Acórdão nº 00038/04.9BEPNF de Tribunal Central Administrativo Norte, 08 de Novembro de 2007
Magistrado Responsável | Dr. Antero Pires Salvador |
Data da Resolução | 08 de Novembro de 2007 |
Emissor | Tribunal Central Administrativo Norte |
Acordam no Tribunal Central Administrativo Norte – Secção do Contencioso Administrativo: I RELATÓRIO 1 . “V…, L.da”, com sede na Rua …, Figueira da Foz, veio interpor o presente recurso jurisdicional do acórdão do TAF de Penafiel, datado de 30 de Novembro de 2005, que julgou improcedente a acção administrativa especial, instaurada pela recorrente contra o MUNICÍPIO de PENAFIEL, onde pretendia ver anulada a decisão do Presidente da Câmara Municipal de Penafiel, que ordenava à recorrente que procedesse ao corte do silvado existente na sua propriedade, situada na Zona Envolvente à Vila Gualdina, Penafiel, para prevenir o potencial risco de incêndio, sob pena de, não o fazendo, lhe ser instaurado o respectivo processo de contra ordenação.
*** A recorrente apresentou alegações, findas as quais termina pela procedência do recurso jurisdicional, formulando, após convite deste Tribunal, as seguintes conclusões : 1ª-. “A sentença recorrida, de 30/11/2005, nunca poderá ser mantida, pois assenta num manifesto erro sobre os pressupostos de facto, numa errada qualificação jurídica dos factos e num erro de subsunção dos factos ao Direito.
Aceitando-se a bondade da Sentença recorrida quanto aos demais vícios do acto impugnado, persiste sempre um vício desse acto que impede a manutenção da Sentença recorrida que padece do mesmo vício: erro nos pressupostos de facto e de direito relativo à posição da própria Câmara Municipal de Penafiel quanto à propriedade deste terreno e que leva implícita a violação de direitos fundamentais da Recorrente, como os direitos constitucionalmente consagrados à proporcionalidade, justiça e imparcialidade dos actos da Administração Pública.
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Relativamente à factualidade relevante na decisão deste recurso, remete-se estou douto Tribunal para o Capítulo III da Sentença recorrida (fls. 267-271 dos autos), a fim de evitar desnecessárias repetições. No entanto, porque particularmente relevantes, importa referir os seguintes factos: (i) por um lado, o facto de, em 28 de Novembro de 1991, por Despacho do Vereador em regime de permanência, ter sido ordenado o embargo da obra que a Recorrente estava a construir nos referidos lotes, (ii) por outro lado, o facto da recorrente, desde 1991, não desenvolver qualquer actividade nos referidos lotes, nem aí manter quaisquer estaleiros ou outras instalações, em virtude daquele embargo e, (iii) por último, o facto de estar pendente uma acção declarativa de condenação (Processo nº 265/99, que corre termos no 1º Juízo do Tribunal de Penafiel) intentada pela Câmara Municipal de Penafiel contra a Recorrente, em que aquela Câmara Municipal de Penafiel, intitulando-se proprietária dos referidos lotes de terreno por reversão, requer que a Recorrente seja obrigada a reconhecer essa reversão (cfr. factos XX-XXII dados como assentes na Sentença recorrida).
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Assim, se, por um lado, a Câmara Municipal de Penafiel se afirma proprietária deste terreno e pretende ver reconhecido esse direito na referida acção declarativa (Processo nº 265/99, que corre termos no 1º Juízo do Tribunal de Penafiel), porque em Janeiro de 1994 ocorreu uma condição resolutiva da venda efectuada à Recorrente e porque, portanto, nessa data, (piso iure) os lotes de terreno ns. … e … da Zona Envolvente à Vila Gualdina, a título de proprietária do terreno, seja responsabilizada pela sua limpeza, o que representa, necessariamente, um manifesto e intolerável venire contra factum proprium por parte do acto impugnado, aceite e mantido na Sentença recorrida.
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Na verdade, se a Câmara Municipal de Penafiel se considera proprietária daqueles Lotes desde 1994, a responsabilidade da limpeza desse terreno em 2003 não pode deixar de ser sua, não fazendo qualquer sentido considerar-se que o corte do silvado possa ser imposto à Recorrente. A considerar-se o contrário, como o fez a decisão recorrida, deparamo-nos com uma situação absolutamente incongruente, injustificada e injusta.
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A Câmara Municipal de Penafiel, como entidade pública séria que se espera ser, deve actuar em conformidade com as suas pretensões e com aquilo que defende ser o seu direito de propriedade em relação àqueles lotes de terreno, sob pena de uma grave violação dos princípios do respeito e protecção dos direitos e interesses legalmente protegidos dos cidadãos, da justiça, imparcialidade e da boa-fé (arts. 4º, 6º e 6º-A do CPA e 266º-., nº-.2 da Constituição), princípios estes que a Sentença recorrida também não respeitou.
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Assim, como corolário deste princípio da boa fé, “a ninguém é permitido agir contra o seu próprio acto” (venire contra factum proprium), pelo que, a admitir-se a legalidade do acto administrativo impugnado, como entendeu a decisão recorrida, estará este douto Tribunal a permitir que a Câmara Municipal de Penafiel beneficie e aufira vantagens à custa da Recorrente (considerando esta propriedade do terreno) relativamente a uma situação que a própria Câmara Municipal de Penafiel entende e defende em Tribunal não ser assim (auto-intitulando-se como proprietária). Esta atitude contraditória e manipuladora dos factos da Câmara Municipal de Penafiel consubstancia um claro abuso de direito e da sua posição como entidade pública face aos administrados/particulares, o que é expressamente proibido na nossa Ordem jurídica (art. 334º- do Código Civil), pelo que a Sentença recorrida não pode ser mantida.
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Acresce que, a par da correspondente obrigação que impende sobre todos os cidadãos, também o Recorrido, Município de Penafiel, tem como especiais atribuições zelar pela saúde pública e ambiente, pelo que arrogando-se proprietária destes terrenos é a Câmara Municipal que deve proceder à sua limpeza, mantendo na sua esfera jurídica um eventual direito de regresso contra a Recorrente, no caso de a referida acção de reversão não ser procedente.
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Na verdade, a não se entender assim, como se fez na Decisão recorrida, deparamo-nos com uma situação absolutamente incongruente, injustificada e injusta, pois a Câmara Municipal de Penafiel não pode arrogar-se o estatuto de proprietária destes lotes de terreno quando estão em causa benefícios e vantagens que...
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