Acórdão nº 0781/08 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 09 de Outubro de 2008

Magistrado ResponsávelMADEIRA DOS SANTOS
Data da Resolução09 de Outubro de 2008
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na 1.ª Secção do Supremo Tribunal Administrativo: O Instituto dos Registos e do Notariado, IP, que doravante designaremos por IRN, interpôs esta revista «per saltum» do acórdão do TAC de Lisboa que, julgando procedente a acção relativa a contencioso pré-contratual instaurada por A..., anulou o despacho de 16/8/2007 em que o Secretário de Estado da Justiça adjudicara a B..., o previsto fornecimento de módulos de recolha de dados biométricos interoperáveis com a solução S.I. do ciclo de vida do projecto «cartão do cidadão» para parte do território continental e Região Autónoma da Madeira.

O recorrente terminou a sua alegação de recurso com o oferecimento das conclusões seguintes: 1 - O presente recurso jurisdicional segue o regime da revista, verificando-se os pressupostos da respectiva admissão, previstos no artigo 151° do CPTA: (i) está em causa acção de valor superior a € 3,000.000 (três milhões de euros); (ii) apenas se pretende discutir questões de direito; (iii) o fundamento do recurso é a violação de lei substantiva; e, por fim, (iv) não está em causa questão de funcionalismo publico ou relacionada com forma pública ou privada de protecção social.

2 - Verificados os requisitos previstos na conclusão anterior, o STA, Secção de Contencioso Administrativo, é competente para a sua apreciação e decisão.

3 - Decidiu mal o tribunal «a quo» ao referir ou considerar que o contrato em causa nos presentes autos assumia natureza administrativa - se tiver sido essa a intenção daquele tribunal - na medida em que, por um lado, não se trata de um contrato administrativo por natureza, nos termos e para efeitos do disposto no artigo 178°, n.º 2, do CPA, nem está em causa, por outro lado, uma situação enquadrável no n.º 1 do mesmo preceito.

4 - Em função do disposto na conclusão anterior, a decisão proferida pelo tribunal «a quo» violou o disposto no artigo 178°, ns.º 1 e 2, do referido CPA, assim como o regime que decorre da sua não aplicação ao caso concreto.

5 - Não estando em causa um contrato administrativo, a decisão recorrida violou o disposto no artigo 181° do CPA, que apenas reclama a aplicação daquele código, na dimensão procedimental, à formação de contratos que assumam aquela natureza administrativa, o que não é o caso do contrato em causa nos presentes autos.

6 - De resto, idêntica conclusão se alcança pela circunstância de estar em causa actuação de gestão privada da administração, que sempre determinaria, apenas, a aplicação dos princípios gerais da actividade administrativa e normas que concretizem preceitos constitucionais, por via do disposto no artigo 2°, n.º 5, do CPA, razão pela qual, também com este fundamento, decidiu mal o tribunal «a quo».

7 - A decisão recorrida incorre em erro de direito, na medida em que, atento o facto de não se estar perante um contrato administrativo, o enquadramento e a tramitação do respectivo procedimento de formação contratual são regulados exclusivamente pelo DL n.º 197/99, de 8 de Junho, e não pelo disposto também na parte correspondente do CPA.

8 - A decisão recorrida incorre em erro de direito, na medida em que, atento o facto de o contrato ter sido excepcionado ao abrigo do disposto no artigo 77°, n.º 1, do DL n.º 197/99, de 8 de Junho, não tomou em consideração os respectivos efeitos jurídicos, designadamente a possibilidade real de a entidade adjudicante poder adoptar o procedimento pré-contratual que entendesse mais adequado - como seja o ajuste directo -, sem observância do disposto nos artigos 78° e seguintes.

9 - A decisão recorrida incorre em erro de direito, na medida em que, tendo presente o facto de o contrato ter sido excepcionado ao abrigo do disposto no artigo 77°, n.º 1, do DL n.º 197/99, de 8 de Junho, considerou que, no caso, foi adoptado um procedimento concurso ou um procedimento de consulta prévia - com flutuações terminológicas identificáveis -, quando, em rigor, foi adoptado um procedimento desformalizado, equivalente ao ajuste directo, 10 - A decisão recorrida incorre em erro de direito, na medida em que, tendo presente o facto de o contrato ter sido excepcionado ao abrigo do disposto no artigo 77°, n.º 1, do DL n.º 197/99, de 8 de Junho, a sua celebração não tinha que observar a tramitação específica prevista nos referidos artigos 78° e seguintes daquele diploma, e em especial nos artigos 151° e subsequentes.

11 - A decisão recorrida incorre em erro de direito ao ter anulado o despacho impugnado, na medida que o princípio da transparência e da publicidade, tal como resultam dos artigos 8° e 55° do DL n.º 197/ 99, de 8 de Junho, devem ser interpretados em função das circunstâncias do caso concreto, sendo que a adopção de um procedimento de contornos típicos do ajuste directo - como no caso sucede - implica a redução das exigências formais daqueles decorrentes.

12 - Dito de outro modo, a decisão recorrida incorre em erro de direito ao ter anulado o despacho impugnado, na medida que o princípio da transparência e da publicidade, tal como resultam dos artigos 8º e 55º do DL n.º 197/99, de 8/6, conjugados com as especificidades do procedimento em concreto adoptado pela entidade adjudicante e o regime decorrente do artigo 77°, n.º 1, daquele diploma, não obrigam à comunicação prévia e formal dos critérios ou elementos de avaliação em convites informais que sejam dirigidos a potenciais interessados.

13 - A decisão recorrida incorre em erro de direito ao ter anulado o despacho impugnado, na medida que não houve: no caso concreto, qualquer ofensa ao princípio da imparcialidade, tal como resulta do artigo 11º do referido DL n.º 197/99, de 8 de Junho.

14 - A decisão recorrida, incorre em erro de direito ao ter anulado o despacho impugnado com fundamento na preterição da formalidade de audiência prévia, na medida em que (i) não se impõe directamente a aplicação do artigo 100º do referido CPA ao caso concreto, por não estar em causa a formação de um contrato administrativo (cfr. artigo 181°) e (ii) não existe norma do DL n.° 197/99, de 8 de Junho, aplicado o regime do respectivo artigo 77°, n.° 1, que imponha a adopção dessa formalidade.

O Ministério da Justiça veio também recorrer do mencionado acórdão, fazendo-o por adesão ao recurso do IRN.

A recorrida A... contra-alegou, concluindo do modo seguinte:

  1. O douto acórdão recorrido não merece qualquer censura e, porque não viola a lei e espelha a justiça, não pode ser revogado.

  2. Optando por interpor um recurso jurisdicional «per saltum» - quando os recorrentes ainda poderiam lançar mão de recurso para a segunda instância - permite concluir que os recorrentes reconhecem que o douto acórdão recorrido não merece qualquer censura quanto ao julgamento da matéria de facto e, por consequência, admitem que a matéria de facto constante dos autos e considerada como provada na fundamentação do acórdão é inequívoca e aceite pelos recorrentes.

  3. Ao longo das suas alegações, os recorrentes fazem por esquecer os factos verificados ao longo de todo o procedimento de adjudicação - os tais que se encontram provados nos autos -, para construírem, a partir de factos novos...

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