Acórdão nº 0894/07 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 26 de Março de 2009

Data26 Março 2009
Órgãohttp://vlex.com/desc1/1541_01,Supremo Tribunal Administrativo (Portugal)

A... intentou, neste Supremo Tribunal, a presente acção administrativa especial contra o Conselho Superior do Ministério Público pedindo a declaração de ilegalidade da sua deliberação, de 20/06/2007, que indeferiu a reclamação deduzida contra a decisão da sua Secção Disciplinar, de 19/07/2006, que lhe aplicou a pena de um ano de inactividade.

Alega que a mesma padece dos seguintes vícios: - ter o processo onde foi aplicada sido instaurado já depois de prescrito o respectivo procedimento.

- ter sido aplicada sem que tivesse havido instrução ou recolha de prova legalmente relevante.

- ter sido omitida a indicação da pena aplicável na acusação.

- ter havido erro na apreciação dos elementos susceptíveis de justificar a punição - ter havido violação do princípio da proporcionalidade.

O Conselho Superior do M.P. contestou para defender que a acção deveria ser julgada improcedente uma vez que não só não se verificava a alegada prescrição do procedimento disciplinar como também que aquela deliberação não sofria das ilegalidades que lhe eram imputadas.

Notificadas, ambas as partes exerceram o direito alegar.

O Autor rematou as suas alegações da seguinte forma: I. O processo disciplinar que deu origem ao acto impugnado foi aberto já após ter ocorrido a prescrição da faculdade de proceder à sua instauração.

II. Em conformidade com o n.º 2 do artigo 4.º do Decreto-Lei n.º 24/84, de 16/01, o direito de instaurar o processo disciplinar prescreve se, conhecida a falta pelo dirigente máximo do serviço, não for instaurado o competente procedimento disciplinar no prazo de três meses.

III.

O relatório referido no ponto 2.c das presentes alegações (relativo à matéria de facto), foi elaborado pelo senhor instrutor em 28/02/2002, propôs o arquivamento dos autos, e deu entrada nos serviços do CSMP na Procuradoria-Geral da República no dia 1 de Março de 2002 IV.

Só mais de um ano depois, em 12 de Março de 2003, o Conselho Superior do M.P. se pronunciou sobre tal relatório, recusando o arquivamento proposto, requalificando a sanção abstractamente aplicável, afastando a amnistia e convertendo o inquérito em processo disciplinar.

V. O Conselho Superior do M.P. reuniu várias vezes após a recepção do relatório elaborado pelo senhor instrutor, pelo que é evidente a prescrição da faculdade de instaurar o processo disciplinar.

VI.

Em 26 de Março de 2004, na sequência de diligências promovidas pelo arguido, o Conselho Superior do M.P. declarou a nulidade da sua deliberação de 17 de Setembro de 2003 (que havia convertido o inquérito em processo disciplinar determinando o aproveitamento da instrução), «[...] e que sejam praticados os actos de instrução necessários ao apuramento dos factos, devendo ser assegurado ao arguido a sua audiência como garantia de defesa, antes da conclusão da instrução».

VII.

Manteve-se apenas a deliberação de 12 de Março de 2003, em que se decidiu tão só a conversão do inquérito em processo disciplinar, sem qualquer referência ao aproveitamento como instrução das diligências realizadas durante o inquérito, tomando-se evidente a nulidade decorrente de violação do artigo 214.º do Estatuto do Ministério Público, como oportunamente invocado pelo senhor instrutor.

VIII.

Depois disso não ocorreu nenhuma instrução ou recolha válida de provas, para além do interrogatório do arguido e do depoimento da testemunha B....

IX.

Tal constitui nulidade insanável nos termos da alínea d) do artigo 119.º do Código do Processo Penal aplicável por remissão do artigo 216.º do Estatuto do M.P.

X. O acto impugnado é, ainda, inválido porque a acusação notificada ao arguido não continha qualquer indicação quanto à pena aplicável.

XI.

Embora o n.º 1 do artigo 197.º do Estatuto do Ministério Público não faça expressamente referência às penas aplicáveis como acontece com o n.º 4 do artigo 59.º do Decreto-Lei n.º 24/84, de 16/01, parece óbvio que a indicação das penas aplicáveis constitui requisito da acusação devendo a primeira regra ser integrada pela segunda, dada a inexistência de contrariedade.

XII.

Efectivamente, o mero facto de se não indicar na acusação a pena aplicável impede o exercício do direito de defesa por parte do arguido já que independentemente da existência da infracção vários factores concorrem para a determinação da espécie de sanção e da sua medida.

XIII.

A aplicação da pena de inactividade ao autor constitui uma violação óbvia do princípio da proporcionalidade. Essa violação resulta agravada porque nem sequer foram provados os factos que subjazem à imputação das faltas disciplinares.

XIV.

O autor vem punido por duas supostas infracções disciplinares correspondentes ao chamado "caso C..." (inquérito n.º ....) e ao chamado "caso D..." (processo administrativo ... e outros).

XV.

No caso "C...", o autor recebeu ordem por escrito, por parte do seu superior hierárquico, para que fosse deduzida acusação, devendo, para tanto, o processo baixar à delegação. Ora, o autor, embora tenha defendido a justeza do seu despacho de arquivamento cumpriu imediatamente tal ordem, determinando a remessa do processo à delegação para acusação, o que aconteceu.

XVI.

Não houve, pois, desobediência a qualquer ordem hierárquica.

XVII.

No caso "D...", depois de o autor se ter pronunciado pela inviabilidade das acções de anulação, recebeu, então sim, ordem para proceder à recolha de elementos adicionais tendo em vista a correspondente interposição. A tal ordem respondeu, fundamentando devidamente a sua resposta, que não vislumbrava que diligências úteis poderia realizar e ficando a aguardar novas ordens e instruções.

XVIII.

Na sequência, foi-lhe perguntado pela hierarquia se objectava ou não de consciência jurídica. A tal pergunta respondeu afirmativamente (de novo), fundamentando também uma vez mais a sua posição.

XIX.

Uma vez mais, não existiu qualquer desobediência a ordens da hierarquia.

XX.

As decisões adoptadas pelo autor quer no caso "C..." quer no caso "D..." foram motivadas, exclusivamente, pela apreciação jurídica das situações, decorrente do estudo e da reflexão sobre as questões então em causa. O tempo veio dar razão ao autor.

XXI.

O autor não infringiu os deveres zelo, obediência e lealdade, pelo que a decisão impugnada é inválida por erro sobre os pressupostos de facto, devendo ser anulada nos termos do artigo 135.º do CPTA.

XXII.

Não estão reunidos os pressupostos fixados no artigo 183.º do Estatuto do Ministério Público para a aplicação da pena disciplinar de inactividade, assim se evidenciando a invalidade do acto por violação de lei. Também por esta razão deve, portanto, ser anulado.

XXIII.

É manifesto que a sanção aplicada ao autor viola o princípio da proporcionalidade em todas as suas vertentes: necessidade, adequação, equilíbrio.

O Conselho Superior do M.P.

, por seu turno, formulou as seguintes conclusões: 1.

O Autor pretende a declaração de nulidade da deliberação impugnada que decorre na sua tese: a) da ausência de instrução ou recolha probatória legalmente relevante e b) da omissão da indicação, na peça acusatória, da sanção proposta. Além disso, 2.

Defende a anulação do acto que constitui o objecto da Acção, fazendo assentar a sua invalidade: a) na prescrição do direito de instaurar procedimento disciplinar; b) no erro manifesto na apreciação dos elementos susceptíveis de justificar a aplicação da pena disciplinar de "INACTIVIDADE" operado pelo acto punitivo, na medida em que retira conclusões que não pode retirar, erro esse que equivale a violação de lei e c) na violação do princípio da proporcionalidade. Mas sem razão.

  1. Após a declaração de nulidade da deliberação do CSMP de 17/09/2003 - que converteu o inquérito instaurado para averiguação da responsabilidade disciplinar do Autor em processo disciplinar, com aproveitamento como actos de instrução das diligências realizadas na fase de inquérito - procedeu-se, por determinação do CSMP de 26/03/2004 à pertinente instrução do processo, tendo sido realizadas todas as diligências de prova relevantes, desde logo as requeridas pelo Autor, que foi ouvido.

  2. Não se vê, pois, como pode proceder a invocada nulidade, a qual só ocorre em relação a actos que a lei prescreve como actos obrigatórios, designadamente os referidos nos artigos 191.°, n.º 2, e 204.°, n.º 1, ambos do Estatuto do Ministério Público (EMP), 5.

    Preceitos estes que foram observados na situação em mérito. Por outro lado, 6.

    A omissão na peça acusatória da sanção proposta não constitui nulidade: a norma do artigo 197° do EMP não impõe a expressa menção da pena aplicável, a qual está obrigatoriamente reservada para o Relatório previsto no artigo 202° daquele Estatuto, QUE A CONTÉM. Por isso 7.

    O ACTO IMPUGNADO NÃO PADECE DE QUALQUER DAS NULIDADES QUE O AUTOR LHE APONTA.

  3. O DIREITO DE INSTAURAR PROCEDIMENTO DISCIPLINAR pelo decurso do prazo abreviado de três meses previsto no art.º 4°, n.º 2, do Estatuto Disciplinar dos Funcionários e Agentes da Administração Central, Regional e Local (ED) aprovado pelo D. L. n.º 24/84, de 16/01, NÃO ESTÁ PRESCRITO.

  4. O TERMO INICIAL DO PRAZO ABREVIADO DE 3 MESES contemplado no artigo 4° n.º 2 do ED É O DO MOMENTO DO CONHECIMENTO DA FALTA PELO CSMP, enquanto órgão colegial e DIRIGENTE MÁXIMO DO SERVIÇO, com competência para determinar a conversão de inquérito em processo disciplinar - cfr. art.º 214° nºs 1 e 2 do EMP.

  5. Esse conhecimento é, no caso em presença, contemporâneo da decisão de instaurar procedimento disciplinar - 12 de Março de 2003 - neste sentido cfr. Acórdão do STA de 23/05/2006 que apreciou situação idêntica. Além disso 11 O Acórdão que o Autor cita na sua CONTESTAÇÃO debruçou-se sobre uma ocorrência que não é comparável à sua e que não permite, por isso, a importação da doutrina que dele emana para o caso em presença. Acresce que 12.

    Nesse próprio Acórdão é ressalvada expressamente a situação que arranque ou decorra de apreciação do mérito funcional dos Senhores Magistrados e da atribuição de classificações de serviço, em particular a de "MEDÍOCRE", a...

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