Acórdão nº 0135/09 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 19 de Março de 2009

Magistrado ResponsávelPIMENTA DO VALE
Data da Resolução19 de Março de 2009
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam nesta Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo: 1 - A..., Lda, melhor identificada nos autos, não se conformando com a sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga que julgou improcedente o recurso que interpôs da decisão do Director-Geral dos Impostos, que autorizou o acesso directo às suas contas e documentos bancários, dela vem interpor o presente recurso, formulando as seguintes conclusões: 1ª Nos presentes autos considera a Recorrente que se verifica uma nulidade processual, só por si conhecida com a notificação da douta sentença ora recorrida.

  1. A nulidade em causa decorre do facto da Recorrente ter arrolado três testemunhas (o que vem sendo permitido pela jurisprudência - cfr., por exemplo, o ac. do STA de 07.11.2007, no proc. n° 0590/07) e protestado a junção de diversos documentos, dado o seu grande número, não tendo, contudo, podido produzir esta prova, especialmente a testemunhal, sem que exista nos autos prévio despacho interlocutório a justificar tal decisão.

  2. A nulidade invocada, para além de violar expressamente normas legais (artigos 113°/n°s. 1 e 2 do CPPT e 3°/n° 3 do CPC), viola o princípio do contraditório, e deve ser arguida com o recurso da sentença que a revelou, conforme jurisprudência dominante.

  3. A declaração de nulidade da nulidade ora arguida implica a anulação de todo o processado posterior, incluindo a sentença proferida, nos termos do artigo 201°/n° 2 do CPC.

  4. Sem prescindir quanto à invocada nulidade processual, considera ainda a Recorrente que ocorre falta de fundamentação do acto recorrido, já que o mesmo não se fazia acompanhar da informação técnica em que se baseou, o que determina a sua ineficácia.

  5. O recurso ao mecanismo previsto no artigo 37° do CPPT é mera faculdade da contribuinte, e não sua obrigação; entendimento contrário violará o disposto nos artigos 268°/n° 3 e 20°/n° 1 da CRP, por transformar um direito do contribuinte (à fundamentação do acto) num dever.

  6. A douta sentença recorrida violou, nesta parte, os artigos 36°/n° 2 do CPPT e 77°/n° 6 da LGT, o artigo 37° do CPPT, e, quanto a este, com a interpretação defendida, os artigos 268°/n° 3 e 20°/n° 2 da CRP.

  7. Considera, ainda, a Recorrente que nas situações de levantamento administrativo do sigilo bancário, não é legalmente admissível a fundamentação por remissão, designadamente para informações técnicas, o que se justifica dada restrição do direito à intimidade da vida privada, consagrado no artigo 26°/n° 1 da CRP.

  8. Ao decidir de modo contrário a este entendimento, violou a sentença recorrida o disposto nos artigos 63°-B/n° 4 do CPPT e 26°/n° 1 da CRP.

A Fazenda Pública contra-alegou nos termos que constam de fls. 132 e seguintes, que se dão aqui por integralmente reproduzidos para todos os efeitos legais, para concluir do seguinte modo:

  1. A aliás, douta sentença recorrida, ao ter considerado que na informação prestada pela AT se descrevem os factos concretos e que indiciam fortemente que a recorrente terá incorrido no crime de fraude fiscal e de que as declarações fiscais que efectuou não é verdade, fez uma correcta interpretação e aplicação da lei aos factos, motivo pelo qual deve ser mantida.

  2. Assim, em primeiro lugar, não foi omitida qualquer formalidade que a lei prescrevesse para o tipo de processo em causa ou, ainda que, sem conceder, o fosse, nos termos da lei, cfr. art. 201° do CPC, a mesma só produz nulidade quando a lei o declare ou quando a irregularidade cometida possa influir no exame ou decisão da causa.

  3. Quanto à produção de prova testemunhal, tratando-se de um processo urgente, está especialmente regulado para este tipo de processo que os elementos de prova a apresentar pelo contribuinte que pretenda recorrer da decisão da administração tributária que determina o acesso directo à informação bancária que lhe diga respeito, devem revestir natureza exclusivamente documental, cfr. n° 3 do art. 146°-B do CPPT. Pelo que, não cabia ao Mm° Juiz "a quo" mandar proceder à produção de qualquer prova testemunhal.

  4. E, quanto à prova documental, o mesmo n° 3 do art. 146°-B do CPPT, também refere que a petição deve logo ser acompanhada dos respectivos elementos de prova, o que bem se compreende atenta a natureza urgente do processo de derrogação de sigilo bancário e o curto prazo, de 10 dias, de que o recorrente dispõe para, pretendendo, recorrer da decisão da AT.

  5. Por outro lado, a omissão de um acto ou de uma formalidade que a lei prescreva, para além dos casos em que a lei o determine, só produz nulidade quando a irregularidade cometida possa influir no exame ou na decisão da causa.

  6. Ora, atento o conteúdo da decisão proferida, há que concluir que a existir, sem conceder, qualquer irregularidade, a mesma nunca influiria no exame ou na decisão da causa, uma vez que, é por demais evidente, que o Mm° Juiz "a quo" face ao ónus que impende sobre a AT e, face aos factos por esta carreados para o processo, sempre concluiria, tal como ela, pela suficiência dos mesmos factos, como indicadores da utilização de facturas falsas por parte da recorrente e da falta de veracidade do por si declarado.

  7. Em segundo lugar, a sentença ora recorrida ao ter julgado improcedente o invocado, pela recorrente, vício de falta de fundamentação, por constar da informação da inspecção, detalhadamente descritas, as situações concretas e razões que justificam o acesso aos documentos bancários da recorrente, assim como os fundamentos de direito em que se apoia a decisão, fez uma correcta interpretação e aplicação da lei aos factos.

  8. Assim como também fez uma correcta interpretação e aplicação do direito aos factos, ao ter concluído que a falta de notificação da informação da inspecção à ora recorrente constitui mera irregularidade susceptível de sanação, como decorre do art. 37º n° 1 do CPPT.

  9. Também a recorrente não tem qualquer razão quando alega que o art. 37º do CPPT é inconstitucional, por violação do disposto no art. 268° n° 3 da CRP e do princípio do acesso ao direito e à tutela judicial efectiva consagrado no art. 20º da mesma CRP, como, aliás, se deliberou no Ac. do Tribunal Constitucional atrás mencionado a propósito do art. 31° n° 1 e 2 da anterior LPTA, com uma redacção semelhante ao art. 37° do CPPT.

  10. Finalmente, a questão da ilegalidade da decisão impugnada, em virtude de estar fundamentada por remissão, quando, segundo a recorrente essa situação não é legalmente admissível nas decisões de levantamento do sigilo bancário, é uma questão nova que não foi conhecida pela sentença recorrida, uma vez que a mesma não foi equacionada pela recorrente perante o Tribunal "a quo".

  11. Deste modo, não era lícito à recorrente suscitar a presente questão, da ilegalidade do acto impugnado por estar fundamentado por remissão, que é nova e que não foi objecto de decisão por parte do Tribunal "a quo".

  12. Não podendo, por não ser de conhecimento oficioso, o Tribunal "ad quem" dela tomar conhecimento.

  13. Ainda que assim não se entenda, sem conceder, sempre se dirá que a recorrente não tem qualquer razão quando alega que as decisões de levantamento do sigilo bancário, atento o nº 4 do art. 63°-B da LGT, não podem ser objecto de fundamentação por remissão.

  14. Uma coisa é o conteúdo do acto, o especial ou uma maior densidade do dever de fundamentação, outra coisa é a forma como a fundamentação pode ser apresentada.

  15. Ora, o n° 4 do art. 63°-B da LGT, não faz qualquer imposição, quanto à forma da fundamentação ser efectuada, designadamente, que a mesma não possa ser feita por remissão, apenas exige, quanto ao conteúdo da mesma fundamentação, que a mesma tenha uma maior ou particular densidade, com a indicação dos motivos concretos que justificam a decisão.

O Exmº Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer no sentido de ser concedido provimento ao presente recurso.

Atento o carácter urgente do presente processo, não foram colhidos os vistos legais.

2 - A sentença recorrida fixou a seguinte matéria de facto: 1. No decurso de acção inspectiva à ora recorrente, em 29.07.2008, a Divisão de Inspecção Tributaria; Direcção de Finanças de Braga, elaborou um relatório, tendo por objecto a actividade da recorrente, instruindo pedido de acesso a informações e documentos bancários da recorrente, nos termos do art. 63-B, n° al. a) e b) da LGT, cujo teor consta do processo administrativo apenso e, que aqui se dá por integralmente reproduzida.

  1. Consta, nomeadamente, daquele relatório: "No decorrer da acção Inspectiva foram detectadas três facturas, alegadamente emitidas por B... Lda, NIPc ... no valor global de € 894.795,00 (c/IVA)...

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