Acórdão nº 0698/08 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 02 de Abril de 2009

Data02 Abril 2009
Órgãohttp://vlex.com/desc1/1541_01,Supremo Tribunal Administrativo (Portugal)

ACORDAM NA SECÇÃO DO CONTENCIOSO ADMINISTRATIVO DO STA - 2ª Subsecção: 1 - B..., LDA, id. a fls. 2, intentou, no Tribunal Administrativo do Circulo do Porto, contra o ESTADO PORTUGUÊS acção para efectivação de responsabilidade civil extracontratual, pedindo a condenação do réu no pagamento à A. da quantia de 240.000,00 € a título de danos patrimoniais sofridos, acrescida de uma indemnização a liquidar em execução de sentença devida pelos gastos que vier a efectuar na sua defesa e por causa da sua defesa, e ainda no pagamento de uma indemnização por danos não patrimoniais, de montante não inferior a 240.000,00€.

2 - Por sentença de 31.03.2008 (fls. 329/362), o Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, julgou a acção parcialmente procedente e em conformidade condenou o réu a pagar à autora a indemnização global de 260.000,00 € (duzentos e sessenta mil euros), sendo €240.000,00 a título de danos patrimoniais e 20.000,00 €, por danos não patrimoniais.

3 - Inconformado, recorre o Estado Português para este Supremo Tribunal apresentando alegações com as seguintes CONCLUSÕES: I - A obrigação de indemnizar decorrente da responsabilidade civil do Estado por actos ilícitos de gestão pública, depende da observância cumulativa dos pressupostos da responsabilidade civil geral: o facto, a ilicitude, a imputação do facto ao lesante, o prejuízo ou dano e o nexo causal entre este e o facto.

II - Na colheita de amostras oficiais para pesquisa de substâncias e resíduos de administração proibida, nos termos do DL nº 148/99, de 4 de Maio, os matadouros ou outras estruturas habilitadas a dispor dos animais estão obrigados a colaborar com as autoridades sanitárias, devendo nomeadamente esclarecê-las, com verdade, da proveniência dos animais.

III - Tendo-se efectuado, em 3 de Junho de 2002, no matadouro C..., em Guimarães, uma colheita de amostra de frango, cujo auto, além de mencionar que o animal era proveniente da exploração B..., foi instruído com declaração firmada pelo gerente da sociedade proprietária do matadouro, a atestar aquela mesma proveniência, têm-se por satisfeitas as exigências de zelo e diligência que impendiam sobre os funcionários higio-sanitários na averiguação da proveniência do animal.

IV - Se, em consequência da detecção, naquela amostra, de substâncias de utilização proibida, a exploração B... vem a ser colocada sob controlo oficial, e mais tarde não se logra fazer prova de que a amostra fora colhida em animal proveniente da exploração B..., não pode o Estado ser responsabilizado pelos prejuízos daí resultantes, dado não estar preenchido um daqueles requisitos (culpa), de cuja observância cumulativa emerge a obrigação de indemnizar.

V - É ao lesado que incumbe a prova da culpa do autor da lesão, a menos que contra este milite presunção legal de culpa.

VI - A douta sentença decidiu-se pela prova da culpa do Estado com base nessa presunção, no caso inexistente.

VII - Ainda que porventura ficasse provada a culpa do Estado, a circunstância de se ter constatado nos autos, antes de proferida sentença, que o gerente do matadouro que fizera e firmara aquela declaração de proveniência, era e é também gerente da lesada B..., impunha-se a ponderação da questão da concorrência de culpas e o julgamento nessa base, o que não foi feito.

VIII - O cômputo dos danos patrimoniais, por lucros cessantes, foi obtido na pressuposição de que estava garantida a ocupação plena da exploração pelo período de um ano subsequente ao sequestro, o que, salvo melhor opinião, não encontra apoio nos elementos probatórios disponíveis, que apenas apontam para uma ocupação a cerca de 50% da capacidade da exploração e durante um período de dez meses.

IX - Às sociedades comerciais não são reconhecidos os direitos e obrigações que sejam inseparáveis da personalidade singular, não sendo, pois, portadoras de personalidade moral e consciência ética susceptíveis de afectação por sofrimentos, dores, perturbações, desânimos, revolta, desconsiderações e outras ofensas de incidência psicossomática e não podendo, consequentemente, ser objecto de danos não patrimoniais.

X - A quebra de imagem e a ofensa do bom nome de uma sociedade comercial, resultantes de facto ilícito, reconduzem-se a danos de índole patrimonial, pelo que, no caso, não havia lugar à fixação de indemnização por danos não patrimoniais.

XI - Ao condenar o Estado e ao arbitrar a indemnização a favor da A. nos moldes em que o fez, a douta sentença violou: os artigos 2°, n° 1 e 4º nº 1 do DL nº 48.051, de 21 de Novembro de 1967; os artº 483° nº 1 e 2, 487°, nº 1 e 2, 342º a 572º, 564º nº 1, 496º nº 1 e 160º nº 2 do Código Civil e ainda o artº 12°, n° 2, do DL nº 184/99, de 4 de Maio.

XII - Termos em que, no provimento do recurso, deve a douta decisão em crise ser revogada e substituída por outra que absolva o Estado do pedido, por falta de um dos requisitos de que emerge o dever de indemnizar.

XIII - Caso assim se não entenda, deve então o litígio ser dirimido na base da concorrência de culpas, com culpa principal da autora, o que conduz à exclusão da indemnização ou à redução drástica do seu montante, a fixar por referência a um lucro cessante nunca superior a 100.000,00 €.

4 - Em contra-alegações, a recorrida sustenta a manutenção do decidido na sentença recorrida.

+ Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.

+ 5 - A sentença recorrida deu como demonstrada a seguinte MATÉRIA DE FACTO: A) - No dia 26 de Fevereiro de 2003, pelas 11 horas, a representante da Direcção Regional de Agricultura de Entre Douro e Minho, Sra. Dra D..., notificou a Autora, na sede desta, do sequestro dos pavilhões do núcleo das E... e do pavilhão n° 8 do núcleo de F... (pavilhão n° 1, na anterior numeração), pertencentes à Autora; B) - E efectuou uma visita aos pavilhões sequestrados, tendo constatado que os pavilhões do núcleo das E... se encontravam vazios; C) - No núcleo de F..., quando a referida representante do Ministério da Agricultura procedeu ao sequestro do pavilhão n° 8, este tinha cerca de 30.000 frangos, tendo retirado "amostras de água" e "amostras de rações" dos pavilhões n°s 6, 7 e 8 e "amostras de água" do pavilhão n° 1, para análises e pesquisas de nitrofuranos; D) - No dia 28 de Fevereiro de 2003, pelas 16 horas, a referida Sra. Dra. D..., notificou novamente a Autora, comunicando-lhe que todos os pavilhões do núcleo de F... se encontravam sob sequestro e já não apenas o pavilhão nº 8; E) - O sequestro dos pavilhões da Autora foi ordenado pelo Director Geral de Serviços de Higiene Pública Veterinária, conforme comunicação n° 220/DIS de 10 de Fevereiro de 2003 dirigida ao Director Regional da Agricultura de Entre-Douro e Minho/DSV, e com os seguintes fundamentos: "Tendo em consideração o boletim de análise do LNIV n° HP-02-04184/BR/02 de 17/10/02, foi detectado resíduos de nitrofuranos (Furaltadona) em carnes de frango, cuja amostra foi colhida por estes serviços, em 03/06/02, no matadouro n° D - 565 - C..., Limitada, sito na Quinta do ..., S. João da Ponte, Guimarães.

Atendendo que se trata de um tratamento ilegal previsto no artigo 13°, n° 1 do artigo 17° do Capítulo IV, e no n° 6, do Grupo A, do Anexo I, do Decreto-Lei n° 148/99, de 4 de Maio e do artigo 14° do Regulamento (CE) n° 2377/90 do Conselho, de 26 de Junho, solicito a VªExª que mande proceder: a) Ao imediato sequestro da exploração citada em epígrafe; F) - Dou aqui por totalmente reproduzido o teor do Boletim de Análise n° HP-02-041 841/BR/02, datado de 2002/10/28, com o resultado "pesquisa de resíduos totais de nitrofuranos positiva", "Furaltadona (resíduo marcador AMOZ) positiva", efectuado pelo Laboratório Nacional de Investigação Veterinária, cuja cópia se encontra junta aos autos a fls. 64; G) - Com a notificação do sequestro, a Autora foi advertida de que não poderia vender, trocar, ou por qualquer forma alienar, nem introduzir nenhum animal na propriedade, até ulterior resolução da Direcção Regional de Agricultura de Entre-Douro e Minho; H) - No dia 20 de Março de 2003, a Autora foi notificada, por telecópia da Direcção de Serviços de Veterinária de Braga da Direcção Regional da Agricultura de Entre-Douro e Minho do levantamento do sequestro, nos termos seguintes: "Face aos resultados das análises para pesquisa de nitrofuranos (efectuadas na ração de bebida e frangos dessa exploração) terem resultado negativas, é pelo presente anulado o sequestro imposto à exploração, considerando-se a mesma a partir da presente data em livre prática" I - Os resultados das análises para pesquisa de nitrofuranos, levadas a efeito pelos Serviços competentes do Ministério da Agricultura, nas amostras de (ração, água de bebida e frango) colhidas nos pavilhões da Autora, revelaram total ausência daquele produto, e por isso foi ordenado o levantamento do sequestro, no...

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