Acórdão nº 0922/08 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 22 de Abril de 2009

Data22 Abril 2009
Órgãohttp://vlex.com/desc1/1541_01,Supremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam, em conferência, os juízes da Secção de Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo: I- RELATÓRIO A..., com os sinais dos autos, veio interpor recurso da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Lisboa, proferida a fls. 68 e segs. dos autos, que julgou improcedente o presente recurso contencioso de anulação da decisão final proferida em 14.03.2003, pelo Vice- Presidente da Câmara Municipal de Cascais, que determinou a demolição de muro edificado, sem licença.

Termina as suas alegações, formulando as seguintes CONCLUSÕES:

a) O ora recorrente não foi notificado da junção ao processo administrativo da informação prestada a fls. 69, nem do teor da planta cadastral de fls.68, posteriores à tomada de decisão final no processo administrativo e à respectiva notificação efectuada ao ora recorrente.

b) Só em sede de notificação da presente sentença tomou o recorrente conhecimento de tais documentos.

c) Sendo certo que foi com base nesses documentos que resultou provado nos autos que o muro edificado atravessa parte da parcela do domínio público.

d) Tal configura uma modificação do objecto/teor da decisão final, sobre a qual não teve qualquer possibilidade de se pronunciar, devendo tê-lo sido.

e) Pelo que se verifica a violação dos artº 8º e 66º do CPA, 517º do CPC e 268º, nº3 da CRP.

f) O ora recorrente alegou e provou documentalmente que se encontrava a correr termos na Câmara Municipal de Cascais, sob o nº15.188/02, processo de licenciamento do muro objecto da decisão final.

g) Não obstante tal prova, não foi o mesmo dado como provado, quando o deveria ter sido.

h) Ao omitir tal facto, a douta decisão em apreço violou o artº511º do CPC.

i) O MMo. juiz a quo entendeu como provado que «o recorrente viu indeferidos anteriores projectos de legalização apresentados junto da entidade recorrida (al.O).

j) Ora, tal não corresponde à verdade, como resulta documentalmente dos próprios autos, sendo tal facto deficientemente formulado, violando o artº511º do CPC.

k) A decisão final impugnada não tomou em consideração o processo de legalização nº15188/02 em curso na Câmara Municipal de Cascais, quando o deveria ter feito, nem o tomou a douta sentença em recurso.

l) Ora a emissão de um juízo de susceptibilidade de legalização tem de anteceder a prática do acto de demolição, ou sito de outra forma, constitui um dos seus pressupostos, a que vinculadamente tal acto se acha adstrito.

m) Pelo que, ao não tomar em consideração tal processo de legalização e ao ordenar a demolição foi violado o artº165º, n2 RGEU e ainda os princípios da necessidade, adequação, indispensabilidade ou menor ingerência possível da administração.

n) Ao entender diversamente, a douta sentença em apreço enferma de erro de julgamento por errada interpretação dos artº165º e 167º RGEU, além da violação dos artº supra referidos, pelo que deve ser revogada e substituída por outra que, concedendo provimento ao recurso, anule o acto recorrido, assim se fazendo a costumada JUSTIÇA.

*Contra-alegou a recorrida, CONCLUINDO assim.

A- O alegado vício de violação de lei que o recorrente imputa ao acto impugnado não pode ser apreciado na presente sede, devendo ter sido alegado pelo recorrente antes de proferida a sentença.

B- Quanto ao facto de o Tribunal não ter dado como provado que se encontrava a correr na Câmara Municipal de Cascais, sob o nº 15.188/02, processo de licenciamento do muro objecto da decisão final, verifica-se que tal aconteceu por lapso, sendo tal processo de licenciamento por diversas vezes referido, nomeadamente na pág.8 da sentença posta em crise.

C- Quanto à questão de a sentença ter considerado como provado que o recorrente viu indeferidos anteriores projectos de legalização apresentados junto da entidade recorrida, quando - segundo alega o recorrente - apenas foi indeferido um projecto de legalização, estando outro pendente, refira-se que tal é manifestamente irrelevante para a questão que nos ocupa, não tendo tido nenhuma influência na decisão da causa o facto de terem sido indeferidos vários ou apenas um projecto de legalização.

D- Nos termos dos artº 165º e 167º do RGEU, a demolição de obras executadas em desconformidade com o disposto nos artº1º a 7º deste diploma poderá ser evitada se a entidade competente reconhecer que a obra já edificada ilegalmente +e susceptível de vir a satisfazer os requisitos legais e regulamentares de urbanização, de estética, da segurança e salubridade dos edifícios, atendendo à finalidade para que foram construídos.

E- Note-se que, conforme refere o Tribunal, o instituto da legalização de obras, ao tempo do RGEU, era entendido como um poder discricionário da Administração.

F- Por outro lado, atendendo ao facto que o Tribunal deu como provado na alínea N) da sentença recorrida, isto é, que "o muro edificado atravessa parte da parcela de domínio público" (cfr. Pág. 7 da sentença) facilmente concluímos que não se verificam os pressupostos estabelecidos para a possibilidade de legalização da obra, pelo que outra decisão por parte da Câmara Municipal seria, inclusivamente, ilegal.

*O Digno PGA junto deste STA renovou o parecer do MP de fls. 143 e seg, e que é do seguinte teor: «Pretende o Recorrente a revogação da sentença e a consequente anulação do acto administrativo impugnado.

Imputa à sentença a violação : dos artº 8º e 66º do CPA, 517º do CPC e 268º nº3 da Constituição, por terem sido juntos ao processo administrativo documentos após a decisão administrativa impugnada e sua notificação ao R., tendo sido com base nesses documentos que a sentença julgou provado que o muro mandado demolir ocupa parcialmente terreno do domínio público municipal; do artº511º do CPC por não ter sido dado como provado que estava pendente o processo nº15188/02 de licenciamento do muro em causa, facto esse alegado e provado e ter sido dado como provado que várias vezes haviam sido apreciados pedidos de legalização daquele muro, quando tal sucedeu apenas uma vez e por razões que não afectam o pedido pendente; do artº165º, nº2 do RGEU e princípios da necessidade, adequação, indispensabilidade ou menor ingerência possível da Administração.

A sentença foi proferida após a tramitação processual adequada, incluindo a observância do contraditório - o que o R. também não questiona neste âmbito. O que importa para assegurar a regularidade do processo judicial é que as provas consideradas pela sentença tenham sido produzidas de acordo com os princípios e as regras aqui aplicáveis, nada obstando a que sejam considerados documentos constantes do processo administrativo, ainda que ali adquiridos em momento posterior à emissão do acto contenciosamente impugnado.

É certo que a propósito da fundamentação sob a epígrafe "De FACTO", não aparece enumerado como provada a pendência do processo de legalização. Porém, esse facto é considerado como assente a propósito da fundamentação "DE DIREITO", onde se diz «Consta do probatório que o R., com vista a obviar à demolição do muro, apresentou um pedido de legalização do muro e a suspensão da execução da decisão final de demolição até que esteja findo o processo de legalização".

"Ora, o que é posto em causa pelo Recorrente consiste em saber se poderia a Autoridade Recorrida produzir o acto e mantê-lo validamente na ordem jurídica, nos exactos termos em que o foi, encontrando-se ainda pendentes o processo de legalização, com a possibilidade de legalização do muro vir a ser legalizado".

"..." "...Importa apenas apreciar se, estando pendente o já referido processo de legalização, torna o acto praticado ferido de vício de violação de lei." E conclui a sentença que não foi violado o artº58º nº1 do DL 445/91, de 20.11 (que considerou vigente à data do acto), por o muro ter sido edificado sem licença e ter sido ouvido o interessado, além de que não poderia ser legalizado por ocupar parcialmente terreno do domínio público municipal.

Não é, pois, verdade que não tenha sido dado como provada a pendência do processo de legalização, mas apenas que tal facto não foi elencado a propósito da matéria de facto - o que certamente se ficou a dever a lapso irrelevante, porquanto foi esse facto considerado na aplicação do direito.

Por outro lado, apesar de ter razão o Recorrente quanto...

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