Acórdão nº 0744/08 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 01 de Outubro de 2008

Magistrado ResponsávelJORGE DE SOUSA
Data da Resolução01 de Outubro de 2008
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo: I - A..., residente na Figueira da Foz, não se conformando com a sentença do TAF de Coimbra que julgou improcedente a reclamação do despacho do Senhor Chefe do Serviço de Finanças d... que revogou anterior despacho em que declarara a prescrição da dívida tributária do ano de 1995, dela vem interpor recurso para este Tribunal, formulando as seguintes conclusões: 1 - O processo de execução fiscal é um processo de natureza jurisdicional (artigo 103.º da LGT) integrado por actos que visam dirimir um conflito de interesses.

2 - O acto que determina a prescrição da dívida tributária exequenda, implicando a extinção desse processo e a definição da paz jurídica relativamente a essa questão de direito, está abrangido pela força do caso julgado., ou seja, 3 - A extinção da execução fiscal abonada na prescrição da dívida corresponde, assim, à extinção de um processo judicial e, como tal, está abrangida pela força desse julgado postergando qualquer decisão posterior que destrua aquele efeito voltando a apreciar os fundamentos que a determinaram.

No entanto, sem conceder, 4 - Os actos administrativos que sejam inválidos só podem ser revogados com fundamento na sua invalidade e dentro do prazo do respectivo recurso contencioso ou até à resposta da entidade recorrida.

5 - O prazo estabelecido nessa norma, por referência às preocupações materiais decorrentes dos princípios da confiança, da segurança, da boa fé e da igualdade, não é o prazo abstracto do recurso contencioso em geral, mas o prazo que concretamente seja determinado para a impugnação contenciosa do acto em crise, ou seja, o prazo do respectivo recurso contencioso.

6 - Nessa ordem de ideias, os actos inválidos poderão ser revogados no prazo em que, in concreto, puderem ser impugnados no seio do procedimento do qual emerge a sua prática, ou seja, não dentro do prazo do recurso contencioso em geral, mas apenas no prazo do respectivo recurso ou impugnação contenciosa.

7 - Para além dessa ser a interpretação que melhor corresponde à letra da lei é também a que melhor se coaduna com a sua intencionalidade prático-normativa e com os principia que devem presidir, como fundamento, à determinação do sentido do direito aplicável.

8 - E, na verdade, quanto a este aspecto, o princípio da res judicata no domínio do direito administrativo e fiscal sofreu uma clara evolução no sentido de limitar - em homenagem ao princípio do Estado de direito, de tutela da confiança, de segurança, de proibição de venire contra factum proprium e tutela da boa fé - a faculdade de auto-revogação dos actos administrativos, impondo-lhe como limite último o patamar do tempo de consolidação dos efeitos do acto na esfera do particular aferida em concreto pelos prazos que a lei estabelece para a mobilização do meio processual que permita sindicar o acto praticado.

9 - Não sendo indiferente a esse [axio]lógica a intercessão de um critério de igualdade, pois se o ordenamento jurídico tolera que um acto ilegal se estabilize na esfera jurídica de um particular quando ultrapassados os prazos de caducidade para acesso aos tribunais administrativos, não poderá deixar de limitar as possibilidades da administração revogar oficiosamente os seus actos, impondo-lhe idêntico prazo e postergando a alteração do acto já estabilizado no ordenamento jurídico.

10 - Compreendendo-se o sentido da norma do artigo 141.º do CPA com base nesta pressuposição, o acto apenas poderia ter sido revogado dentro do prazo em que o executado o poderia impugnar pelo meio processual ao seu dispor: a reclamação prevista no artigo 276.º do CPPT.

11 - Mesmo a admitir-se diferente interpretação da norma do artigo 141.º do CPA, não pode aceitar-se que o prazo para a revogação seja determinado por referência à alínea a) do referido artigo 58.º, n.º 2, do CPTA, de um ano.

12 - Na verdade, mesmo a considerar-se, contra legem scripta, que o artigo 141.º do CPA se refere aos prazos abstractos do recurso contencioso, o prazo aqui pertinente, por não estarmos perante uma impugnação promovida ou passível de o ser pelo Ministério Público nos termos previstos no CPTA, teria de ser o prazo de três meses constante da alínea b) da referida norma, o que determinaria igualmente a extemporaneidade do acto revogatório.

13 - Destarte, ao aplicar o artigo 58.º, n.º 2, alínea a) do CPTA, o Tribunal incorre num erro de julgamento em matéria de direito.

14 - A norma conjugada dos artigos 141.º, n.º 1 do CPA e 58.º, n.º 2, alínea a) do CPTA, quando interpretada no sentido de permitir, em sede de execução fiscal, a revogação de acto administrativo no prazo de um ano, é inconstitucional por oposição ao princípio do Estado de direito, ao princípio da igualdade, ao princípio da tutela da confiança e ao princípio da boa fé, nos termos em que os mesmos...

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