecimento e de declaração de que “… a linha eléctrica de ligação entre o parque eólico da Pampilhosa da Serra e a linha a 220Kv, Vila Chã de Pereiros 2 (LVCPR2) atravessa o espaço aéreo do município e algumas estradas e caminhos municipais …”.

Formula o aqui recorrente nas respectivas alegações as seguintes conclusões que se reproduzem (cfr. fls. 105 e segs.): “...

  1. O primeiro pedido formulado pelo A. na presente acção administrativa comum consistia no reconhecimento de que a linha eléctrica de ligação entre o parque eólico da Pampilhosa da Serra e a linha a 220Kv, Vila Chã de Pereiros atravessava o espaço aéreo do Município e algumas estradas e caminhos municipais.

  2. O Tribunal a quo deu efectivamente por provado que a linha eléctrica em causa atravessava estradas e caminhos municipais mas, no entanto, julgou totalmente improcedente o pedido de reconhecimento que tal linha atravessava o espaço aéreo do Município por entender que os municípios não possuem qualquer domínio público aéreo.

    Contudo, 3ª O aresto em recurso enferma de um claro erro de julgamento quando julga totalmente improcedente o primeiro pedido formulado pelo A. - reconhecer-se que a linha eléctrica de ligação entre o Parque eólico da Pampilhosa da Serra e a linha 220 Kv, Vila chã de Pereiras - com o único argumento de que não existe domínio público aéreo municipal, porquanto, - É a própria lei a reconhecer aos Municípios o poder de cobrar taxas pela ocupação do espaço aéreo (v. alíneas b) e c) do art. 19.º da Lei das Finanças Locais à data em vigor, aprovada pela Lei n.º 42/86, de 6 de Agosto), o que, muito naturalmente, só é possível se a lei configurar esses mesmos Municípios como titulares de um domínio público aéreo; - A nossa mais autorizada jurisprudência já teve a oportunidade de concluir que o domínio público municipal integra o espaço aéreo (v. Ac. do STA de 9/5/2007, Proc. 01223/06 in www.dgsi.pt), pelo que também por este prisma é notório o desacerto da tese sufragada pelo Tribunal a quo; - A existência de um domínio público aéreo municipal também é expressamente reconhecida pelos Srs. Profs. João Caupers e Pedro Gonçalves, em pareceres que se juntam; 4ª O aresto em recurso incorreu ainda em erro de julgamento quando julgou procedente a excepção dilatória da incompetência absoluta do Tribunal para conhecer o pedido de condenação formulado pelo A., porquanto a questão não se resumia à aparente simplicidade com que o Tribunal a quo abordou tal questão, antes tendo a ver com a eventual obrigatoriedade ou faculdade de a cobrança das receitas devidas a título de taxas serem ou não objecto de cobrança através de um acto de liquidação ou através de uma acção condenatória.

    Na verdade, 5ª Em parte alguma a lei atribui aos Tribunais Fiscais a competência para o conhecimento de acções condenatórias deduzidas por entidades públicas contra particulares com fundamento no não pagamento de quantias que sejam devidas pela utilização do domínio púbico (v., neste sentido, o art. 49.º do ETAF).

  3. Por isso mesmo, a questão que importa colocar é, justamente, a de saber se, estando em causa quantias que sejam devidas a título de taxas pela utilização do domínio público, a Administração está obrigada a liquidar tais taxas para depois esperar que os particulares impugnem o acto de liquidação no Tribunal Fiscal (que para esse efeito será competente ex vi do art. 49.º do ETAF) ou se, pelo contrário, pode a Administração não proceder a essa liquidação e solicitar nos Tribunais Administrativos a condenação de tais particulares no pagamento das quantias que são devidas a título de taxas.

  4. Entende o ora recorrente que, não obstante a lei permitir aos municípios liquidarem as taxas que depois podem ser impugnadas pelos destinatários e de se prever um processo de execução fiscal para o incumprimento da obrigação de pagamento, tal não invalida que a Administração possa não proceder à liquidação e procurar obter judicialmente a condenação do utilizador do domínio público a pagar as quantias devidas a título de taxas através de uma acção administrativa comum de condenação, para a qual já não serão competentes os Tribunais fiscais - por não haver norma legal a dar-lhes tal poder (v. art. 49.º do ETAF) - mas antes os Tribunais Administrativos, ex vi do art. 37.º do CPTA.

  5. Seguramente que se o exercício do poder-dever de cobrar as receitas fiscais for efectuado através de um acto de liquidação, terá o sujeito passivo que recorrer ao processo de impugnação fiscal, para o que serão competentes os Tribunais fiscais, da mesma forma que se o acto tributário não for pago por tal sujeito poderá a Administração recorrer ao processo de execução fiscal.

    Contudo, 9ª Sustentar-se que a receita fiscal terá que ser obrigatoriamente obtida através deste acto de liquidação e daquele processo de execução fiscal já será, na opinião do Município, perfilhar um entendimento que não tem cobertura no texto da lei - que não impõe obrigatoriamente que a receita seja obtida por tal via -, que colidirá com o direito de acesso à justiça - que permite que o direito carecido de tutela seja tutelado através de diversas formas processuais - e que deixará por explicar por que é que quem tem um título executivo pode recorrer a uma acção declarativa, o que denota que o simples facto de se prever uma dada forma de obter a cobrança de uma receita não invalida que se socorra de outros meios legalmente previstos.

  6. Por isso mesmo, julga-se que o aresto em recurso incorreu igualmente em erro de julgamento quando se julgou absolutamente incompetente para conhecer do pedido condenatório formulado na presente acção sobretudo quando em causa estava um pedido de condenação para cuja apreciação o Tribunal a quo era competente ex vi do art. 37.º, n.º 1 do CPTA e 44.º do ETAF …”.

    Termina sustentando o provimento do recurso e revogação da decisão judicial em crise.

    As RR., ora recorridas, notificadas, apresentaram contra-alegações (cfr. fls. 142 e segs.), tendo concluído que: “… 1 - Da combinação do disposto nos artigos 1344.º e 1304.º do Código Civil resulta a existência do espaço aéreo do domínio público municipal, correspondente à superfície do domínio público municipal, ou seja, ao espaço aéreo correspondente à superfície das estradas, caminhos, largos e praças municipais.

    2 - No entanto, o espaço aéreo do domínio público municipal não abrange o domínio privado do município nem o domínio privado (isto é, pertencente a particulares ou ao sector privado) nem os bens pertencentes ao sector cooperativo e social (cfr. artigo 82.º da Constituição da República Portuguesa).

    3 - Na verdade, e como decorre dos supra referidos preceitos do Código Civil, o espaço aéreo de terrenos particulares pertence aos respectivos proprietários privados e apenas o espaço aéreo de terrenos públicos pertence às entidades públicas.

    4 - Assim, não pode ter acolhimento o entendimento do Autor de que todo o espaço aéreo que integra os limites do seu concelho constitui espaço aéreo do domínio público municipal - só o espaço aéreo das estradas, caminhos, largos e praças municipais é que pertencerá a essa categoria, não abrangendo nomeadamente o espaço aéreo correspondente ao domínio privado.

    5 - Deste modo, o eventual reconhecimento de um espaço aéreo do domínio público municipal deverá ter em conta estes limites (ou seja, que o mesmo não abrange o espaço aéreo correspondente ao domínio privado, social e cooperativo).

    6 - Quanto ao segundo pedido, referente à condenação das Rés no pagamento de uma taxa, entendem estas que bem esteve o douto despacho saneador nesta parte, ao julgar que o tribunal administrativo é materialmente incompetente para conhecer deste pedido, sendo competente para o mesmo o Tribunal Tributário.

    7 - Na verdade, as taxas, tal como os impostos, constituem matéria de natureza fiscal, sendo que os tribunais competentes para a apreciação dessas matérias são os fiscais e não os administrativos.

    8 - De acordo com o artigo 30.º, n.º 4 da Lei das Finanças Locais (Lei n.º 42/1998, de 6 de Agosto, com a redacção introduzida pela Lei n.º 15/2001, de 5/6), com o Código de Procedimento e de Processo Tributário e com o artigo 49.º do ETAF, o Município teria que proceder primeiro ao acto de liquidação dessas taxas, de modo a que os particulares pudessem proceder à respectiva impugnação no competente Tribunal Tributário.

    9 - Permitir que numa acção administrativa comum se peça a condenação de um particular no pagamento de uma taxa, significa subverter completamente os meios processuais estabelecidos por lei, que impõem que se proceda primeiro à liquidação da taxa pelos meios previstos no Código de Procedimento e de Processo Tributário, de modo a que os particulares possam reagir nos termos aí estabelecidos.

    10 - Deste modo, deve o despacho saneador recorrido ser mantido nesta parte ...

    ”.

    O Ministério Público (MºPº) junto deste Tribunal, notificado nos termos e para efeitos do disposto no art. 146.º do CPTA, não emitiu parecer (cfr. fls.159 e segs.).

    Colhidos os vistos legais juntos dos Exmos. Juízes-Adjuntos foram os autos submetidos à Conferência para julgamento.

    1. DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO - QUESTÕES A APRECIAR Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pelo recorrente, sendo certo que, pese embora por um...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT