Acórdão nº 00245/04 de Tribunal Central Administrativo Norte, 29 de Junho de 2006

Magistrado ResponsávelFrancisco Rothes
Data da Resolução29 de Junho de 2006
EmissorTribunal Central Administrativo Norte
  1. RELATÓRIO 1.1 A Administração tributária (AT), na sequência de uma visita de fiscalização a ANTÓNIO (adiante Contribuinte, Impugnante ou Recorrente), entendeu que duas das facturas por este registadas na sua contabilidade do ano de 1991 como suporte documental de custos não correspondiam a serviços realmente prestados, motivo por que, desconsiderando tais custos, procedeu à correcção do rendimento colectável declarado, acrescendo-lhe o montante daquelas facturas.

O Contribuinte reclamou daquela fixação do rendimento colectável ao abrigo do disposto no art. 84.º do Código de Processo Tributário (CPT) e a Comissão de Revisão, indeferindo a reclamação, manteve o rendimento fixado, motivo por que a AT procedeu à liquidação adicional de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares (IRS) e respectivos juros compensatórios, do montante global de esc. 7.016.914$00.

1.2 O Contribuinte impugnou a liquidação alegando, em síntese, que as facturas correspondem a operações económicas reais – obras de construção civil de um cais de carregamento realizadas nas suas instalações e serviços de serralharia de transformação de contentores –, tendo ele suportado os respectivos custos mencionados naquelas facturas, motivo por que nada obsta à sua consideração como custos fiscais do exercício de 1991.

Concluiu pedindo que seja anulada a liquidação adicional.

1.3 A Juíza do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto julgou a impugnação improcedente.

Para tanto, considerou, em resumo, que a Impugnante não comprovou, como lhe competia, «a realização dos custos e que de facto as facturas emitidas se traduziam em verdadeiras transacções comerciais» (() As partes entre aspas e com um tipo de letra diferente, aqui como adiante, são transcrições.

).

1.4 Inconformado com essa sentença, o Impugnante dela recorreu para este Tribunal Central Administrativo Norte e o recurso foi admitido, a subir imediatamente, nos próprios autos e com efeito devolutivo.

1.5 O Recorrente apresentou as alegações de recurso, que resumiu em conclusões do seguinte teor: « A- A liquidação impugnada decorre de tributação por métodos indiciários e não de correcção técnica, como, por lapso, foi consignado no ponto A. do probatório, devendo corrigir-se a matéria de facto em conformidade; B- De acordo com o previsto nos arts. 38º do C.I.R.S., 78º e 81º do C.P.T., cabe à Administração Fiscal fundamentar a decisão de tributação por métodos indiciários, dentro do enquadramento previsto no art. 38º do C.I.R.S., demonstrando a verificação dos respectivos pressupostos; C- No caso em apreço, a nota de fundamentação da tributação por métodos indiciários não contém qualquer alusão aos factos elencados no nº 1 do art. 38º do C.I.R.S., nem justifica a impossibilidade de comprovação e quantificação directa e exacta da matéria tributável, vício que afecta o subsequente acto tributário de liquidação; D- No plano da fundamentação de facto, os pressupostos de que partiu a Administração Fiscal para recorrer à tributação por métodos indiciários, foram infirmados pela prova documental e testemunhal produzida nos autos, E- Porquanto, foi demonstrado e está assente na decisão que o impugnante realizou as obras de ampliação do cais de carregamento nas suas instalações em finais de 1991, coincidindo as mesmas com a descrição que consta das facturas postas em causa, F- E, bem assim, resulta ainda da prova inserta nos autos que, ao contrário do que sustenta a Administração Fiscal, a empresa em questão dispunha, nessa data, de meios técnicos capazes de executar a empreitada de construção civil acima referida, bem como, que os recibos emitidos a favor do impugnante se encontram assinados por um sócio-gerente daquela empresa, por confronto com a que se encontra aposta no documento de identificação deste; G- Daqueles factos resulta, salvo o devido respeito, a convicção de que foi a empresa emitente das facturas quem executou a empreitada descrita nas mesmas, ou, pelo menos, deles resultará a dúvida fundada sobre esta questão, prevista no art. 100º do C.P.P.T. e anteriormente no art. 101º do C.P.T.

[(() Trata-se de lapso de escrita. O Recorrente queria certamente referir o art. 121.º do Código de Processo Tributário.

)], posto que não é de exigir ao impugnante que no processo judicial prove factos que não teria de provar no procedimento tributário, tais como, a inexistência dos pressupostos de que depende a tributação por métodos indiciários, por essa prova caber à Administração Fiscal.

H- Ao decidir em sentido contrário, a sentença recorrida incorreu em erro de julgamento, violando o disposto nos arts. 38º, do C.I.R.S-, 78º e 81º do C.P.P.T., 23º, do C.I.R.C. e 100º, nº 1, do C.P.P.T., motivo por que deve ser revogada.

NESTES TERMOS, NOS MELHORES DE DIREITO E COM O SEMPRE MUI DOUTO SUPRIMENTO DE VOSSAS EXCELÊNCIAS, DEVERÁ SER CONCEDIDO PROVIMENTO AO PRESENTE RECURSO E, EM CONSEQUÊNCIA, REVOGADA A DECISÃO RECORRIDA, ASSIM FAZENDO VOSSAS EXCELÊNCIAS SÃ, SERENA E OBJECTIVA JUSTIÇA».

1.6 A Fazenda Pública não contra alegou.

1.7 Recebidos os autos neste Tribunal Central Administrativo Norte, foi dada vista ao Ministério Público e o Procurador-Geral Adjunto neste Tribunal emitiu parecer no sentido de que seja negado provimento ao recurso.

Para tanto, depois de salientar que «Carece […] de fundamento a alegação de que o rendimento colectável foi determinado por métodos indiciários», uma vez que «a Ad. fiscal mais não fez do que desconsiderar, para efeitos de custos com relevância fiscal, as quantias tituladas nas facturas, procedendo a simples correcções aritméticas (ou técnicas) dos valores declarados pelo impugnante», disse acompanhar «a fundamentação da matéria de facto e de direito expressa na douta sentença recorrida».

1.8 Foram colhidos os vistos dos Juízes adjuntos.

1.9 No presente recurso, as questões que cumpre apreciar e decidir são as de saber se a sentença recorrida: enferma erro de julgamento de facto – porque «A liquidação impugnada decorre de tributação por métodos indiciários e não de correcção técnica», como se refere no ponto A.

da sentença recorrida (cfr. conclusão A)); – por não ter dado como provado que, «ao contrário do que sustenta a Administração Fiscal, a empresa em questão [emitente das referidas facturas] dispunha, nessa data, de meios técnicos capazes de executar a empreitada de construção civil», «bem como que os respectivos recibos emitidos a favor do impugnante se encontram assinados por um sócio-gerente daquela empresa» (cfr. conclusão F)); – por não ter concluído «que foi a empresa emitente das facturas quem executou a empreitada referida nas mesmas» (cfr. conclusão G)); fez errado julgamento de direito – quando não considerou existir “dúvida fundada” quanto à questão da saber se «foi a empresa emitente das facturas quem executou a empreitada referida nas mesmas», em violação do disposto no art. 100.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT) (cfr. conclusão G)).

Deixaremos ainda uma nota sobre os motivos por que entendemos não ser de conhecer de questão alguma relacionada com a determinação da matéria tributável por métodos indirectos (cfr. conclusões A) a D)).

* * *2. FUNDAMENTAÇÃO 2.1 DE FACTO 2.1.1 Na sentença recorrida o julgamento de facto foi efectuado nos seguintes termos: «MATÉRIA DE FACTO Da análise dos elementos contidos nos autos, documentos, informações oficiais e depoimentos resulta provada a seguinte factualidade: A. Os Serviços de Prevenção e Inspecção Tributária (SPIT) procederam à análise da contabilidade do impugnante em sede de imposto sobre o rendimento das pessoas singulares (IRS) e, nessa sequência, foram-lhe efectuadas correcções técnicas de acordo com a nota de fundamentação de fls. 12: "A firma Rodestrada - Empresa de Construções e Rodovias, Lda. requereu o processo de recuperação de empresas que foi indeferido, vindo posteriormente, em 20/09/90, a ser decretada falência pelo Tribunal de Matosinhos. Não existem registos nos livros selados com data posterior a 29/02/88, assim como não existem registos auxiliares da contabilidade. Nesta data, segundo informações do administrador da massa falida, foram apreendidos os bens da firma, conforme Autos de arrolamento anexos ao processo existente no referido Tribunal. Para isso procederam à mudança de fechadura do escritório da firma situado na Rua do Tronco, 771 r/c esq. S. Mamede Infesta, que é simultaneamente a sede da firma; apreendendo assim os documentos existentes a essa data nas referidas instalações. Quanto às maquinas, as que se encontravam no estaleiro da empresa ficaram imediatamente à guarda e responsabilidade do administrador da massa falida, as que se encontravam nas obras foram entregues à sua guarda até cerca de dois meses passados da data da falência.

Temos assim que a referida firma estava legalmente inibida de exercer qualquer actividade comercial ou industrial e estava por outro lado carenciada de meios técnicos para a exercer.

Verifica-se ainda que o sujeito passivo objecto de análise não estabeleceu quaisquer relações comerciais com a Rodestrada - Empresa de Construções e Rodovias, Lda., para além das duas facturas contabilizadas constantes da referida ficha de fiscalização, que a seguir se discriminam: - Factura nº 320 de 31/12/91 no valor total de 8.938.800$00 (serviços prestados 7.640.000$00, IVA 1.298.800$00) - Factura nº 325 de 31/12/91 no valor total de 4.557.150$00 (serviços prestados 3.895.000$00, IVA 662.150$00) Foi declarado conforme fotocópia de Auto de declarações (anexo 1) pelo sujeito passivo que os pagamentos das referidas facturas foram efectuados em numerário.

Questionado António sobre a existência de qualquer documento referente à empreitada (caderno de encargos, etc.) que originou a emissão das referidas facturas foi-nos dito que não foi elaborado qualquer documento, e não se lembrar do nome da pessoa com quem foi tratado o negócio.

Da verificação dos factos acima descritos resulta serem as referidas facturas indiciadas como...

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