Acórdão nº 01688/08.0BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 05 de Fevereiro de 2009

Magistrado ResponsávelDr
Data da Resolução05 de Fevereiro de 2009
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam, em conferência, os Juízes da Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: Relatório ASSOCIAÇÃO DE PROMOÇÃO SOCIAL DA POPULAÇÃO DO BAIRRO DO A...

– com sede na rua …, Lordelo do Ouro, Porto – interpõe recurso jurisdicional da decisão judicial proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal [TAF] do Porto – em 17.10.2008 – que julgou improcedente o seu pedido cautelar de suspensão de eficácia da deliberação de 23.07.2008 da Assembleia Municipal do Porto.

Conclui as suas alegações da forma seguinte: 1-O acto suspendendo integra a noção de actos susceptíveis de impugnação previsto no artigo 120º do CPA; 2- O acto suspendendo fica adentro do postulado no artigo 51º nº1 do CPTA; 3- O acto suspendendo lesa, pela sua natureza, interesses difusos dos representados da recorrente; 4- Sendo assim, deveria ter sido dado provimento à providência cautelar, e suspender-se a eficácia da deliberação impugnada; 5- A sentença recorrida, ao não considerar o acto em apreço como lesivo, violou, por erro de interpretação e de aplicação, os artigos 51º e 120º do CPTA e 120º do CPA.

O Município do Porto contra-alegou, concluindo assim: 1- Contra o sentido da decisão do tribunal a quo que se pronunciou pela inimpugnabilidade do acto impugnado, a recorrente centra as suas alegações de recurso na defesa da lesividade do acto suspendendo em relação ao direito à habitação dos moradores do Bairro do A...; 2- A argumentação jurídica deste recurso jurisdicional radica no entendimento de que os moradores do Bairro do A... têm direito a manter uma determinada habitação social - aquela que presentemente ocupam - bem como, o direito de exigir do Município que as habitações novas que lhes serão atribuídas preencham condições de habitabilidade por si definidas; 3- Sucede que o âmbito de protecção do direito à habitação consagrado no artigo 65º da CRP não abrange o direito de exigir a manutenção de uma determinada habitação social, nem o de exigir condições de habitabilidade casuisticamente definidas; 4- As alegações de recurso assentam, pois, em errada interpretação sobre a natureza jurídica e o âmbito de protecção do direito à habitação consagrado no artigo 65º da CRP; 5- Acresce que o direito à habitação não é susceptível de ser directamente lesado por actos administrativos, pois, atendendo à sua natureza programática, não se traduz num direito imediato a uma prestação efectiva, judicialmente exercitável; 6- Assim, para que a deliberação suspendenda fosse susceptível de violar o direito à habitação social dos moradores do Bairro do A... teria a requerente de ter demonstrado que se encontram violadas as normas infra-constitucionais que exprimem as opções políticas do legislador em matéria de habitação social [AC do Tribunal Constitucional nº374/02, de 26 de Setembro de 2002, Acórdão TCA, Rº1408/98, de 25 de Junho de 1998, AC TCAS, R01959/06, de 18 de Janeiro de 2007]; 7- Ao praticar a deliberação suspendenda, a Assembleia Municipal não está a violar qualquer disposição legislativa ou norma de direito administrativo, mas sim a dar cumprimento às atribuições que lhe cabem por força da Lei nº159/99, de 14 de Setembro, bem como do Programa de Acção do Programa Nacional da Política de Ordenamento do Território [PNPOT], em observância da Estratégia Nacional de Desenvolvimento Sustentável [ENDS]; 8- Reconhecer em abstracto um eventual direito dos moradores do Bairro do A... à manutenção de uma concreta habitação social seria conferir-lhes um âmbito de protecção mais alargado do que foi já conferido pelos tribunais a outros moradores dos bairros sociais da cidade do Porto já intervencionados, como os do Bairro São João de Deus [AC do TCAN de 01.02.2007, Rº01321/04.9BEPRT]; 9- Acresce que, em concreto, os moradores do Bairro do A... manifestamente não têm direito a perpetuarem no futuro a ocupação das suas actuais casas porque dispõem apenas de títulos de ocupação precários [licenças], conforme consta da declaração proferida pela DOMUSSOCIAL– Empresa de Habitação e Manutenção do Município do Porto, E. M.

[documento 3 anexo ao articulado de oposição]; 10- Na causa sub judice é aliás manifesto o não preenchimento dos requisitos legais de adopção da providência cautelar requerida; 11- Desde logo, nos termos expostos em primeira instância em sede de oposição à providência cautelar requerida, é manifesta a falta de fundamento da pretensão a formular no processo principal em virtude da inimpugnabilidade objectiva do acto suspendendo, devendo este recurso improceder por aplicação do artigo 120º nº1 alínea a) CPTA; 12- Acresce que não existe qualquer fundamento objectivo para invocar fundado receio de uma situação de facto consumado resultante do acto suspendendo, pois este acto não é susceptível de produzir directamente quaisquer efeitos externos, como bem julgou o tribunal a quo; 13- Isto porque o acto suspendendo não procede a qualquer alienação dos imóveis que constituem o Bairro do A..., nem vincula a Câmara Municipal a fazê-lo, nem determina despejo administrativo dos respectivos moradores, nem tampouco ordena a demolição ou alienação de imóveis, ou vincula a que tal venha a ser determinado; 14- Não existe, igualmente, qualquer periculum in mora para as posições jurídicas subjectivas invocáveis pela recorrente em virtude da aprovação da deliberação suspendenda; 15- Isto porque a transferência de habitação dos moradores do Bairro do A..., a demolição e a alienação do Bairro correspondem a situações futuras de verificação incerta, na medida em que dependem da conjugação de um extenso conjunto de variáveis, também eles de verificação futura é hoje profundamente incerta; 16- Mas que venha a decorrer um concurso público com sucesso, mesmo que dele venha a resultar uma adjudicação, mesmo que venha a ser celebrado um contrato, mesmo que o co-contratante venha a cumprir pontualmente as obrigações de entrega dos imóveis necessários, mesmo que a recorrente venha a iniciar os procedimentos de transferência de habitação dos moradores do Bairro do A..., aí, quando e se os moradores do Bairro do A... vierem a ter de mudar de habitação, ser-lhes-á assegurado o direito de manifestar a sua preferência na escolha da nova morada [como consta do ponto 45 da deliberação suspendenda], bem como, todas as possibilidades legais de defesa contra eventuais invalidades, podendo, designadamente obter a suspensão dos efeitos desses actos; 17- Quanto às dúvidas sobre as condições das futuras habitações sociais que eventualmente os moradores do Bairro ocuparão, as peças concursais aprovadas pela deliberação suspendenda expressamente garantem a todos habitações [novas ou reabilitadas] especificamente concebidas para fins de habitação social, ao contrário do Bairro do A... que foi construído para fins de habitação privada e futuramente objecto de ocupação [artigo 18º nº2 alínea b) e 19º nº2 do Caderno de Encargos]; 18- O Anexo III deste Caderno de Encargos impõe, concretamente em relação às novas habitações: Deverá ter-se em conta as áreas definidas na Portaria nº500/97, de 21 de Julho, sendo que o projecto e a qualidade construtivas das habitações terão como referência as Recomendações Técnicas para Habitação Social [RHTS] e a demais regulamentação em vigor; 19- Por sua vez, o artigo 22º nº2 alínea b) II) do Programa de Concurso, igualmente aprovado pela deliberação suspendenda, valoriza as propostas que prevejam a entrega de imóveis com condições de alojamento superiores às exigidas; 20- Não podem, pois, os moradores do Bairro do A... invocar um fundado receio de que poderão vir a usufruir no futuro de piores condições de conforto e de habitabilidade das que actualmente usufruem.

O Ministério Público pronunciou-se [artigo 146º nº1 do CPTA] pelo não provimento do recurso jurisdicional.

A esta pronúncia não reagiram as partes.

De Facto São os seguintes os factos considerados provados na sentença recorrida: 1- A requerente é uma Instituição Particular de Solidariedade Social [ver documento 1 junto com o requerimento inicial]; 2- A requerente tem por objectivo contribuir para a promoção da população do Bairro do A..., freguesia de Lordelo do Ouro, Porto [ver artigo 2º dos Estatutos da Associação juntos aos autos a folha 294 e que aqui se dão por integralmente reproduzidos para todos os efeitos legais]; 3- Por deliberação camarária de 22.07.08, foi aprovada a proposta que constitui o documento 3 junto com o requerimento inicial que aqui se dá por reproduzida, na qual vem proposto o seguinte: “a) Alienar o conjunto dos prédios urbanos da esfera patrimonial privada do Município que integram o designado “Bairro do A...”, melhor identificados no Anexo I do Caderno de Encargos referido infra na alínea e]; b) Que a alienação dos prédios urbanos seja efectuada mediante prévio concurso público tendente à celebração de contrato para constituição de um fundo especial de investimento imobiliário fechado de subscrição particular e de promessa de permuta de imóveis, nos termos da legislação em vigor e de acordo com as disposições constantes do Programa de Concurso e Caderno de Encargos referidos infra na alínea c]; c) Aprovar os documentos disciplinadores do referido concurso público, anexos à presente proposta, a saber: Programa de Concurso, Caderno de Encargos e respectivos Anexos; d) Designar o Júri do concurso com a seguinte constituição...

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