Acórdão nº 0970/07 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 14 de Julho de 2008

Magistrado ResponsávelEDMUNDO MOSCOSO
Data da Resolução14 de Julho de 2008
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

ACORDAM NA SECÇÃO DO CONTENCIOSO ADMINISTRATIVO DO STA - (2ª Subsecção): 1 - A... e B..., LDA, identificados a fls. 2, intentaram no TAF do Funchal, acção com processo ordinário contra o MUNICÍPIO DE CÂMARA DE LOBOS, pedindo a sua condenação no pagamento às autoras do montante de 84.000.000$00, a título de lucros cessantes; de 15.000.000$00, a título de indemnização por danos morais; a restituir à sociedade autora as verbas referentes a impostos indirectos, alvará de licença n.º 164/95, alvará de licença n.º 82/94 e alvará de licença n.º 465/93; bem como a restituir as verbas referentes ao que foi recebido pela RAM através da Direcção Regional de Emprego, Direcção Regional do Turismo, Instituto de Vinho da Madeira, Serviços de Meteorologia, Direcção Regional de Saúde Pública, ao que foi pago aos pedreiros que fizeram as obras no local, à taxa paga pelo alvará de licença e à restituição do apoio financeiro concedido pela RAM.

2 - Por sentença de 20.11.2006 (fls. 814/827), o Juiz do Tribunal Administrativo e Fiscal do Funchal, julgou a acção "improcedente" e em consequência absolveu o R. do pedido, pelo que inconformadas com tal decisão, dela vieram as AA interpor o presente recurso jurisdicional que dirigiram a este STA tendo, em sede de alegações, formulado as seguintes CONCLUSÕES: I - Em virtude dos factos provados 36 e 37 do acórdão recorrido contrariarem os documentos constantes dos autos, sendo que, o primeiro contraria os factos provados no douto acórdão no n° 17, ambos deverão ser havidos por não provados e em sua substituição apenas deve constar provado e reproduzido o requerimento de renovação de licença apresentado pelos Recorrentes a 6/05/1996 e que consta a fls. 114 dos autos.

II - Os Recorrentes exercem a actividade económica de snack-bar no prédio "sub-judice" que lhes foi locado desde o início de 1992, sendo que, para tal foi-lhes concedido o Alvará de Licença Sanitária 713 de 23 de Março de 1992.

III - Nesse alvará de licença sanitária, a única licença que os Recorrentes tiveram que lhes permitia explorar um estabelecimento de bar no prédio que lhes havia sido arrendado - o locado "sub-judice"- não constava, nem nunca constou até hoje, qualquer limitação para exploração dum bar.

IV - Tal licenciamento, enquanto acto administrativo primário, é tão importante e relevante que a Recorrida jamais poderia ter concedido a licença de funcionamento que concedeu e renovou anual e sucessivamente desde 1992 por ser documento de exibição obrigatória no requerimento inicial de concessão de licença de funcionamento, tudo como está previsto na alínea a) do n°1 do artº 21.º da Portaria 1/95/M, de 17/11, publicada no D.R., 1 Série - B, em 17 de Novembro de 1995, da autoria da Secretaria Regional das Finanças da R.A.M. - a licença de alvará sanitário é pré-existente e corresponde ao acto administrativo primário anterior e obrigatório que precede a concessão da licença de funcionamento.

V - Os Recorrentes em 18 de Dezembro de 1995, veja-se fls. 368 dos autos, apenas pretendiam a continuidade da exploração do bar através da "renovação da licença de funcionamento".

VI - Não existe nenhuma decisão do Recorrido, Município de Câmara de Lobos, ou do seu Presidente de Câmara, ou de qualquer membro do Governo Regional da R.A.M. com competência para o efeito que constitua, nos termos do artº 27° da Portaria 1/95/M, de 17/11, despacho fundamentado invocando que o estabelecimento comercial dos Recorrentes não reunia condições legais ou regulamentares por se verificarem as situações previstas nas alíneas a) a e) desse mesmo artigo do regulamento, ou situação análoga.

VII - Parece que, o Recorrido teve como intenção fintar as regras do processo expropriativo, o que constitui abuso de poder.

VIII - A competência de encerramento de estabelecimentos é apenas do membro do Governo Regional que tenha a seu cargo a administração pública regional e local, como imperativamente prescreve a norma do n° 1 do artº 4° do mesmo diploma regulamentar.

IX - Desde o dia 18 de Dezembro de 1995, fls. 368 dos autos, quando os Recorrentes pediram a renovação da licença de funcionamento até ao dia 8 de Abril de 1996, veja-se facto provado n° 16 no douto acórdão, estes nada receberam de forma expressa e escrita do Presidente da Câmara Municipal deferindo a licença de funcionamento, seja por que prazo fosse.

X - Logo, desde 18/12/1995, data do pedido renovação, os Recorrentes, continuaram com o estabelecimento de bar aberto e em funcionamento pura e simplesmente através dum acto presumido de deferimento tácito.

XI - Entendemos por isso, que o douto acórdão recorrido ao não considerar a tutela legal dos danos provocados pela Recorrida violou o artº 7° do D.L. 48.051 por manifesto entendimento inconstitucional em face da norma do artº 22° da Constituição da República Portuguesa.

XII - Os danos causados aos Recorrentes são indemnizáveis porque, no caso concreto, o Presidente da Câmara da Recorrida, praticou um acto ilícito, na medida em que, omitiu e ignorou regras técnicas existentes na Portaria Regional l/95/M quanto aos casos de recusa de licença de funcionamento, ignorou que a recusa apenas poderia surgir por despacho fundamentado sustentado em pareceres técnicos demonstrativos das circunstâncias as elencadas no art° 27° daquele diploma regional, ignorou que não tinha competência para determinar o encerramento do estabelecimento comercial e não cumpriu nem ao de leve qualquer formalidade relativa à prolação dum acto administrativo extintivo e lesivo de direitos e interesses legalmente tutelados dos Recorrentes, não cumpriu o direito de audiência previsto no C.P.A., ignorou o alvará de licença sanitária n° 713, de 23/3/1992, que concedeu aos Recorrentes para explorar o bar, ignorou que não tinha atribuições legais para a prática do acto material de gestão pública de encerramento do estabelecimento em questão e ignorou que desde 18/12/1995 por ausência de qualquer acto expresso e escrito o Município de C.L. deferiu tacitamente a licença de funcionamento que vinha sendo sucessivamente concedida desde 1992.

XIII - Por isso concluí-se que, toda a actividade ilícita culposa e imputável à Recorrida e ao seu Presidente da Câmara Municipal na provocação dos danos, foi adequada, na medida em que, provocou a perda de todo o dinheiro pago pelos Recorrentes em licenças, subsídios, obras, receitas comerciais e continuidade de exploração do bar por tempo indeterminado, factos provados 3 a 34 do acórdão final de fls.

XIV - Em face do que se concluiu até agora e do que se relevou em toda a peça recursória é nosso entendimento que, o douto acórdão recorrido violou as normas do artº 40° e 43° da Portaria 6.065, de 11 de Abril de 1929; as da alínea a) do n°1 do art° 21°, a do art° 24°, as do art° 27° e do n°1 do art° 4° todas da Portaria Regional n° l/95/M, de 17/11; a norma do n° 1 do art° 108°, 12l°/n°, 123°, 124°, e as das alíneas b) e f) do n° 1 e 2 do artº 133°, todos do C.P.A.; as dos artigos 6°, 7° e 8° do D.L. 48051, de 21 de Novembro de 1967, interpretadas com base no entendimento constitucional em face da norma do artº 22° da Constituição da República Portuguesa, também aqui violada, e as normas do n° 1 do artº 483° e 487° do C. Civil, daí que, o douto acórdão deverá ser revogado/anulado e substituído por outro que aplique de forma adequada os princípios da justiça, da adequação, da proporcionalidade e da legalidade ao caso concreto e, neste sentido, XV - Conceda provimento ao presente recurso condenando a Recorrida, Município de Câmara de Lobos, nos precisos termos peticionados, os quais se transcrevem: Nestes termos, Deve a presente acção ser julgada por procedente e por provada e, consequentemente, devem os Réus, câmara Municipal de Câmara de Lobos e Região Autónoma da Madeira, serem, solidariamente, condenados a pagar aos R.R. as seguintes importâncias: 1 - Esc: 84.000.000$00 (oitenta e quatro milhões de escudos) a título de lucros cessantes, à razão de Esc: 8.400.000$00 (oito milhões e quatrocentos mil escudos) por ano de receita bruta perdida, com referência a 10 anos de exploração comercial.

2 - Devendo a Ré, Município de câmara de Lobos, ser condenada a restituir à Autora, B... Lda.", de entre outras verbas que a seguir se discriminam, que recebeu: - Esc: 27.725$00 com a designação de receita de impostos indirectos; - Esc: 820$00 do Alvará de Licença n° 164/95; - Esc: 773$00 do Alvará de Licença 82/94; - Esc: 773$00 do Alvará de Licença 465/93; 3 - Devendo a Ré, R.A.M., ser condenada a restituir à Autora e seus gerentes entre outras as verbas que a seguir se discriminam, que recebeu: - Esc: 170.400$00 em 2 de Maio de 1995, Direcção Regional de Emprego; - Esc: 20.000$00 em 20 de Maio de 1992, Direcção Regional do Turismo; - Esc: 5.439$00 em 17 de Agosto de 1995, Instituto de Vinho da Madeira; - Esc: 1.219$00 em 25 de Julho de 1991, Serviços de Meteorologia; - Esc: 300$00 em 2 de Maio de 1995, Direcção Regional de Saúde Pública; - Esc: 1.400.000$00 emergentes de financiamento bancário a ser pagos ao B.E.S.; - Esc: 1.424.000$00 de obras feitas no estabelecimento comercial pagas aos pedreiros, C...; - Esc: 779.189$00 de materiais diversos aplicados e investidos no estabelecimento comercial; - Esc: 27.685$00 relativos à taxa paga pelo Alvará de Licença que afinal nenhum valor jurídico teve para os R.R.; - Esc: 5.112.000$00 relativos ao Apoio Financeiro concedido pela R.A.M., cuja restituição é solicitada; 4 - Esc: 15.000.000$00 (quinze milhões de escudos) a título de indemnização por danos morais; Tudo acrescido de juros contados à taxa legal, a partir da citação, mais custas e condigna procuradoria.

5 - Requer a V. Exa. se digne conceder Apoio Judiciário na modalidade de isenção de preparos, taxas e custas, dada a evidente incapacidade económica dos A.A.".

3 - A autoridade recorrida não contra-alegou.

4 - O Excelentíssimo Magistrado do Ministério Público, no parecer que emitiu a fls. 904/907 (cujo conteúdo se reproduz), pronunciou-se no...

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