Acórdão nº 455/05.7TBMNC.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 30 de Abril de 2009

Magistrado ResponsávelGOUVEIA BARROS
Data da Resolução30 de Abril de 2009
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães: Maria A., residente no lugar de Gandarela, freguesia de Troviscoso, Monção, intentou a presente acção declarativa, sob a forma de processo ordinário, contra a Junta de Freguesia de T..., com sede no lugar da Igreja, freguesia de Troviscoso, Monção, pedindo a sua condenação a cumprir o encargo contido no testamento de A. E., falecido em 15 de Maio de 1990, no qual este impôs à Ré, como condição da aceitação do legado de um prédio misto e respectivo recheio, a obrigação de dar lhe dar emprego a si própria, condizente com as suas aptidões profissionais, enquanto o puder e quiser fazer, pedindo também a condenação da ré a pagar-lhe a quantia de €8.847,30 e juros, a título de indemnização correspondente à soma dos vencimentos que a autora teria auferido desde o trânsito da sentença homologatória da partilha até à propositura da acção, calculada com base no salário mínimo nacional.

Em alternativa e na eventualidade da ré não poder ou não querer proporcionar trabalho à autora, ser condenada a pagar-lhe a quantia indemnizatória de €62.949.60 (sessenta e dois mil novecentos e quarenta e nove euros e sessenta cêntimos), acrescida de juros à taxa legal em vigor, valor correspondente às remunerações que auferiria ao longo da sua vida activa.

Subsidiariamente, no caso de improcederem os pedidos que antecedem, declarar-se que a Ré não cumpriu os encargos contidos no testamento e, em consequência, ser decretada a resolução da disposição testamentária pela qual o mesmo legou à Ré o prédio mencionado em 2º supra, com as demais consequências legais.

Alega para tal e em síntese que, em 12 de Abril de 1990, o referido A. E. outorgou testamento público pelo qual, entre outros, legou à Ré um prédio misto, denominado “Quinta do Tanque”, com o respectivo recheio, com o encargo da legatária dar emprego na mesma quinta à sua serviçal - ora Autora - enquanto a mesma o puder e quiser fazer.

Após a morte do A. E., a Autora permaneceu na referida quinta até à data em curso, tendo entretanto corrido termos o processo de inventário nº 33/1990, a que se procedeu por óbito do referido A. E. no âmbito do qual o legado supra mencionado foi cumprido em valor pelos herdeiros do falecido, recebendo a ré a quantia de €294.016,42.

A ré – acrescenta a autora – não obstante sucessivas interpelações por si feitas em 2004 e em 2005, nunca cumpriu o encargo a que ficou obrigada, não disponibilizando trabalho ao serviço da Junta nem lhe executando as obras de restauro de uma casa em ruínas de que é comproprietária, como a autora lhe propôs e com o que consideraria o encargo cumprido.

Por outro lado, o testador condicionou também o legado a favor da Ré com a obrigação desta afectar os bens a uma obra de beneficência para pobres, obra essa cuja realização ficou definitivamente impossibilitada, uma vez tais bens vieram a ser adjudicados a outra pessoa que não a Ré.

Face a essa impossibilidade de cumprimento da condição sob a qual o legado foi instituído e considerando que foi esse o fundamento essencial que levou o testador a legar os bens à Ré, deverá a disposição testamentária ser declarada resolvida, com as legais consequências.

Contestou a ré para invocar a ilegitimidade da autora no que tange ao pedido subsidiário, bem como a caducidade do direito de resolução que a autora pretendeu exercer através de tal pedido, louvando-se no disposto no nº3 do artigo 2248º do CC, arguindo ainda a nulidade da obrigação constante do legado por a mesma ser física e legalmente impossível.

E, por impugnação, nega que a autora alguma vez tivesse reclamado o cumprimento do legado e refere que a quantia por si recebida em substituição do legado foi apenas de €182.999,26 que foi afectada às obras sociais da autarquia, concluindo a pedir a improcedência da acção.

Replicou a autora para pugnar pela improcedência das excepções peremptórias (nulidade e caducidade) e, pretextando uma ampliação do pedido inicial, diz ter interesse processual relevante para efeito da legitimidade, por ser potencial beneficiária da afectação do legado feita pelo testador a favor dos indigentes, uma vez que é das pessoas mais pobres da freguesia.

* No despacho saneador julgaram-se improcedentes as excepções de ilegitimidade activa, bem como a excepção peremptória de caducidade, relegou-se para a sentença a excepção de nulidade, sendo no mais tabelar.

Seleccionada a matéria de facto assente e a controvertida, teve lugar a necessária instrução após o que, discutida a causa, foi proferida sentença julgando a acção parcialmente procedente e condenando a ré a cumprir a obrigação de realizar uma obra de beneficência para pobres no prazo de um ano, condenando ainda a ré a dar emprego à A. e a pagar-lhe o valor correspondente ao salário mínimo nacional, desde a citação até ao cumprimento efectivo do encargo consignado pelo testador, acrescido dos juros de mora à taxa de 4% ao ano.

Inconformada com o decidido, recorre a ré para pugnar pela revogação da sentença e pela sua absolvição da instância ou, assim não sendo, pela absolvição dos pedidos, alinhando para tal as seguintes razões com que encerra a respectiva alegação: I. Os factos das alíneas G) e H) da MFA e o Facto Provado 1), se houvessem de considerar-se relevantes para a decisão do recurso, haveriam de ser rectificados, pela obscuridade que acarretam, no confronto com os das alíneas B), C) e F) da MFA e 5) e 6) dos Factos Provados, pois é certo – conforme certidões do testamento de 1990-04-18 e do Inventário 33/1990 juntas aos autos – que o legado modal em causa incide sobre um único prédio: a Quinta do Tanque.

  1. Por razões de clareza e de fidelidade com a terminologia utilizada no Testamento de 1990-0418 relativamente ao encargo em benefício da A, deverá rectificar-se o teor do Facto Provado 11), ficando com a seguinte redacção: A autora não procurou a ré para lhe oferecer trabalho e esta também nunca lho deu.

  2. No respeito pelas gravações dos depoimentos que, no que releva, constam transcritas, em D supra: • Da própria Autora (conforme a acta da audiência de 27-02-2008 gravado na Cassete 1, lado A, numerador 0001 a 1.026) e inclusive com base na Assentada exarada pelo M.mo Juiz nessa mesma acta (fls. 186 dos autos); • Da testemunha Maria Luísa Pinto Francisco, do rol da Autora (acta da audiência de 22-04-2008, a fls. 208 dos autos, gravado na cassete 3, lado A, numerador 1660 a 2265); • Da testemunha Maria Amélia Loureiro Rodrigues (acta da Audiência de 22-04-2008, a fls. 208 dos autos, gravado na cassete 3, lado B, numerador 3945 a 4865); e • Da testemunha Rui Figueiredo Pereira (acta da Audiência de 30-04-2008, único gravado na respectiva cassete (cassete 4), lado A, desde o numerador 0001), Deve alterar-se a decisão da matéria de facto conjunta dos Factos Provados 2), 3) e 10), que ficará com a seguinte redacção (em resposta conjunta): A autora trabalha como jornaleira agrícola, mas, dizendo que se cansa, só admite trabalhar dias alternados.

    IV Porque é manifesto que o pedido da A improcedeu em mais do que a indemnização de 8.847,30€ e juros, correspondente ao SMN em vigor desde Dezembro de 2003, a sentença, ao ter condenado a R na totalidade das custas, infringe o disposto no art°446º, 1 e 2 do CPC. (G-1) V Tendo condenado a R a “dar emprego” à A, a sentença recorrida padece da nulidade do art°668º, nº1, g) do CPC, porque, podendo a relação de emprego ser regulada de vários modos, era mister, até para ser determinável o valor remanescente do legado a afectar ao outro encargo, que uma condenação com esse alcance se pronunciasse – e omitiu a pronúncia -, nomeadamente, sobre: - Se a A está sujeita a cumprir um horário diário e semanal pré-estabelecido; - Qual o critério de determinação e qual o valor unitário da retribuição; - Se a A está sujeita ao poder disciplinar; -Se a A pode ser despedida, nas circunstâncias legalmente previstas ou admissíveis; - Se o contrato caduca com a reforma por velhice ou invalidez; e - Se este encargo de emprego/trabalho fica condicionado à não resolução do legado que onera (especificação justificada pelo facto de a própria sentença, desde já, pré-ordenar essa resolução, fixando o prazo de um ano para a afectação do valor restante do legado, findo o qual a resolução deverá ocorrer).

  3. Tendo, em simultâneo, por um lado, condenado a R. a cumprir o encargo aposto ao legado de empregar a A e a indemniza-la pela mora nesse cumprimento e, por outro lado, fixado prazo de um ano para cumprimento do outro (e principal) encargo aposto ao mesmo legado, sob pena de resolução do legado (que desobrigará do cumprimento ou de qualquer encargo ou justificará a restituição do cumprido),a sentença recorrida incorpora condenações conflituantes, com base em pedidos incompatíveis, excepção dilatória inominada que se enquadra no corpo do art° 494° do CPC e que determina a absolvição da instância (art°s 288°. 494°. 495°. 660°.1 e 713°.2 do CPC).

  4. Na fixação do prazo para concretização/instalação do encargo da obra de beneficência, a sentença recorrida violou o disposto no art° 3° do CPC, porque não foi exigido à A que, na fase dos articulados, cumprisse o ónus (do art° 1456° do CPC) de submeter um prazo indicativo ao contraditório – e não houve contraditório sobre o prazo fixado.

  5. De todo o...

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